LEI N. 2.231, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1927

Dispondo sobre processos policiaes

O doutor Julio Prestes de Albuquerque, presidente do Estado de S. Paulo. Faço saber que o Congresso Legislativo decretou e eu promulgo a Lei seguinte : 

Artigo 1.º - São processos policiaes : 
§ 1.º - Os que tiverem por objecto os crimes previstos no Codigo Penal nos arts. 114 (motim ou desordem perante a Justiça); 119 (ajuntamento para commetter crime); 135 e seu § unico (desobediencia á autoridade); 148 primeira parte (imprudencia, negligencia ou impericia na arte ou profissão); 151, primeira parte (imprudencia, negligencia ou impericia que cause desastre em Estrada de Ferro); 153 § 1.° (damnificação de linhas, postes, etc.); 170 e 172 (trazer armas em eleição, etc); 184 e seu § unico (ameaças); 185 (ultrajes ao culto); 189, primeira parte, 190 e 191 (inviolabilidade dos segredos); 196, primeira parte, 198 e 201 (in violabilidade do domicilio); 204, 205 e 206 (liberdade de trabalho), com as modificações do Decreto n. 1162, de 12 de Dezembro de 1890, art. 1.º, n 1 e 2 ; 282 (ultraje publico ao pudor); 293 e seus §§ 1.º e 2.º (occultação ou abandono de menores); 306 (lesão corporal por imprudencia, negligencia ou impericia); 307 e seu § unico, 308, 309, §§ 1.º e 2.º 310 e seu § 1.º (duello); 316, § 2.º 319, §§ 1.º e 2.º, 320, §§ 1.º e 2.º (injuria); 329 (damno) 330, §§ 1.º, 2.º e 3.º (furto).
§ 2.º - Os que versarem sobre contravenções previstas no Codigo Penal nos artigos 364 e seu § unico, e 366 (violação das leis de inhumação e profanação dos tumulos e cemiterios); 367, §§ 1.º e 2.º, e 368 loterias e, rifas) com as modificações da lei 2.321, de 30 de Dezembro de 1910, artig e 31, 32 e 33; 369 e seu § unico, 370 e seu § unico, 371, 372, 374 jogo e aposta 375 (casa de penhores); 376 e 377 (fabrico e uso de armas); 378 (contravenções de perigo commum); 379 e 381 (nome supposto e outros disfarces); 382 e seu § 2.º (sociedades secretas); 383, 384, 385, 386 e 387 (uso illegal da arte typographica);388,384 ommissão de declarações no registo civil ); 389 e seu § unico e  390 (damno as cousas publicas ; 391, 392, 393, 394, 395, 396, 397 e seu § unico e 398(mendigos e ebrios); 399 e 400 e seu § unico, 402 e 403 (vadios e capoeiras), com as modificações do decreto n. 145, de 12 de Julho de 1893, artigo 2.° § 1.°, 2.° e 3.° 
§ 3.º - Os que tiverem por fim obrigar a assignar termo de tomar occupação e de segurança. 

Artigo 2.º - São competentes para organisar os processos policiaes:
1. - os delegados auxiliares e especialisados, em todo o Estado :
2. - os delegados de circumscripção, em toda a comarca da Capital;
3- os delegados regionaes, em toda a zona ;
4. - os demais delegados, em seus municipios ;
5.º- os commissarios de policia na Capital e nas sedes de região policial.

§ 1.º - Nos municipios onde houver mais de um delegado preferirá para funccionar no feito o que primeiro receber queixa ou denuncia das infracções, contravenções e crimes a que se refere esta lei.
§ 2. - A competencia das autoridades pol ciaes é somente para a crganisação preparatoria dos mesmos processos até ao ponto de serem estes remettidos ao juizo que tem de processar e proferir a sentença definitiva. 

Artigo 3.º - Compete aos Juizes de Direito preparar e julgar em primeira instancia, as infracções, contravensões e crimes mencionados nesta lei.
§ 1.º - Na comarca da Capital, compete funccionar nesses processos ao Juiz da 5.ª Vara Crime, na fórma da legislação vigente, e na de Santos ao respectivo Juiz Criminal.
§ 2.º - Nas comarcas onde houver mais de um Juiz funccionará indistinctamente qualquer delles,devendo, porém, o serviço ser equitativamente distribuido. 

Artigo 4.º - Compete ao Tribunal de Justiça julgar em ultima instancia os recursos e appellações das sentenças proferidas pelos Juizes de Direito.

