Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo Ficha informativa

DECISÃO DO PRESIDENTE N° 2, DE 2025

O PRESIDENTE DA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SÃO PAULO, no uso de suas atribuições legais, CONSIDERANDO o teor da denúncia formulada por BEATRIZ LOURENÇO DO NASCIMENTO, THIAGO RUBENS DA SILVA, DÉBORA DIAS DOS SANTOS, JOSÉ HENRIQUE VIÉGAS LEMOS, LUANA CAROLINA SANTOS VIEIRA, FÁBIO FERREIRA DAS VIRGENS JÚNIOR, CRISTINA ADELINA DE ASSUNÇÃO, ADRIANA DE CÁSSIA MOREIRA, LUANA FRANCA AMORIM, SIMONE FERREIRA NASCIMENTO e RAMATIS JACINO, contendo pedido de impeachment contra o Senhor Governador do Estado de São Paulo, Tarcísio de Freitas, e o Senhor Secretário de Segurança Pública, Guilherme Muraro Derrite, com fundamento no alegado cometimento de crime de responsabilidade decorrente de ações e omissões na gestão da segurança pública no Estado de São Paulo; CONSIDERANDO a competência desta Assembleia Legislativa para o processamento e julgamento de denúncia por crime de responsabilidade atribuído ao Governador do Estado, bem como a seus Secretários, por crimes conexos àqueles atribuídos ao Chefe do Poder Executivo; CONSIDERANDO, no exercício do juízo de admissibilidade da denúncia por esta Presidência, a constatação do cumprimento apenas parcial dos requisitos contidos na Lei federal n.° 1.079/50, culminando no reconhecimento de sua irregularidade sob o aspecto formal; CONSIDERANDO que as imputações efetuadas pelos denunciantes ao Governador e ao Secretário de Estado residem, em suma, na caracterização da prática de crime de responsabilidade em virtude: (i) da indiferença do Governador, por meio de suas falas, às mortes causadas pela atuação policial; (ii) da tentativa atribuída ao Governador de forjar um atentado contra si próprio, que teria resultado na execução de um homem na favela de Paraisópolis; (iii) do excesso de letalidade na carreira militar do Secretário Derrite, que implicaria na imagem de permissividade diante da prática de violência na atuação policial, permissividade essa que seria admitida pelo Governador em algumas de suas falas: (iv) da indicação de notícias públicas que ilustrariam ações e omissões do Governador e do Secretário à frente da segurança pública; (v) da existência de uma escalada de violência policial com viés racista; (vi) da posição contrária do Governador ao uso de câmeras corporais por parte dos policiais, o que implicaria na redução da eficácia do equipamento e na dificuldade de responsabilização; (vii) da existência de casos frequentes de condutas ilegais, como prisões arbitrárias e execuções sumárias sem a adoção de punições e protocolos eficazes, implicando na naturalização da violação de direitos humanos em operações policiais; (viii) da violação a compromissos internacionais assumidos pelo Brasil em virtude das práticas violentas imputadas; (ix) do aumento da letalidade policial em territórios periféricos mediante uso desproporcional da força e por práticas de violência racial, como nos casos da Favela Naval; da Favela Nova Brasília x Brasil, da ADPF 635 - ADPF das Favelas do Rio de Janeiro, e da ADPF 973- Estado inconstitucional de coisas e racismo, ainda em tramitação no STF, que questiona a perpetuação do racismo estrutural na atuação das polícias no Brasil; (x) da violação à dignidade, honra e decoro do cargo por meio das declarações públicas do Governado; e (xi) da omissão do Governo do Estado em não adotar políticas públicas de segurança integradas com os direitos sociais e por não adotar determinações e recomendações judiciais de preservação de direitos fundamentais e direitos humanos, especialmente pela inação em implementar oficialmente o regime de obrigatoriedade do uso de câmeras corporais; CONSIDERANDO, no exercício do juízo de admissibilidade da denúncia por esta Presidência sob o aspecto material, e em contraponto às alegações efetuadas pelos denunciantes: (a) que a questão atinente ao aumento do número de casos envolvendo a violência e letalidade nas ações policiais integra a análise de mérito da gestão do Senhor Governador do Estado e do Senhor Secretário à frente da pasta da Segurança Pública, e não possuem, sob a perspectiva literal, liame direto e objetivo aos tipos previstos na Lei n.° 1.079/50; (b) a ausência de comprovação da deliberada intenção, nas políticas públicas voltadas à segurança pública, de atuação policial com viés racista, cuja caracterização demandaria o estabelecimento de atuação inequívoca com tal propósito; (c) a ausência de comprovação da indiferença e omissão do Governador e do Secretário de Segurança Pública do Estado no tocante ao aumento dos casos de violência policial, que se coloca de forma contrária às informações veiculadas pela mídia quanto à atuação da Corregedoria da Polícia Militar para a verificação de eventuais abusos; (d) a necessidade de clara demonstração da responsabilização do subordinado na prática de delitos funcionais ou de atos contrários à Constituição, para a incidência do disposto nos artigos 7°, item 5 e 9°, 3 da Lei n.° 1079/50, o que não restou demonstrado; (e) a ausência de concomitância do suposto atentado forjado contra o então candidato ao exercício das funções de Governador, bem como a ausência de comprovação da falsidade do fato após as investigações efetuadas pelos órgãos competentes; (f) a ausência de vinculação do crime de responsabilidade a postos ocupados pelo Secretário de Segurança Pública anteriormente à ocupação da pasta da Segurança Pública, salientando que referidos fatos estavam sujeitos aos procedimentos de caráter disciplinar próprios da organização policial ao longo de sua carreira; (g) que a questão do uso de câmeras corporais foi objeto de decisão do Supremo Tribunal Federal, e ainda se encontra sob o crivo da referida Corte para o julgamento definitivo, e que qualquer descumprimento nesse sentido deve ser reportado às instâncias competentes para a devida análise no bojo do processo; (h) a não caracterização da violação a tratado internacional e a decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos e do Supremo Tribunal Federal tendo em vista que não se vislumbra a possibilidade de responsabilização pessoal do Governador e do Secretário de Estado pelo descumprimento de decisões que não os vinculam diretamente; (i) a ausência de razoabilidade na imputação quanto à caracterização da prática de conduta incompatível com a dignidade, honra e decoro do cargo, a partir da situação fática específica; (j) a ausência de demonstração de que o Plano Estadual de Segurança Pública, estabelecido pela Resolução SSP n° 99, de 25 de novembro de 2019, e aprovado pelo Decreto n.° 65.657, de 27 de abril de 2021, estaria em contrariedade face às determinações contidas na Política Nacional de Segurança Pública, não sendo suficiente à caracterização do crime de responsabilidade a mera alegação genérica acerca da não adoção de "políticas públicas de segurança integradas com os direitos sociais"; CONSIDERANDO, por fim, as determinações procedimentais contidas na Lei federal n.° 1.079, de 10 de abril de 1950, que define os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo de julgamento, e as razões deduzidas no Parecer n.° 145-0, de 2025, da douta Procuradoria da Assembleia Legislativa, contemplando os apontamentos jurídicos relativos à matéria,

DECIDE pelo NÃO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA, em virtude das razões acima elencadas, que apontam, além da inobservância de requisito de natureza formal, a ausência de fundamento jurídico e justa causa para o seu prosseguimento.

Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, em 9/5/2025.

ANDRÉ DO PRADO - Presidente