17 DE MAIO DE 2024

29ª SESSÃO SOLENE PARA ENTREGA DO PRÊMIO DRA. THEODOSINA ROSÁRIO RIBEIRO

        

Presidência: LECI BRANDÃO

        

RESUMO

        

1 - LECI BRANDÃO

Assume a Presidência e abre a sessão às 10h23min.

        

2 - CLAUDIA LUNA

Mestre de cerimônias, nomeia a Mesa e demais autoridades presentes.

        

3 - PRESIDENTE LECI BRANDÃO

Informa que a Presidência efetiva convocara a presente solenidade para "Entrega da Medalha Theodosina Rosário Ribeiro - Edição Carolina Maria de Jesus", por solicitação desta deputada. Convida o público para ouvir, de pé, o "Hino Nacional Brasileiro". Tece considerações sobre a relevância desta sessão solene. Lamenta a tragédia vivenciada pela população do RS.

        

4 - CLAUDIA LUNA

Mestre de cerimônias, anuncia a exibição de vídeo sobre Theodosina Rosário Ribeiro. Faz relato da história e anuncia a exibição de vídeo sobre Carolina Maria de Jesus.

        

5 - JULIA ROLAND

Secretária estadual de Mulheres do PCdoB, faz pronunciamento.

        

6 - CLAUDIA LUNA

Mestre de cerimônias, lê currículos e anuncia a entrega de comendas às homenageadas.

        

7 - FLÁVIA OLIVEIRA DE FRAGA

Jornalista, faz pronunciamento.

        

8 - PAULA BATISTA CHAVES DE LIRA

Jornalista, faz pronunciamento.

        

9 - MARIA NATALÍCIA DE PAULA

Líder comunitária, faz pronunciamento.

        

10 - JANAÍNA TEODORO

Ìyálorisa Omilade, sacerdotisa de candomblé, faz pronunciamento.   

 

11 - ANA KOTEBAN

Professora de sociologia, faz pronunciamento.

        

12 - MÁRCIA DE SOUZA TOBIAS

Professora de música, faz pronunciamento.

        

13 - TERESA CRISTINA CABRAL SANTANA

Juíza de direito, faz pronunciamento.

        

14 - MATILDE RIBEIRO

Professora na Unilab - Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira, faz pronunciamento.

        

15 - ELAINE SABINO NASCIMENTO

Presidente da AMNS - Associação de Mulheres Neide Sabino, faz pronunciamento.

        

16 - SOLANGE CRUZ BICHARA REZENDE

Presidente do Grêmio Recreativo Cultural da Escola de Samba Mocidade Alegre, faz pronunciamento.

        

17 - VERA EUNICE DE JESUS LIMA

Pedagoga, faz pronunciamento.

        

18 - NÉIA COSTA

Presidente do PCdoB de Carapicuíba, faz pronunciamento.

        

19 - PRESIDENTE LECI BRANDÃO

Reflete sobre sua história. Faz agradecimentos gerais. Encerra a sessão às 12h45min.

        

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- Assume a Presidência e abre a sessão a Sra. Leci Brandão.

 

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A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - Cumprimento novamente a todas as pessoas presentes. Eu sou a Claudia Luna e terei a oportunidade, de igual modo, a grande honra, de realizar este cerimonial. Comunicamos, então, que, neste exato momento, iniciamos a solenidade de entrega da presente medalha e solicitamos que ocupem os seus lugares e, por gentileza, deixem os seus aparelhos celulares no modo silencioso.

Bom dia, senhoras e senhores, sejam bem-vindos e bem-vindas à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo para a sessão solene com a finalidade de entrega da Medalha Theodosina Ribeiro. Comunicamos às pessoas presentes que esta sessão solene está sendo transmitida ao vivo pela TV Alesp pelo canal Alesp no YouTube.

Anunciamos para compor a Mesa principal a excelentíssima Sra. Deputada Leci Brandão, proponente desta sessão solene. (Palmas.) A Sra. Julia Roland, secretária estadual de Mulheres do PCdoB. (Palmas.)

Para iniciarmos formalmente a nossa sessão, com a palavra a nobre deputada Leci Brandão.

 

A SRA. PRESIDENTE - LECI BRANDÃO - PCdoB - Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos nos termos regimentais. Esta Presidência dispensa a leitura da Ata da sessão anterior.

Sras. Deputadas, Srs. Deputados, minhas senhoras, meus senhores, esta sessão solene foi convocada pelo presidente desta Casa, deputado André do Prado, atendendo à minha solicitação, com a finalidade de entregar a Medalha Theodosina Ribeiro.

Convido a todos os presentes para, em posição de respeito, ouvirmos o Hino Nacional Brasileiro.

 

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- É executado o Hino Nacional Brasileiro.

 

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A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - Informamos a ausência da neta e do filho da Dra. Theodosina Ribeiro, que, por questões de ordem de saúde de um membro da família, não puderam estar presentes. Desejamos, portanto, melhoras.

Anunciamos, neste instante, as seguintes presenças: Sr. Wilson Brito, presidente estadual do PCdoB; Sra. Kele Cristina, representando o deputado federal Orlando; coronel Rodolfo Guerra, representando o Comando Militar do Sudeste; Sra. Vera Lucia Gomes, representando o vereador Dr. Adriano Santos, da cidade de São Paulo; Sr. Claudio Fonseca, presidente do Sindicato dos Professores Municipais de São Paulo.

Sr. Peter Lucas, presidente da União da Juventude Socialista São Paulo - UJS; Sra. Sandra Mariano, coordenadora do Fórum Nacional de Mulheres Negras; Sr. João Carlos Cassiano, fundador do Conselho da Comunidade Negra; Sra. Edilia Aparecida, presidente do Conselho da Comunidade Negra Santa Rosa; Sra. Iara Bento, coordenadora do SOS Racismo a leste e a sempre deputada Ana Martins. (Palmas.)