Artigo 5.º - A autoridade policial que tiver conhecimento da existencia de qualquer dessas infracções organizará, de maneira summaria, uma syndicancia sobre a occurrencia, em um só termo onde constem as circumstancias do facto e as provas documentos ou testemunhas e a enviará ao Juiz de Direito.

Artigo 6.º - De posse da sindicancia remettida pela policia, o promotor publico, a quem so dará vista, offerecerá, apreciando-a a denuncia, capitullando as infracções, ou re quererá ao Juiz competente o archivamento.

Artigo 7.º - Essa syndicancia poderá ser sempre renovada pela policia.

Artigo 8.º - Apresentada a queixa ou denuncia de qualquer das infracções, contravenções ou crimes de que trata o art 1.°, §§ 1.° 2.° e 3.° desta lei, o Juiz competente mandará citar o deliquente para ver-se processar na pri meira audiencia 
§ 1.º - O escrivão ou official de justiça permittirá ao deliquente a leitura do requerimento ou auto, mesmo copial-o, quando o queira fazer. 
§ 2.º Não comparecendo o deliquente na audiencia aprazada, se inquirirão summariamente as testemunhas, reduzindo-se tudo a escripto, nomeando-se um curador ao ausente.
§ 3.º - Comparecendo o diliquente, o juiz lhe fará a leitura da queixa ou denuncia, receberá a defeza, inquirirá as testemunhas e fará as perguntas que entender necessarias sendo tudo escripto nos autos, aos quaes mandará juntar a esposição e documentos que a parte offerecer. 
§ 4.º - Si as testemunhas não puderem ser inquiridas na primeira audiencia continuará o processo na seguinte, até que sejam colhidos todos os esclarecimentos necessarios. 
§ 5.º - Terminado o processo preparatorio, poderão as partes, dentro de 24 horas, contadas da ultima audiencia, examinar os autos no cartorio e offerecer as allegações escriptas que julgarem convenientes a bem do seu direito, regulando se o praso de modo que não seja prejudicada a defeza. Si houver mais de um reu o praso será de 48 horas. 
§ 6.º - Findo o praso, o promotor, analisando as peças do processo, emittirá seu parecer fundamentado e mandará que os autos sejam remettidos ao juiz que tiver de proferir sentença. 
§ 7.º - Essa remessa se fará dentro de 48 horas decorridas da ultima audiencia, sob pena de multa de 20$000 a 100$000, que pela autoridade julgadora será imposta a quem der causa á demora. 

Artigo 9.º - Em todos os termos desses processos, quando instaurados por queixa da parte offendida, será ou vido o promotor publico da comarca de accordo com o art; 408 do Codigo Penal.

Artigo 10. - Não é formalidade essencial correrem os termos dos processos policiaes precisamente nas audiencias ordinarias do Juizo, podendo a autoridade processante designar as audiencias extraordinarias que forem necessarias.

Artigo 11. - A parte queixosa ou o promotor publico poderão arrolar de duas a cinco testemunhas.
§ unico - O promotor ou o queixoso podem offerecer novas testemunhas desde que não tenham sido ouvidas em numero de cinco. 

Artigo 12. - As testemunhas devem ser inquiridas pela autoridade processante, cada uma de per si, e de modo que umas não saibam ou não ouçam as declarações das outras, nem as respostas do autor ou do reu

Artigo 13. - O juiz ou autoridade processante não tem arbitrio para recusar ás partes qualquer pergunta ás testemunhas, excepto si não tiverem relação alguma com a exposição feita na queixa ou denuncia, devendo, porém, ficar consignada no termo da inquirição a pergunta recusada.

Artigo -14. - Si o accusado fôr maior de 18 e menor de 21 annos de edade, deve o juiz ou autoridade processante dar-lhe curador.

Artigo 15. - Ao accusado será facultado offerecer, conjunctamente com a sua defesa, quaesquer documentos ou justificações processadas em outro juizo, para serem apreciados como fôr de direito.

Artigo 16. - Antes de proferir a sentença deverá o juiz de direito rectificar o processo no que fôr preciso.

Artigo 17. - Proferida pelo juiz a sentença condemnatoria, será o vadio ou vagabundo, se for maior de 21 annos de edade, recolhido á cadeia por mandado do mesmo juiz.
§ unico. - Essa mesma sentença condemnará o vadio ou vagabundo á assignar um termo no qual se obrigue a tomar occupação doutro de 15 dias contados do cumprimento da pena. 

