Em abril de 1885, Abramo Bonazza, um italiano de 47 anos, desembarcava no Brasil com pouco mais que a roupa do corpo e uma imensa esperança de recomeçar a vida. Assim como ele, cerca de 3,5 milhões de imigrantes passaram pela antiga Hospedaria de Imigrantes no bairro do Brás, em São Paulo, onde recebiam abrigo temporário antes de seguirem para as fazendas de café ou os centros urbanos em busca de trabalho. Hoje, histórias como a de Abramo permanecem vivas na memória do estado, demonstrando como essas pessoas moldaram a economia, a cultura e a sociedade paulista.

Registro de Abramo Bonazza na Hospedaria

Em homenagem a essa contribuição, a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo celebra, em 18 de dezembro, o Dia do Imigrante. Instituída pela Lei nº 8.307/1964, a data é um momento de reflexão sobre o impacto das comunidades imigrantes no desenvolvimento de São Paulo e sobre os desafios que enfrentam para se integrar à sociedade contemporânea.

A Hospedaria de Imigrantes e o Arsenal da Esperança

A Hospedaria de Imigrantes, inaugurada em 1887 no bairro do Brás, foi um dos maiores símbolos da imigração em São Paulo. Criada para receber trabalhadores estrangeiros que chegavam ao estado, a hospedaria oferecia abrigo temporário, alimentação, assistência médica e encaminhamento para empregos, principalmente nas fazendas de café. Até encerrar suas atividades, em 1978, o local recebeu mais de 3,5 milhões de pessoas de mais de 70 nacionalidades, incluindo italianos, japoneses, espanhóis, portugueses, alemães, libaneses e, posteriormente, migrantes internos vindos de outras regiões do Brasil.

Hoje, o espaço abriga o Museu da Imigração, um importante centro cultural que preserva a memória dos imigrantes e suas contribuições para o estado. Com exposições interativas e documentos históricos, o museu conecta o passado e o presente, destacando como a diversidade moldou São Paulo. A história de Abramo Bonazza, contada no início desta reportagem, está registrada nos arquivos do Museu, que podem ser acessados online.

Ilustração da Hospedaria de Immigrantes

Para o historiador do Museu da Imigração, Henrique Trindade, a antiga Hospedaria simboliza um importante capítulo do estado. "Esse prédio é um grande símbolo da transformação cultural, demográfica, econômica, política e social de São Paulo", defende Trindade. Em 1891, apenas quatro anos após a inauguração, o local recebeu 90 mil pessoas recém-chegadas ao país, triplicando a população da capital paulista de 1872, que era de apenas 30 mil habitantes. "São Paulo nasceu duas vezes: a primeira em 25 de janeiro, no Pateo do Collegio, e a segunda, como metrópole, aqui na Hospedaria em 1887", completa o historiador.

O espírito de acolhimento da antiga hospedaria continua vivo no Arsenal da Esperança, fundado em 1996 no mesmo local. Coordenado pela Comunidade de Santo Egídio e pela Fraternidade da Esperança, o espaço, hoje, oferece abrigo, alimentação e apoio para homens em situação de vulnerabilidade, incluindo refugiados e migrantes. Diariamente, cerca de 1,2 mil pessoas são acolhidas, com ações que vão além da assistência imediata, promovendo reinserção social e reconstrução da dignidade.

Destino São Paulo

São Paulo é, historicamente, o principal destino de imigrantes no Brasil. Entre os séculos 19 e 20, 57% dos estrangeiros que chegaram ao país escolheram o estado como lar, segundo a Fundação Getúlio Vargas. Em 2023, esse movimento continuou relevante: o Sudeste recebeu 60,2 mil imigrantes registrados, com São Paulo respondendo por 30,2% desse total, conforme o relatório anual de 2024 do Observatório das Migrações Internacionais (OBMigra).

Primeira vista de Santos

Imigração contemporânea

A jornalista peruana Verónica Goyzueta chegou ao Brasil no início dos anos 1990 para cursar Jornalismo na Universidade de Brasília (UnB). Após se formar, enfrentou a difícil decisão de voltar ao Peru ou aceitar uma proposta de trabalho como correspondente em São Paulo. Escolheu permanecer e, ao longo de três décadas, construiu uma carreira sólida na imprensa brasileira e internacional, atuando como correspondente de veículos renomados.

Radicada em São Paulo, Verônica compartilha percepções sobre o que significa ser imigrante. Para ela, a solidão é uma constante na vida de quem chega a um novo país. "O imigrante precisa construir laços e formar novas conexões. Não é fácil se adaptar, mesmo conhecendo a cultura local", relata.

A jornalista destaca também a contribuição dos imigrantes para a gastronomia paulista. "O que é a comida paulista? É a massa italiana, a pizza, o quibe árabe, as tubaínas que vêm de portugueses e italianos. É tudo isso que vem de fora".

Reconhecimento e ações da Alesp

A atuação da Alesp reflete o compromisso de construir um estado mais inclusivo e acolhedor para as populações imigrantes. Uma das ações mais recentes foi a aprovação da Lei nº 16.685/2018 que permite a revalidação gratuita de diplomas de refugiados, possibilitando que profissionais estrangeiros ingressem no mercado de trabalho e contribuam com suas qualificações.

Além disso, a Assembleia tem promovido audiências públicas e seminários para debater temas como o combate à discriminação contra imigrantes e a defesa de trabalho digno, reconhecendo os desafios enfrentados por essas comunidades no acesso a oportunidades.

Atos solenes e eventos culturais também fazem parte das iniciativas da Alesp, como a celebração dos 116 anos da imigração japonesa, que homenageou o legado de uma das maiores comunidades imigrantes do estado. Essas ações reforçam o papel da Assembleia na valorização de quem decide construir uma vida em um novo país.