Com a palavra, a nobre deputada Leci Brandão.

 

A SRA. PRESIDENTE - LECI BRANDÃO - PCdoB - Que Deus proteja, abençoe e ilumine todas, todos e todes que aqui estão. Embora este momento seja de celebração, não posso deixar de me manifestar sobre a tragédia que está acontecendo em nosso País.

Então, antes de mais nada, eu quero expressar a nossa solidariedade e reforçar a necessidade de reunirmos esforços pela população do Rio Grande do Sul. O que está acontecendo atinge todo o povo brasileiro, e este é um momento de união pelas vítimas, mas também de cobrar mudanças em relação às questões ambientais e sociais.

Estamos na edição da Medalha Theodosina Ribeiro, que neste ano presta uma homenagem à Carolina de Jesus. Por isso, inicio minha fala citando uma frase que está em sua primeira e mais conhecida obra, “Quarto de despejo”.

Lá, Carolina disse: “O Brasil precisa ser dirigido por uma pessoa que já passou fome. A fome também é professora”. Essa obra relata o cotidiano da escritora na favela do Canindé, em São Paulo, e conquistou uma imensa e rara acolhida de crítica e público em seu lançamento.

Carolina publicou outras obras depois dessa. Possuidora de muitos talentos, escreveu poemas, crônicas, peças de teatro e letras de música. Mas, depois de “Quarto de despejo”, veio o esquecimento, e todas nós sabemos o porquê.

Carolina viveu o que acontece com todas as mulheres pretas que não aceitam o lugar que a sociedade racista lhes reserva. Carolina passou pelo que passam as submissas, aquelas que não se intimidam. Também querem torná-las insignificantes, apagar suas palavras, calar a sua voz. Mas tempo é orixá, e o tempo não esquece.

O reconhecimento da grandiosidade de sua obra veio depois de sua morte. Ela partiu deixando um legado admirável. A importância histórica de Carolina Maria de Jesus para a luta antirracista e por moradia, entre outras, além da amplitude e complexidade de sua produção literária, sempre será inspiração e exemplo de resistência e de que a luta, a arte e a poesia podem e devem sempre andar juntas.

Apesar de todos os desafios, Carolina não desistiu, porque desistir nunca foi uma opção para quem escrever e existir eram a mesma coisa. Carolina, com sua prosa e sua poesia, presenteou o mundo com sua literatura de testemunho a partir de um olhar ímpar sobre si e sobre a cidade que a rodeava. Ela não apenas expôs a realidade em que vivia, mas também elaborou grandes reflexões sobre a indiferença e a profunda desigualdade social que ainda hoje persistem.

Certa vez, ela disse: “Não digam que eu fui rebotalho, que vivi à margem da vida. Digam que eu procurava por trabalho, mas sempre fui preterida”. Carolina transformou em poesia-protesto as violências e as tentativas de apagamento do nosso povo.

Assim como Carolina, também precisamos celebrar a memória de outra grande mulher que dá nome a esta medalha, Dra. Theodosina Rosário Ribeiro, primeira mulher negra a ser eleita deputada estadual por São Paulo. Ela, que infelizmente nos deixou em 2020, foi um exemplo de vida dedicado ao trabalho ético e aguerrido em favor das minorias.

A Dra. Theodosina sempre foi uma luz inspiradora para que todas nós perseguíssemos o ideal de vermos os espaços de poder sempre ocupados por aqueles e aquelas que, de fato, representam a maioria do nosso povo, com legitimidade.

Portanto, inspirados em Carolina e na Dra. Theodosina, estamos aqui hoje para reconhecer e celebrar outras grandes mulheres que estão na batalha não só por elas, mas por todas nós.

Todo o meu respeito, agradecimento e reconhecimento à trajetória de Matilde Ribeiro; Néia Costa; Teresa Cristina Cabral; Paula Chaves de Lira; Elaine Sabino Nascimento; Maria Natalícia de Paula; Ana Koteban; Ìyálorisa Omilade; Laura de Jesus Braga; Márcia de Souza Tobias; Vera Eunice de Jesus; Flávia Oliveira; Solange Cruz Bichara. (Palmas.)

Axé para todas elas. Que Deus e os nossos orixás continuem abençoando a caminhada de vocês.

Muito obrigada. (Palmas.)

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - Assistiremos neste instante a um vídeo sobre a Dra. Theodosina Ribeiro, que institui e dá nome à medalha que será outorgada às mulheres incríveis na sessão solene do dia de hoje.

 

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- É exibido o vídeo.

 

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A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - Nossa sessão solene de hoje é dedicada à Carolina Maria de Jesus. Mas quem é Carolina Maria de Jesus? Nascida em Sacramento, Minas Gerais, no dia 14 de março de 1914, o nome dessa mente brilhante batiza desde ruas e escolas a bibliotecas. Isso porque estamos falando de uma das mais destacadas escritoras da literatura brasileira.

Carolina teve uma vida dura, cheia de violência, discriminação racial e de gênero. Foi empregada doméstica, catadora de papel e recicláveis. Este último recurso foi por muito tempo a única fonte de renda para que pudesse sobreviver e cuidar de seus filhos.

Neta de escravizados e filha de uma lavadeira analfabeta, ela tinha mais sete irmãos. Teve acesso ao estudo formal somente na infância, por apenas dois anos. Com o conhecimento que adquiriu enquanto estudante, e por seus esforços diários de estudo e escrita, utilizando papéis que ela encontrava enquanto trabalhava como catadora, Carolina se revelou escritora, poeta, compositora e cantora.

