Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo Ficha informativa

DECRETO N° 68.828, DE 04 DE SETEMBRO DE 2024

Institui o Programa Muralha Paulista e dá providências correlatas

O GOVERNADOR DO ESTADO DE SÃO PAULO, no uso de suas atribuições legais,  

Decreta:  

Seção I  

Do Programa Muralha Paulista, dos objetivos e dos princípios 

Artigo 1° - Fica instituído, junto à Secretaria da Segurança Pública, o Programa Muralha Paulista, com os objetivos de restringir a mobilidade criminal e aumentar a probabilidade de prisão de criminosos durante seus deslocamentos no território paulista.  

§ 1° - O programa de que trata o "caput" deste artigo é constituído por um conjunto integrado de soluções tecnológicas de infraestrutura física, de operação em nuvem e de inteligência artificial.  

§ 2° - Os dados e informações produzidos no âmbito do Programa Muralha Paulista poderão ser utilizados para a localização de pessoas desaparecidas.  

Artigo 2° - O Programa Muralha Paulista é orientado pelos seguintes princípios:  

I - promoção de suporte informacional e tecnológico à formulação e implementação de políticas de segurança pública voltadas ao controle dos crimes, em especial, os crimes contra a vida e o patrimônio;  

II - restrição do acesso de criminosos à infraestrutura logística do Estado de São Paulo para o transporte de produtos irregulares ou ilegais;  

III - compromisso incondicional com a proteção de dados pessoais, de que trata a Lei federal n° 13.709, de 14 de agosto de 2018 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais).  

Artigo 3° - Para os fins do Programa Muralha Paulista, considera-se mobilidade criminal o deslocamento de criminosos que se encontrarem:  

I - durante ou logo após o cometimento de:  

a) crimes violentos cometidos em vias públicas urbanas, contra pessoas em trânsito a pé ou em veículos; 

b) crimes violentos cometidos contra usuários dos sistemas de transportes em massa, público ou privado, no embarque ou no desembarque em pontos de ônibus, terminais de ônibus, estações de trens e metrô, portos e aeroportos;  

c) crimes violentos cometidos contra pessoas que se encontrem em locais privados de acesso público, passíveis de monitoramento, como em condomínios residenciais e empresariais, "shoppings centers", praças de shows e em locais similares;  

d) crimes de roubo ou furto de cargas ou de veículos destinados ao transporte de cargas;  

e) crimes de oportunidade, violentos ou não, em locais com grande circulação e concentração de pessoas, como em áreas comerciais, áreas de eventos e estádios esportivos e outros locais similares;  

II - durante o transporte de pessoas ou de produtos irregulares ou ilegais nas vias públicas, portos e aeroportos conveniados, com a finalidade de:  

a) traficar pessoas, em especial mulheres, crianças e membros de outros grupos vulneráveis;  

b) traficar drogas ilícitas;  

c) traficar armas de fogo;  

d) introduzir no Estado produtos de contrabando e descaminho, em especial os controlados;  

e) traficar animais ou produtos da flora ou fauna nativa;  

f) evadir divisas ou transportar irregularmente dinheiro em espécie;  

g) remoção de bens e produtos de maneira irregular do Estado;  

III - com mandado de prisão expedido e ainda não cumprido;  

IV - em descumprimento:  

a) de mandados de medidas cautelares e protetivas;  

b) das restrições de circulação de local e horário decorrentes de livramento condicional, saída temporária, progressão de regime e demais benefícios que permitam o cumprimento de pena fora de unidade prisional.  

Seção II  

Dos produtos, dos usuários e dos colaboradores do programa  

Artigo 4° - São produtos do Programa Muralha Paulista:

I - as consultas aos registros de dados audiovisuais armazenados nos centros de dados ("data centers") da Secretaria da Segurança Pública, dos seus órgãos policiais e dos demais entes conveniados, captados pelos sensores externos, próprios ou de terceiros;

II - as consultas às bases de dados armazenadas nos centros de dados ("data centers") da Secretaria da Segurança Pública, dos seus órgãos policiais e dos demais entes conveniados;  

III - as soluções de análise de dados (soluções de "analytics") derivadas das aplicações de tratamento de dados desenvolvidas no âmbito da Secretaria da Segurança Pública;  

IV - os alertas e eventos digitais.  