Artigo 18. - Logo que o carcereiro tenha lançado o assento da entrada na cadeia, do preso ou condemnado nas penas do art 399 do Codigo Penal, como vadio ou vagabuudo, remetterá a certidão do assento á auctoridade processante.
§ 1.º - Compete á auctoridade processante, logo que receba a certidão do assento, fazer o vadio ou vagabundo assignar o termo, no qual se obrigue a tomar occupação dentro de 15 dias contados do cumprimento da pena.
§ 2.º - Esse termo será lavrado pelo escrivão da respectiva auctoridade e nelle se fará menção da sentença condemnatoria e do assento, com as respectivas datas; e, depois de lido, será assignado pela auctoridade e pelo con- , demnado, si souber e quizer assignar, ou por duas testemunhas, si o condemnado declarar que não sabe ou não pode, ou não quer assignar, declaração que tambem deve constar do termo
§ 3.º - Assignado o termo, será registrado «verbo ad verbum» no livro respectivo, e depois autuado com a certidão do assento. 

Artigo 19 - Si o termo fôr quebrado, a autoridade policial procederá contra o infractor pela forma estabelecida no art. 5. 

Artigo 20. - Quebrado fica o termo sempre que o accusado não prove haver tomado, dentro de 15 dias posteriores ao cumprimento da pena, occupação licita e honesta, isto é, occupação não prohibida por lei ou conforme á moral e aos bons costumes.

Artigo 21. - Si o termo fôr quebrado o que importa em reincidencia o infractor, depois de sentenciado, será recolhido a um estabelecimento correccional do Estado, nes termos da legislação em vigor.
§ unico. - Si o infractor fôr extrangeiro, será deportado. 

Artigo 22. - A pena imposta aos infractores, entretanto, ficará extincta, si o condemnado provar superveniente acquisição de renda bastante para sua subsistencia; e suspensa, si apresentar fiador idoneo que por elle se obrigue. 
§ unico. - A sentença que, a requerimento do fiador. julgar quebrada a fiança, tornará effectiva a condemnação suspensa por virtude della. 

Artigo 23. - Quebrada fica a fiança pela continuação ou reincidencia na pratica de qualquer das contravenções definidas nos artigos 374 e 399 do Codigo Penal ou do artigo 2.°. do Decreto Federal n. 145, de 12 de Julho de 1893. 
§ unico. - O quebramento da fiança importará sempre na  effectividade da condemnação suspensa em virtude della 

Artigo 24. - A prova de quebramento da fiança será processada summariamente pela autoridade policial, «ex-officio» ou a requerimento do fiador ou do promotor publico, ouvindo-se duas a cinco testemunhas com ultimação do afiançado, ao qual será concedido o praso de 24 horas para apresentar a sua defesa, facultando-se-lhe, para isso, o exame dos autos em cartorio e devendo o respectivo julgamento ser feito pelo mesmo juiz que houver proferido a sentença condemnatoria do afiançado, ou pelo seu substituto legal, para o que será feita a remessa dos autos logo após o encerramento do processo prob torio.

Artigo 25. - Não será permittida nova fiança ao réu que o uma vez tenha quebrado a fiança prestada

Artigo 26. - A fiança na hypothese do art 401, do Codigo Penal, segunda parte, é pessoal, incumbindo á autoridade policial, ou ao juiz. aquilatar da idoneidade do fiador.

Artigo 27. - Fallecendo o fiador, ausentando-se este para logar incerto e não sabido, ou deixando de reunir as necessarias condições de idoneidade, mandará a autoridade policial, ou o juiz, citar o afiançado, dentro de cinco dias, para prestar nova fiança, sob pena de se tornar effectiva a condemnação suspensa.

Artigo 28. - O Governo expedirá regulamento para a fiel execução desta lei, que entrará em vigor na data da sua publicação.

Artigo 29. - Revogam-se as disposições em contrario. O Secretario de Estado dos Negocios da Justiça e da Segurança Publica assim a faça executar.

Palacio do Governo do Estado de São Paulo, em 20 de Dezembro de 1927.

JULIO PRESTES DE ALBUQUERQUE
A. C. de Salles Junior

Publicada na Directoria da Segurança Publica, da Secretaria de Estado dos Negocios da Justiça e da Segurança Publica, aos 20 de Dezembro de 1927 - O Director, Augusto Leite.