Em 1960, escreveu sua obra-prima, “O quarto de despejo”, um sucesso mundial de vendas, que foi traduzido para mais de dez idiomas, e distribuído em mais de 40 países.

Todo esse sucesso inegável lhe rendeu homenagens da Academia Paulista de Letras; da Academia de Letras da Faculdade de Direito de São Paulo; além do título honorífico da “Orden Caballero del Tornillo”, na Argentina, em 1961; e, claro, a admiração e o reconhecimento do povo brasileiro, em especial de meninas e mulheres negras de todo o País.

Carolina presenteou o mundo com sua literatura periférica de testemunho. A partir de um olhar ímpar sobre si mesma e sobre a cidade que a rodeava, a autora não só expôs a realidade em que vivia, mas também elaborou grandes reflexões sobre a indiferença e a profunda desigualdade social que ainda hoje resiste persiste e maltrata o povo brasileiro.

Por sua genialidade e talento, Carolina inspira dissertações e teses acadêmicas que abordam da solidão ao urbanismo, da literatura à história econômica, política e social deste Brasil. Neste ano, celebramos 110 anos de Carolina Maria de Jesus. Portanto, Carolina Maria de Jesus, presente! (Palmas.)

Seguiremos com a exibição de vídeo sobre Carolina Maria de Jesus.

 

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- É exibido o vídeo.

 

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A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - Neste momento, passaremos a palavra à Sra. Julia Roland para uma breve saudação.

 

A SRA. JULIA ROLAND - Bom dia a todas e todos. É uma grande honra estar aqui nesta Mesa com a nossa querida e grande deputada Leci Brandão, que eu acho que é um exemplo que nos honra e nos representa, a todas e todos que estamos aqui nesta sessão solene.

Eu quero dizer à Leci que a gente muito admira a grande sabedoria e sensibilidade com que ela tem realizado essas homenagens, no sentido de dar visibilidade para mulheres que fazem a diferença na nossa sociedade. Então, eu acho que relembrar quem foi Theodosina, quem foi Carolina de Jesus, nos emociona muito.

Eu queria ressaltar isso e ressaltar, também, que Leci também é um grande exemplo para todas nós. Leci, pela sua carreira como artista, como defensora da cultura popular, da música brasileira, sempre estando no lado certo da nossa história.

Desde muito jovem, Leci sempre soube se posicionar muito bem, do lado daqueles e daquelas da nossa sociedade que sofrem mais exploração, mais opressão de gênero, de raça, e todo tipo de discriminação. Então, para mim, como secretária estadual da Mulher do PCdoB, é uma honra imensa estar aqui hoje com Leci Brandão, que eu acho que merece todo o nosso aplauso, merece todas as nossas homenagens.

Eu quero dizer que, apesar de todas as dificuldades, eu acho que nós estamos avançando em conquistas. Eu acho que as mulheres têm cada vez lutado mais e avançado nas conquistas.

Recentemente, nós vimos o Congresso Nacional, mesmo com todas as dificuldades que a gente sabe que tem no Congresso Nacional, aprovar a lei de salário igual para trabalho igual, que eu acho que foi uma grande conquista do governo Lula.

Eu acho que isso é importante, esses avanços na legislação, mas nós precisamos, de fato, que na vida real isso aconteça. E eu acho que isso vai depender ainda de muita luta de todas nós.

Eu quero aqui também parabenizar todas as homenageadas: a nossa sempre ministra Matilde Ribeiro; a nossa grande jornalista Flávia de Oliveira, que muito nos honra; a Dra. Teresa Cabral; a Márcia Tobias; a Elaine Nascimento.

A Ìyálorisa Omilade; a Paula Batista; a Natalícia de Paula, que eu já conhecia e hoje reencontrei aqui; a Vera de Jesus; a Solange Bichara; a nossa Néia Costa, lá de Carapicuíba, grande lutadora; a Elaine Sabino.

Eu acho que consegui ler nome de todas elas e eu acho que todas vocês representam a luta e a garra das mulheres que lutam exatamente para mudar a nossa sociedade e que fazem a diferença.

Eu quero dizer também que este ano - nós estamos 2024 - é um ano de renovação das prefeituras e das câmaras municipais, e nós todas devemos lutar para que essa renovação seja no sentido progressista.

No sentido em que a gente venha a ter mais prefeitos e prefeitas, vereadores e vereadoras que tenham o compromisso de ampliar e aprofundar a construção de políticas públicas que consigam liberar a mulher das tarefas de cuidado da família, que a gente sabe que ainda hoje são as mulheres... é sobre elas que recai a maior parte das tarefas de cuidados, não é, Leci?

Então, eu acho que a gente precisa ter cidades que consigam compreender essa realidade e implementar políticas que liberem a mulher dessas tarefas para que elas possam ocupar todos os espaços que existem na sociedade não só a nível dos parlamentos, mas na academia, no mercado de trabalho.

E para isso é fundamental que a gente avance nessa construção de políticas públicas de lavanderias coletivas, de restaurantes populares, política de cuidados. Porque, felizmente, a nossa população cada vez amplia mais o número de anos que as pessoas vivem.

Então o número de idosos e idosas aumentam na nossa sociedade e isso aumenta mais ainda a responsabilidade das mulheres, porque hoje são elas, meninas e mulheres, que têm essa tarefa de cuidados na família.

Então eu quero chamar atenção para essa questão e eu acho que nós devemos falar bem alto da necessidade de que essas políticas sejam implementadas. Por isso, Leci, mais uma vez, parabéns. Eu acho que você nos representa e eu quero mais uma vez dizer a honra do PCdoB ter você como parlamentar aqui nessa Alesp.