Artigo 5° - Os produtos do Programa Muralha Paulista serão utilizados para o planejamento, a formulação e o monitoramento de políticas de segurança pública integradas com o objetivo de apoiar os órgãos policiais do Estado na:  

I - prevenção das ações ilícitas consideradas como problemas criminais priorizados;  

II - pronta resposta aos problemas criminais, em especial os mais violentos e os mais recorrentes;  

III - constituição de provas digitais, com cadeia de custódia garantida, sobre os comportamentos mais violentos ou recorrentes;  

IV - produção de conhecimento sobre as dinâmicas da mobilidade criminal e os padrões de vitimização, por tipo de vítima, tipos de ambiente e horários.  

Parágrafo único - Os produtos de que trata o "caput" deste artigo serão utilizados exclusivamente para fins de segurança pública.  

Artigo 6° - São usuários do Programa Muralha Paulista:  

I - a Secretaria da Segurança Pública;  

II - mediante prévia celebração de convênio ou de termo de cooperação:  

a) os demais órgãos e entidades da Administração Pública direta e indireta do Estado;  

b) os Municípios paulistas;  

c) os integrantes operacionais do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), instituído pela Lei federal n° 13.675, de 11 de junho de 2018;  

d) os órgãos e entidades da Administração Pública direta e indireta dos demais entes federativos, desde que tenham relação com a área de segurança pública;  

e) as pessoas jurídicas concessionárias ou consorciadas, desde que administrem ou prestem serviços públicos que, pela natureza das suas atividades, despertem potencial interesse da segurança pública, atendidos os pressupostos da legislação vigente.  

§ 1° - Os usuários do Programa Muralha Paulista poderão fornecer dados e utilizar os produtos do programa.  

§ 2° - Para a utilização dos produtos previstos no artigo 4° deste decreto, o usuário do programa receberá um perfil de acesso, estabelecido e restringido de acordo com sua atividade finalística.  

§ 3° - Sem prejuízo do disposto no § 2° deste artigo, para que tenham acesso aos produtos do Programa Muralha Paulista, as pessoas jurídicas mencionadas na alínea "e" do inciso II deste artigo deverão comprovar a existência de interesse da segurança pública.  

Artigo 7° - São colaboradoras do Programa Muralha Paulista as pessoas físicas ou jurídicas, não referidas no artigo 6° deste decreto, que optarem por conectar seus sensores de captação audiovisual ou de registro de dados na infraestrutura do Programa Muralha Paulista.  

§ 1° - A colaboração de que trata o "caput" deste artigo dar-se-á mediante a subscrição de termo de consentimento e adesão e não acarretará qualquer contrapartida estatal.  

§ 2° - As pessoas físicas ou jurídicas de que trata o "caput" deste artigo não terão acesso aos produtos do programa.  

Seção III 

Do conjunto integrado de soluções tecnológicas de infraestrutura física, operação em nuvem e de inteligência artificial do programa  

Artigo 8° - Compõem o conjunto integrado de soluções tecnológicas de infraestrutura física, de operação em nuvem e de inteligência artificial do Programa Muralha Paulista:  

I - os sensores de captação audiovisuais ou de georreferenciamento da Secretaria da Segurança Pública, bem como os dados por eles captados;  

II - os dados captados pelos sensores audiovisuais ou de georreferenciamento, bem como os demais registros de bancos de dados, quando trafegados para a infraestrutura da Secretaria da Segurança Pública, compartilhados pelos usuários de que tratam as alíneas do inciso II do artigo 6° e dos colaboradores de que trata o artigo 7° deste decreto;  

III - as redes de tráfego próprias do programa;  

IV - os centros de dados ("data centers"), servidores e demais equipamentos físicos próprios do programa;  

V - as bases de dados próprias do programa;  

VI - os "softwares" e códigos-fontes próprios, inclusive aqueles que são operados em nuvem, desenvolvidos por demanda da Secretaria da Segurança Pública;  

VII - as aplicações de inteligência artificial desenvolvidas por demanda da Secretaria da Segurança Pública.  

§ 1° - O conjunto integrado de que trata o "caput" deste artigo será gerenciado pela Secretaria da Segurança Pública.  

