Defensores do bem-estar animal veem acordo Mercosul-UE como chance para impor práticas de manejo

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12/04/2023 12:33 | Atividade Parlamentar | Da assessoria do deputado Carlos Giannazi

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Audiência Pública sobre o bem-estar animal<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-04-2023/fg298424.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Por iniciativa do deputado Carlos Giannazi (PSOL), foi realizada na Alesp, em 10/4, uma audiência pública para debater a inclusão de mecanismos que garantam condições de bem-estar animal em um futuro acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia.

Iniciadas em 1999, essas negociações passaram por avanços e recuos durante 21 anos, até que, em junho de 2020, as duas partes concordaram com pilares político e de cooperação. O passo seguinte para que o acordo se tornasse realidade seria a ratificação por cada um dos países envolvidos. Mas com o desastre internacional que foi o governo Bolsonaro, especialmente na área ambiental, essa fase se tornou intransponível nos parlamentos das 27 nações da UE.

Em um contexto que exige unanimidade, ao menos seis parlamentos nacionais se negaram a aderir, especialmente para não se tornarem cúmplices do aumento da devastação na Amazônia, já que o incremento das exportações de grãos e de proteína animal pressiona a fronteira agrícola sobre a área de floresta.

Protocolo adicional

Especialista em legislação europeia de comércio exterior e membro do Eurogroup for Animals, Daniel Vega Perez relatou que os termos do acordo que vem sendo costurado há décadas se tornaram obsoletos, pois são de um tempo que a UE não se preocupava com as consequências que poderiam advir em países terceiros. Com as novas diretrizes da comunidade europeia - que incluem o Pacto Verde (Green Deal), aprovado em 2020, e o recente Regulamento Europeu sobre Produtos Livres de Desmatamento, de setembro de 2022 -, a única chance de o acordo com o Mercosul vigorar será com a implementação de um protocolo adicional.

Para os grupos ambientalistas, essa é a oportunidade de lutar para que seja feito um bom acordo que, resumido nas palavras de Vega Perez, vetaria o comércio de bens e serviços que afetassem negativamente os animais, as pessoas e o meio ambiente. "Temos de estar seguros que a carne que se exporte do Brasil não seja de animais criados em confinamento, seja ela de gado ou de aves. O bem-estar animal beneficia não só os animais, mas também a saúde pública", acrescentou.

Difundindo conscientização

Coordenando o evento, a diretora-executiva da Animal Equality Brasil, Carla Lettieri, explicou que o foro mais adequado para aquele debate seria em nível federal, por uma questão de competência da Presidência da República e do Congresso Nacional em relação aos assuntos internacionais. Por isso, ela aceitou imediatamente a proposta da deputada federal Luciene Cavalcante (PSOL-SP), que ofereceu apoio para levar o tema ao Congresso Nacional, inicialmente com a realização de uma audiência pública na Câmara dos Deputados, mas também com reuniões nos ministérios envolvidos, especialmente no Itamaraty.

Com relação ao debate que estava sendo realizado na Assembleia, Carla o definiu como um meio importante de levar a temática ao maior número possível de pessoas. "Esse acordo vai afetar toda a população latino-americana, seja nas relações trabalhistas, no acesso a serviços públicos, na concorrência entre empresas? E eu não vejo esse debate na boca do povo", lamentou. Por esse motivo, a ambientalista ficou também entusiasmada com a proposta do vereador Celso Giannazi (PSOL) de abrir as portas do Palácio Anchieta para os defensores dos animais. "Nós vamos sim ocupar o espaço da Câmara Municipal. São Paulo é um dos municípios mais importantes do país, e o que acontece aqui reflete no Brasil inteiro", agradeceu.

Especificamente em relação à questão dos direitos dos animais, Carla quer aproveitar os debates para disseminar conscientização. "A maior parte das pessoas em nosso país ainda é indiferente ou conivente com a crueldade animal", lamentou.

Ampla aliança

Lisa Gunn, diretora-executiva na Proteção Animal Mundial, inseriu a questão do bem-estar dos animais criados para alimentação humana - conceito que também deve ser repensado - com outros temas correlatos, capazes de atrair aliados para a causa. Ela deu o exemplo do desmatamento, que em princípio seria uma pauta apenas ambientalista, mas que é também foco dos protetores dos animais, uma vez que a devastação da flora é a principal causa da mortandade da fauna silvestre.

"Nós devemos buscar uma aliança com outros setores da sociedade preocupados com o incremento das exportações. Nós estamos falando da ampliação de um modelo de produção nocivo", disse, ampliando a abordagem para outros pontos de vista além da proteção animal, como a defesa dos pequenos e médios produtores; as salvaguardas aos direitos dos trabalhadores assalariados; a preservação do meio ambiente e a mitigação das mudanças climáticas.

Neocolonialismo

Para João Cayres, secretário regional da Public Services International (PSI - federação sindical global dos trabalhadores em serviços públicos), o acordo Mercosul-União Europeia tem características neocolonialistas. "Não é uma relação ganha-ganha. Nós temos muitas contradições, como a de vários agrotóxicos que são banidos na Europa, mas que podem ser usados em produtos exportados para lá. Essa é uma hipocrisia semelhante à da Alemanha, que baniu a energia nuclear em seu território, mas não vê problema em comprar energia gerada em usinas nucleares na Romênia e na Bulgária." Para ele, o acordo com a UE é, em seu conjunto, desvantajoso para o Brasil.


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