Lembrando que o PCdoB foi o partido que mais implementou a política de valorizar mulheres e negros. Na nossa votação nas últimas eleições, 56% da nossa votação foi em mulheres e 75% em negros e negras. Assim, temos Leci aqui, na Alesp; e, na Câmara Federal, Orlando Silva. Então, eu quero cumprimentar.

E, mais uma vez, obrigada e parabéns a todas hoje que são homenageadas. (Pausa.)

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - Ao longo desta sessão solene, trarei algumas citações de Carolina Maria de Jesus. Vamos começar: “Quando o homem decidir reformar a sua consciência, o mundo tomará outro roteiro”.

E considerando que vamos iniciar agora, deixando de lado as formalidades, ilustre deputada Leci Brandão, esta sessão solene que vai trazer as mulheres incríveis, memoráveis, inspiradoras que têm escrito novos roteiros e que vêm transformando o mundo e a sociedade com suas trajetórias e suas atuações.

Então, neste instante iniciaremos a “femenagem” a essas mulheres incríveis, inspiradoras, magnânimas, que se destacam na sociedade em relação a sua contribuição, a sua luta ao enfrentamento à discriminação racial, de gênero e a inúmeros preconceitos na defesa dos direitos das mulheres e da cidadania no estado de São Paulo.

Vale ressaltar que nossas “femenageadas” terão três minutos para sua saudação e agradecimentos, considerando o horário de término pela Casa para a realização desta sessão.

E agora segurem vossas emoções e podem soltá-las também, porque neste momento efetivamente tem início a entrega da Medalha Theodosina Rosário Ribeiro, edição Carolina Maria de Jesus. (Palmas.)

E agora eu quero ver se vocês vão descobrir quem é a nossa primeira “femenageada” de hoje. Ela é jornalista, é comentarista na Globo News, colunista no jornal “O Globo” e na rádio CBN.

É “podcaster” no Angu de Grilo, integra o conselho deliberativo da Anistia Internacional Brasil e os conselhos consultivos das organizações Uma Gota no Oceano, Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades - CERRT, Observatório de Favelas, Instituto Sou da Paz, Instituto Ibirapitanga, Perifa Connection, Fundação Tide Setubal e Museu do Amanhã. É membro do conselho da cidade do Rio de Janeiro no grupo temático Igualdade e Equidade.

Venha receber a Medalha Theodosina Ribeiro e ela já chegou, Flávia Oliveira de Fraga. (Palmas.)

 

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- É entregue a homenagem.

 

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A SRA. FLÁVIA OLIVEIRA DE FRAGA - Eu escrevi algumas palavras para não me perder no tempo. Bom dia a todos, todas, todes. É uma alegria, uma honra, estar aqui nesta manhã. Eu que sou uma carioca, é minha primeira vez na Alesp e já para uma missão tão gigantesca, um reconhecimento. Algo inesperado, deputada, mas que eu recebo com muita emoção.

Não é trivial, agora, uma mulher, uma avó, uma profissional, mas que partiu de uma menina de Irajá, do subúrbio do Rio de Janeiro, criada por uma mãe solo, aluna de escola pública a vida inteira, produto da educação pública e gratuita pela qual milito e militarei, porque a educação foi o meu passaporte.

A honra e a alegria de receber a Medalha Theodosina Rosário Ribeiro em uma edição que reverencia Carolina Maria de Jesus e pelo mandato da dona Leci Brandão, essa mulher que eu admiro, essa artista que eu reverencio, ouço, frequento os shows, essa parlamentar que eu respeito profundamente pela dignidade e pela persistência na vida política, que não é simples para mulheres, que não é simples para mulheres negras, que não é simples para mulheres idosas.

Então, são muitas camadas de coragem, dona Leci, que a senhora carrega e, ao carregar, nos inspira. Esta cerimônia está repleta de simbolismo. Ela encerra a semana do 13 de Maio. São 136 anos de uma abolição incompleta.

Nós usamos esta data, primeiro, para lembrar que nos é devido ao povo negro o reconhecimento de luta pela liberdade. Não foi concessão, foi disputa, foi conquista, foi luta dura.

Usamos esta data também para lembrar o que ainda é devido à população afro-brasileira em direitos, em políticas públicas, em oportunidades. Vem daí a ideia de um 13 de maio reflexivo, questionador. Nosso povo segue maioria entre os famintos e os pobres, entre os desempregados, entre os que vivem em más condições habitacionais e privados de direitos fundamentais.

Nossa cultura e nossa fé - nossa fé, dona Leci - são alvos da intolerância. Nossos corpos, alvos do racismo, da misoginia, da LGBTfobia. Há muito a avançar, muito a avançar, mas muito se avançou.

Carolina Maria de Jesus, Theodosina Ribeiro e Leci Brandão são provas de que muito se avançou. São três mulheres da cultura, da política, da luta por direitos, da indignação contra desigualdades, do inconformismo. Três mulheres que não se renderam, mulheres que lutaram e lutam, mulheres que brilharam e brilham, mulheres que inspiraram e inspiram.

Esta sexta-feira de oxalá é dia de renovarmos nossos votos com os nossos ofícios, nossa cidadania, nossas causas, nossos sonhos. É dia também de agradecermos por nossas conquistas, que não foram poucas. Tem hora que a gente tem que parar e falar: “Puxa. Valeu. Chegamos”. É isso que eu e essas minhas companheiras hoje aqui reconhecidas, homenageadas, “femenageadas”, representam.

Segundo o texto do prêmio, empoderamento, impacto e influência na vida de pessoas em situação de vulnerabilidade. Cada qual de nós em nossas áreas somos vencedores, estamos no caminho. Nossa ancestralidade nos trouxe até aqui, segue a nos inspirar. Seguiremos.

Muito obrigada.

Muito obrigada, de coração. (Palmas.)