§ 2° - Os sensores legados de captação audiovisuais e de georreferenciamento dos órgãos policiais vinculados à Secretaria da Segurança Pública, bem como os dados por esses gerados, integrarão a infraestrutura do Programa Muralha Paulista.  

§ 3° - Para que possam compor o conjunto integrado de soluções tecnológicas do programa, os sensores de captação audiovisual ou de georreferenciamento dos usuários e colaboradores, legados ou atuais, deverão possuir capacidade mínima para obtenção e transmissão de dados considerados úteis, conforme especificações a serem definidas pela Secretaria da Segurança Pública.  

§ 4° - Para fins de aferição de sua compatibilidade, os sensores legados de captação audiovisual ou georreferenciamento deverão ser testados pela Secretaria da Segurança Pública antes de sua integração à infraestrutura do programa.  

§ 5° - Para fins do disposto no inciso II deste artigo, os sensores de captação audiovisual dos colaboradores deverão estar voltados para as vias públicas.  

§ 6° - Serão considerados de interesse da segurança pública, na forma da regulamentação editada pelo Secretário da Segurança Pública, os dados captados pelos sensores audiovisuais ou de georreferenciamento:  

1 . existentes em órgãos ou entidades estaduais;  

2 . custeados direta ou indiretamente por recursos públicos;  

3 . vinculados a concessões e parcerias públicoprivadas.  

Seção IV  

Da operacionalização do programa  

Artigo 9° - O Programa Muralha Paulista será operacionalizado por meio da integração, no centro de fusão de dados ("fusion center") da Secretaria da Segurança Pública, dos dados primários provenientes dos diferentes tipos de equipamentos advindos de origens diversas, conforme artigo 8° deste decreto, para o processamento e a transformação em dados estruturados de interesse da segurança pública.  

Artigo 10 - A implementação do Programa Muralha Paulista dar-se-á nas seguintes frentes:  

I - criação e gestão da infraestrutura de rede e comunicação própria do Programa Muralha Paulista, constituindo-se como uma rede privativa e dedicada exclusivamente ao programa, de forma a prover-lhe capacidade de trânsito de dados e informações com velocidade e segurança que o sistema requer;  

II - ampliação e manutenção da cobertura do parque de sensores de captação audiovisual e de georreferenciamento do Programa Muralha Paulista, por meio da incorporação de câmeras e demais equipamentos de mesma natureza, mediante aquisições próprias, celebração de convênios ou de termos de cooperação com usuários ou subscrição de termos de consentimento e adesão com colaboradores;  

III - aquisição, desenvolvimento e gestão da plataforma de integração de dados e imagens para o Programa Muralha Paulista, a fim de prover condições para as atividades de análise, inclusive com uso de inteligência artificial, apoiada por curadoria humana, para definição de prioridades e focos na formulação e implementação das políticas públicas integradas de controle do crime;  

IV - aquisição, desenvolvimento e gestão de um sistema crítico para a geração de alertas e produção de consciência situacional do Programa Muralha Paulista.  

Parágrafo único - O sistema crítico, de que trata o inciso IV deste artigo, será constituído a partir da modernização e de correções de segurança da informação do Sistema Detecta ou do estabelecimento de parâmetros para sua eventual substituição.  

Seção V  

Das obrigações dos órgãos e entidades da Administração Pública direta e indireta do Estado 

Artigo 11 - Para fins do desenvolvimento do Programa Muralha Paulista, cabe à Secretaria da Segurança Pública:  

I - responsabilizar-se:  

a) pela gestão de projetos técnicos voltados à execução do programa de acordo com as frentes elencadas nos incisos I a IV do artigo 10 deste decreto;  

b) pela integração e fusão das múltiplas fontes de dados do programa, por meio da estruturação de um centro de fusão de dados ("fusion center");  

II - estabelecer os protocolos de segurança de dados;  

III - definir e padronizar os relatórios de auditoria do uso dos sistemas;  

IV - padronizar a governança de dados e informações;  

V - estabelecer e dar publicidade sobre os requisitos mínimos dos equipamentos compatíveis com a infraestrutura do programa;  

VI - relacionar-se com os usuários e colaboradores, de que tratam o inciso II do artigo 6° e o artigo 7° deste decreto, bem como dar suporte para a integração de seus equipamentos na infraestrutura do programa;  

VII - estruturar e salvaguardar o repositório do programa com os dados e informações dos usuários e colaboradores;  

VIII - instituir uma comissão de governança do programa que decidirá sobre os níveis de acesso dos postulantes a usuários.  