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - E vamos à nossa segunda “femenageada”. Ela é fotógrafa; artista visual; jornalista; produtora cultural; produtora de eventos e comunicação com foco em projetos como poéticas negras; que promove dentro do ambiente escolar exposições, palestras, contação de histórias, oficinas, formações e apresentações artísticas. Sua produção é atravessada pela pesquisa sobre mulheres negras.

Representatividade, autoconhecimento, ancestralidade, regeneração, relação dos seres humanos com o sagrado e a natureza, o resgate de saberes de culturas periféricas e ancestrais, além de narrativas decoloniais. Integra o Fórum de Cultura e a cadeia de gestão do Conselho Municipal de política cultural de Ribeirão Pires. É cofundadora da Pólen Criativa, Cria, Matuta, coletivos e sementes de uma produção cultural com o olhar mais humano.

Recebe, neste momento, nossa “femenageada” a Medalha Theodosina Ribeiro, Paula Chaves de Lira.

 

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- É entregue a homenagem.

 

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A SRA. PAULA CHAVES DE LIRA - Bom dia, gente. É uma honra imensa estar aqui. (Palmas.) Vou tentar ler, desculpa a emoção.

 

A SRA. PRESIDENTE - LECI BRANDÃO - PCdoB - Você tem todo o direito de tudo o que você quiser fazer.

 

A SRA. PAULA CHAVES DE LIRA - Obrigada. Primeiro, quero saudar todas as mulheres que estão aqui, agradecer demais a indicação para receber este prêmio. Estar neste lugar, estar ocupando este lugar, junto de tantas mulheres incríveis, que têm uma atuação notável, e estar no mesmo lugar é uma honra gigante.

Então, primeiro quero agradecer a esta Casa, agradecer à Leci, agradecer a tantas mulheres que vieram antes de mim, que abriram, que pavimentaram os caminhos para que, hoje, eu pudesse estar aqui, para que todas nós pudéssemos estar aqui.

Quero agradecer às minhas ancestrais. Eu sou uma, mas eu não sou só. Então eu só estou aqui porque outras mulheres abriram esse caminho e pavimentaram esse caminho, para que a gente pudesse militar onde mais, para que a gente pudesse estar aqui hoje.

Sinto que este prêmio não é só para mim; este prêmio reconhece, mas ele é muito coletivo. Acho que minha atuação é muito coletiva, na sala de aula, no campo artístico, no território que hoje ocupo, que eu escolhi ocupar, que é Ribeirão Pires.

Este prêmio é para a minha bisavó Mariana, é para a minha avó Cida, é para a minha mãe, que está aqui. Desculpa. (Palmas.) Ele é para a minha irmã, que está aqui também, ele é para mulheres que lutam e lutaram há muitos anos e têm trabalhado, têm feito um trabalho incrível em Ribeirão Pires. Eu não estaria aqui se não fosse por elas.

Então, obrigada por estarem aqui. A Fernanda está aqui, a Dani está aqui, a Monique está aqui, a Letícia está aqui, a Bruna está aqui, então eu queria agradecer imensamente a vocês por estarem aqui. Eu só estou aqui porque todo mundo está junto.

Agradecer ao meu companheiro, que está aqui ao meu lado sempre. Então é isso, gente. Eu queria só agradecer mesmo. É uma honra gigante, e é isso.

Eu sou uma, mas eu não sou só, e que bom que estamos juntas. (Palmas.)

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - Saiba que a honra é toda nossa. Dando continuidade às mulheres constelares que serão “femenageadas” hoje, a nossa próxima “femenageada”, a terceira, ela que falou, viu, gente? Eu não acredito.

Ela tem 66 anos, é mãe, avó, companheira, mulher negra, liderança comunitária com atuação nas áreas de Saúde e Educação, mais conhecida como Nata, participou ativamente do GEN, Grupo Espaço Negro, e do projeto pré-vestibular para negros e jovens carentes em parceria com a Educafro.

Educadora social, participou das APNs, Agentes da Pastoral Negra, núcleo da igreja católica, e mais tarde coordenou o Projeto Primeiro Tempo da Facesp, Federação das Associações Comunitárias do Estado de São Paulo, com atividades esportivas e de recreação para crianças e jovens da periferia.

Liderança ativa, participativa da luta pela construção e pelo bom funcionamento do posto de Saúde do Jardim Promorar, em Sapopemba, na zona leste de São Paulo. Ela é formada em Letras pela Faculdade Metodista. E quem é? É óbvio que a nossa “femenageada” é a Sra. Maria Natalícia de Paula. (Palmas.)

Vai lá, Nata, que é sua.

 

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- É entregue a homenagem.

 

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A SRA. MARIA NATALÍCIA DE PAULA - Gente, muito obrigada. Foi muito engraçado. Quando eu recebi o convite, eu sou paulistana, nascida na Vila Prudente, e aí, minha amiga, Liege Francisca, me mandou uma mensagem: “Vem para São Paulo, Nata. Você vai ser homenageada”. Gente, que emoção. Homenageada, nossa, que chique. “Eu estou indo”.

Peguei o ônibus, vim de Santo Hipólito, Minas Gerais, para cá - meu esposo e eu - e aqui estou, gente, para agradecer às minhas amigas; aos meus amigos; ao meu esposo, José Antônio; minha filha; pessoas que sempre estiveram ali ao meu ladinho, ajudando-me, caminhando juntos.

A deputada Leci Brandão também sempre, em alguns momentos, estava lá com a gente no Espaço Negro. Julia também, sempre estava ali com a gente na Vila Prudente, São Mateus, Jardim Elba. Isso é um pouquinho de mim, gente.

Hoje, infelizmente, estou com problema de saúde, não posso fazer muita coisa, mas eu canto e encanto com a minha voz, porque eu amo cantar. (Palmas.) E Deus abençoe a todos.

Muito obrigada e axé! (Palmas.)

 

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- É feita a apresentação musical.

 

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A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - Gratidão, Nata. E agora, prosseguindo a nossa solenidade, quero chamar aqui mais uma mulher maravilhosa, esplêndida. Ela disse: “Eu também não acredito e quero saber o endereço da fonte da juventude que essas mulheres frequentam”. Ela disse que ela tem 43 anos. Eu não acho.

É mulher preta, mãe, sacerdotisa de candomblé, compositora, poeta e ativista pelos direitos dos povos de terreiro. Yemojazz tem uma carreira extensa de atuação nas manifestações artísticas, culturais e sociais negras. É pedagoga, com foco na coordenação de projetos pedagógicos de valorização das tradições de matrizes africanas, estudante de direito e moradora da zona sul de São Paulo.

E ela é Ìyálorisa Omilade, Janaina Teodoro. (Palmas.)

 

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- É entregue a homenagem.

 

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A SRA. JANAINA TEODORO - Como falar depois de tanta emoção? Primeiro eu quero pedir ao Orixá Exu para que eu seja instrumento de todas as suas palavras. Estou bem emocionada.

Quero agradecer a toda a Casa, na figura da deputada Leci Brandão, uma querida para todos nós. Quando a gente fala da gente, a gente está falando da nossa ancestralidade, e eu quero que vocês entendam os quatro pilares que me trouxeram até aqui.

A minha família biológica, minha mãe, Lourdes; meu pai, Cícero; minhas filhas, Laíne e Aliá; meus irmãos; meus sobrinhos. O hip hop, que eu agradeço na figura de Sr. Oswaldo Faustino, um querido; na figura da minha filha Rúbia, minha filha de santo, Rúbia, do RPW, MC, como eu.

O samba, na figura da querida Tetê; minha escola de samba, Camisa Verde e Branco, na figura do mestre Dadinho - os dois nos deixaram, mas deixaram um legado incrível; na figura da nossa querida deputada Leci Brandão; do Sr. Jair Praxedes, pai do meu filho, Tiago Praxedes.

Ao candomblé, minha estrutura, a quem rega meu Orí, na figura de Babayro Fá, que trouxe a nação Efon para o Brasil, e da minha Ialorixá, Maria Lopes dos Anjos, que fez 70 anos de santo este ano, a quem eu dedico o meu amor, o meu carinho a todas essas pessoas.

Nós somos, porque tem sempre alguém que trilhou um caminho de dor, de luta, de coragem. Então, eu sou a continuidade dos passos de todas essas pessoas e, digo mais, sou combatente do racismo, do racismo estrutural, com a minha existência.

Então, aos povos de candomblé, eu existo e eu agradeço a cada um, a cada uma que antecedeu a minha existência, e por isso estou aqui. E quero dizer que eu sou uma mulher próspera e muito feliz com a minha comunidade, (Inaudível.), na zona sul de São Paulo.

E é por isso que eu também quero cantar, eu quero cantar porque os Efons são filhos da felicidade. Nós dançamos para a felicidade, nós cantamos para a felicidade. Aí tem uma cantiga que a gente fala sobre isso.

 

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- É feita a apresentação musical.

 

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Nós somos filhos da felicidade e dançamos para ela. (Palmas.)

Obrigada.

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - Obrigada. E a nossa próxima “femenageada” também tem 43 anos. É mãe de cinco filhos, mulher de fé e do axé, filha de dona Adailza, baiana forte, empregada doméstica que, assim como milhares de outras mulheres guerreiras, criou seus três filhos com muita luta.

Mestra em sociologia das relações raciais, pedagoga, especialista em educação antirracista, professora de sociologia na educação básica, pesquisadora do Ballet Afro Koteban, professora de dança, dança educadora, cofundadora do Coletivo Antonieta de Barros e coautora do “Protocolo antirracista para Educação no estado de São Paulo”, a nossa “femenageada” é Ana Koteban. (Palmas.)

 

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- É entregue a homenagem.

 

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A SRA. ANA KOTEBAN - Bom dia. Muito obrigada a cada pessoa que está aqui presente para celebrar as nossas vidas e o nosso caminhar.

Eu vou tentar ser breve. Eu não escrevi, porque eu fico mais nervosa quando eu leio, ao contrário da maioria das pessoas. Estando aqui ao lado da ilustríssima deputada, esta mulher que nos honra, Leci Brandão, com sua história, sua biografia, eu vim pensando em ancestralidade.

Ancestralidade é uma coisa da qual eu tenho falado bastante e tenho vivido bastante. Eu entendo que ancestralidade é uma linha que liga o desde sempre até o para sempre. Cada um de nós é um ponto nessa trajetória da ancestralidade.

Então, eu, aqui, só posso olhar para trás, “sankofando”, agradecer a todas as mulheres que vieram antes de mim: dona Leci, nossa mais velha; a ministra Matilde aqui, que também deu tanta contribuição para o nosso povo; minha avó; minha mãe, minha mãe Adailza.

Minha querida amiga Edna, que, mesmo não estando tão bem de saúde, fez o esforço de vir até aqui; minha querida amiga Rosana de Souza, uma mulher que muito me inspira também, uma grande educadora e que é autora do primeiro documento que nós temos na cidade de São Paulo para a educação das relações étnico-raciais.

Eu estou entre essas mulheres e, atrás de mim, tem muitas; à minha frente, tem muitas outras, a minha irmã Adriana, que está aqui também, fazendo todo o esforço de um dia de semana vir aqui, como todos vocês. Eu estou feliz, minha irmã, porque você caminhou tudo que você conseguiu caminhar e chegou até aqui.