Artigo 12 - Os órgãos e entidades mencionados na alínea "a" do inciso II do artigo 6° deste decreto deverão integrar seus sensores de captação audiovisual ou de georreferenciamento ao Programa Muralha Paulista, mediante prévia celebração de convênio ou de termo de cooperação, observado o disposto no artigo 14 deste decreto.  

Parágrafo único - Os usuários de que trata o "caput" deste artigo poderão, quando de interesse da segurança pública, integrar suas bases de dados ao Programa Muralha Paulista, observado o disposto no § 6° do artigo 8° deste decreto.  

Artigo 13 - As concessões e parcerias público-privadas celebradas após a instituição do Programa Muralha Paulista deverão prever, nos respectivos instrumentos jurídicos, o dever de integração das câmeras de videomonitoramento das concessionárias ao Programa Muralha Paulista, observando-se os requisitos de compatibilidade a que se refere o inciso V do artigo 11 deste decreto.  

§ 1° - O disposto no "caput" deste artigo abrangerá todas as modalidades de concessão permitidas em lei, sempre que houver potencial interesse da segurança pública, nos termos do § 6° do artigo 8° deste decreto.  

§ 2° - A Secretaria da Segurança Pública poderá colaborar no geoposicionamento dos equipamentos a que se refere o "caput" deste artigo.  

§ 3° - As concessionárias signatárias dos instrumentos jurídicos de que trata o "caput" deste artigo poderão, quando de interesse da segurança pública, integrar os dados de outros sensores ao Programa Muralha Paulista, observado o disposto no § 6° do artigo 8° deste decreto.  

Seção VI 

Da celebração de convênios ou termos de cooperação e da subscrição do termo de consentimento e adesão  

Artigo 14 - Para a celebração de convênios ou termos de cooperação, os órgãos e entidades mencionados no inciso II do artigo 6° deste decreto manifestarão sua intenção por escrito à Secretaria da Segurança Pública.  

§ 1° - Os processos de celebração de convênios ou, termos de cooperação observarão, no que couber, o disposto no Decreto n° 66.173, de 26 de outubro de 2021.  

§ 2° - Os instrumentos de convênio ou de termo de cooperação conterão cláusula com declaração de ciência e concordância acerca da obrigatoriedade de observância da utilização dos produtos do Programa Muralha Paulista para fins exclusivos de segurança pública.  

Artigo 15 - Os colaboradores de que trata o artigo 7° deste decreto subscreverão apenas termo de consentimento e adesão, que conterá cláusula com declaração de ciência e concordância de que não receberão qualquer compensação financeira ou suporte técnico oneroso por parte do Estado.  

Seção VII  

Disposições Finais  

Artigo 16 - Os órgãos e entidades da Administração Pública direta e indireta do Estado deverão, a partir da publicação deste decreto, obedecer à padronização definida pela Secretaria da Segurança Pública para aquisições ou locações de novos equipamentos sensores de captação audiovisual ou georreferenciamento de interesse da segurança pública.  

Parágrafo único - A Secretaria da Segurança Pública encaminhará à Secretaria de Gestão e Governo Digital as especificações mínimas dos equipamentos mencionados no "caput" deste artigo, para fins de adequação do Volume 13 dos Estudos Técnicos de Serviços Terceirizados - CADTERC, que trata da prestação de serviços de vigilância eletrônica.  

Artigo 17 - O Secretário da Segurança Pública editará normas complementares necessárias ao cumprimento deste decreto.  

Artigo 18 - Os representantes do Estado nas fundações instituídas ou mantidas pelo Poder Público, nas empresas públicas e nas sociedades de economia mista adotarão as providências necessárias ao cumprimento deste decreto, nos respectivos âmbitos.  

Artigo 19 - Este decreto entra em vigor na data de sua publicação, ficando revogadas as disposições em contrário, em especial, o Decreto n° 60.761, de 27 de agosto de 2014.  

TARCÍSIO DE FREITAS  

Arthur Luis Pinho de Lima  

Guilherme Muraro Derrite  

Caio Mario Paes de Andrade