Ana Carolina, minha aluna. Eu digo para a Ana que um dos orgulhos que eu tenho como professora é ser professora de uma menina negra como ela. Minhas filhas... eu tenho muitas mulheres antes de mim e depois de mim, tenho as minhas filhas, Jolie, Tanti, Kadi e muitas virão depois.

Como educadora, o que eu faço é cultivar, arar esse solo que vai alimentar esse futuro. É isso que as educadoras fazem. As mulheres, sobretudo as mulheres negras, são as grandes educadoras da nossa sociedade, do nosso País, da nossa história.

Vocês me educam e me educaram. Minha mãe, Adailza, que, com a sua coragem, com a sua força, com a sua luta, me educou desde o berço, me ensinou a ser insubordinada, a questionar, a perguntar e a não desistir.

Com todos os desafios que existem em ser educadora, em ser uma educadora negra em um país como o Brasil, eu não posso, pelas minhas filhas e por todas que virão depois, deixar de continuar arando esse solo. A gente precisa.

É por isso que a proposta de protocolo antirracista, da qual eu sou uma das coautoras, é tão necessária. Falamos de Carolina e, quando vimos a biografia de Carolina, vimos que a mãe dela a tirou da escola porque a escola era um espaço de violência para ela.

Infelizmente, para muitas das nossas crianças, a escola continua sendo um espaço de violência. É o primeiro ambiente onde muito de nós viveu a primeira experiência de violência, a primeira experiência com o racismo, e isso tem que acabar.

Então, se eu estou aqui por conta desta realização, eu sou grata. Isso não é uma homenagem a mim. Eu acho que isso é uma homenagem, uma “femenagem”, à coragem de cada uma dessas mulheres que nutrem a minha coragem. Eu espero poder continuar nutrindo a coragem das minhas filhas, dos meus filhos e de todos que virão depois.

Obrigada, meu companheiro, Lamine Rabah, por ter me dado essa riqueza tão essencial que é essa família tão grande, tão maravilhosa, tão extraordinária em um país como o Brasil, uma família de crianças africanas.

E, também por elas, continuaremos sendo insubordinadas, faremos muito mais barulhos do que fizemos até aqui, e essa sociedade vai ter de lidar com isso, vai ter de melhorar. (Palmas.)

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - Vamos prosseguindo, porque ainda tem muito mais mulheres para receberem essa “femenagem maravisplêndida”.

Então, preparem seus corações e a emoção também, porque a nossa sexta “femenageada” tem 42 anos, não 43, é licenciada em música, é uma professora que cria, elabora, ensina e faz obras musicais, é multi-instrumentista, realiza canto coral, canto erudito, é organista, é a décima de onze irmãos, família com dons natos para a música e para instrumentos. Nessa família, quem não canta, toca e canta ou canta e toca.

Aos seis anos, ela já dedilhava as primeiras notas no violão, formando os primeiros acordes. Habilidades para instrumentos, como violão, teclado, piano, cavaquinho, viola, guitarra, órgão e para o canto. Ela é uma mulher da música, não é, gente? Já deu para perceber.

A música sempre foi direcionada para o âmbito religioso e projetos escolares. Executar “Ave Maria”, de Charles Gounod, somente com o seu dom, foi um momento marcante na sua evolução musical e de grande significado para a posição que hoje a nossa “femenageada” ocupa.

Apesar das dificuldades, atualmente ela está organista e cantora no Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida nas celebrações litúrgicas e sacramentais, na TV Aparecida. Tudo isso divinamente abençoado, e, na chegada, coincidiu com as celebrações dos 300 anos do encontro da imagem no Rio Paraíba do Sul.

A nossa “femenageada” é a Márcia de Souza Tobias. (Palmas.)

 

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- É entregue a homenagem.

 

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A SRA. MÁRCIA DE SOUZA TOBIAS - Bom dia a todos, a todas, prezados e prezadas. Agradeço a oportunidade de estar presente nesta Casa com muita honra, muita alegria, muita satisfação; e, em especial, à Sra. Deputada Leci Brandão pela homenagem. Estou um pouquinho nervosa, me perdoem.

Honradíssima por este momento. É com muita alegria que me uno às demais colegas homenageadas, aqui estou tendo a honra de conhecê-las hoje. Muito obrigada por vocês existirem, e saber que existem pessoas como vocês, pessoas como nós aqui. Muito obrigada, agradeço.

Hoje é dia de celebrarmos o reconhecimento do nosso trabalho, das nossas lutas diárias, cada uma na sua missão, nos seus desafios. Ora colhendo bons frutos, ora frutos ainda não maduros, ora frutos que já estão podres. Mas sigamos, sigamos. Como nos diz o Livro Sagrado em Eclesiastes: há um tempo para cada coisa. E hoje é tempo de agradecer.

E eu começo agradecendo a Deus pela minha vida, pela vida de cada uma de vocês; Deus, o doador de todos os dons. Agradeço aos meus pais, que me trouxeram à luz - o papai já contemplando a glória de Deus, e a minha querida mãezinha, junto aos meus irmãos.

Família numerosa que está lá no estado de Minas Gerais. Mas hoje eu tive a surpresa aqui da presença do meu irmão, o Marcelino. Obrigada irmão, beijo. Obrigada. (Palmas.) Ele me fez uma surpresa. E, apesar da presença constante dos meus irmãos, não puderam estar presentes. Eu louvo a Deus pela vida de cada um deles.

De maneira especial, eu quero agradecer à minha irmã, Josiane, que é a minha assessora, toda a dedicação que ela tem a mim e aos meus projetos profissionais e pessoais. Agradeço ao meu amigo de profissão, irmão de coração, Edmar Tassoni, que está aqui comigo hoje, e sempre ao meu lado, partilhando a vida nos momentos bons e nos momentos difíceis.

Gratidão também à minha afilhada, Carla Maisel, pelo apoio nas horas difíceis da caminhada, conversas e trocas de experiências profissionais e para a vida. Agradeço também à Comunidade Redentorista, padres e irmãos que dirigem aquele grande Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida, na pessoa do padre Eduardo Catalfo, que me abriu as portas daquele grande santuário, pela confiança no meu trabalho, pelo incentivo e pelo apoio.

Quero lembrar toda a equipe de apoio também da TV Aparecida: o Gustavo, figurinista, tem todo o carinho, me atendeu; agradeço ao (Inaudível.) Ramos; agradeço à Dilce e Fernanda; agradeço a cada pessoa que não posso enumerar, apesar de ter citado alguns nomes, mas é muita gente que fez parte da minha caminhada até os dias de hoje.

E quero levar também vocês agora, a partir de então, nesta minha caminhada.  Gratidão, viu, gente? É muito emocionante estar aqui. Não cabem as palavras para agradecer. Muito obrigada, Liege, também, pelo apoio e pelo suporte.

Fui agraciada pela música desde bem pequena, como já nos disse ali a minha biografia, e foi um longo caminho até chegar a este grande santuário, compor o grupo de músicos do maior santuário mariano do mundo e o segundo maior santuário do mundo. É uma grande honra, sim.

A música sempre faz parte da vida do ser humano, em todos os momentos, desde o nascer até a morte. A música cumpre a sua função de acalmar, animar, alegrar, incentivar, acalentar; e, no âmbito religioso, ela também cumpre a sua função de elevar a alma, ajudar as pessoas na conexão com o transcendente.

Em sua origem divina, a música é como qualquer outro trabalho - isso é uma luta, ter a música como profissão nos nossos dias -, é um dom precioso. E feliz daquele que utiliza bem esse dom, para o bem, para unir as pessoas, para vencer as dificuldades.

Louvado seja Deus por esta oportunidade que me foi concedida e poder tocar o coração das pessoas, tantas pessoas que passam por aquele santuário, que estão aí, e creio também que atinge o âmbito social, tanto que estou aqui hoje com vocês.

Muito obrigada, gratidão. (Palmas.)

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - E agora, senhoras e senhores, chegou - ou chegamos -, à nossa sétima “femenageada”. Ela, que é uma mulher da lei, uma mulher da Justiça, tem dedicado, enquanto magistrada do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em sua atuação, às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

Trazendo transformações a esse sistema de Justiça, garantindo e ampliando os olhares, quando realiza os seus julgamentos considerando o quanto o impacto dessas violências em relação às mulheres, sobretudo às mulheres negras, tem causado grande problemática e sofrimento, não só às suas vidas, mas também impactos à sociedade.

A nossa “femenageada” é juíza da 2ª Vara Criminal da Comarca de Santo André; é juíza coordenadora do Anexo de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, da Comarca de Santo André; é integrante da Comesp - Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Poder Judiciário do Estado de São Paulo; é presidenta do Fonavid - Fórum Nacional de Juízas e Juízes de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.

Além disso, ela é mestra em direito pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo; integrante do Coletivo Sankofa de Magistradas; mestra em direito comparado pela Universidade Samford, Birmingham, Alabama-Estados Unidos e também integra a Associação Brasileira de Mulheres de Carreira Jurídica.

E a nossa “femenageada” é a juíza Teresa Cristina Cabral. (Palmas.)

 

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- É entregue a homenagem.

 

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A SRA. TERESA CRISTINA CABRAL - Bom dia a todas as pessoas que nos assistem, as que estão aqui presentes, que puderam vir e as que nos assistem a distância. Eu escrevi aqui algumas palavras, a emoção não me permitiria fazer sem ler aquilo que, enfim, consegui elaborar ontem à noite.

Quero, primeiro, pedir vênia e licença para cumprimentar todas as autoridades, as pessoas presentes, na pessoa da deputada Leci Brandão. Coloco-me ao lado das pessoas que entendem ser imprescindível a presença de mulheres negras em espaços de poder e a importância dessa presença ser enaltecida a todo tempo.

Quero agradecer por esta honraria que me é prestada e parabenizar todas as demais agraciadas. Coloco-me ao lado de pessoas incríveis e que têm feito, com a sua história, diferença na vida de muitas e muitas pessoas; pessoas que, certamente, desenvolveram ações relevantes, significativas e necessárias para transformações e em busca de direitos humanos para mulheres.

Este prêmio em muito me honra, deputada. Honra porque foi criado em “femenagem” à Theodosina Ribeiro, mulher negra, professora - como minha mãe -, estudou direito, vereadora e deputada estadual, defensora dos direitos humanos das mulheres.

Honra porque este ano a edição é em “femenagem” à Carolina de Jesus, mulher negra, escritora, intelectual brasileira que retratou, através da literatura, a vida de inúmeras mulheres negras no País, dando voz a tantas mulheres silenciadas, defensora dos direitos humanos das mulheres.

Honra porque a medalha passou a ter caráter permanente, a fazer parte do calendário da Alesp, a partir de um projeto da deputada Leci Brandão, mulher negra do axé que, em sua trajetória, vem proporcionando ações direcionadas ao enfrentamento de discriminações como a intolerância religiosa, também defensora de direitos humanos das mulheres.

Honra porque a notícia da escolha do meu nome para receber tão distinta honraria me foi dada por uma amiga muito querida, parceira de luta, Dra. Claudia Luna, advogada brilhante, que tem a trajetória marcada por ações importantes para o acesso à justiça de mulheres em situação de violência, também defensora dos direitos humanos das mulheres.

Honra porque trago comigo mãe, pai, irmã, irmão, filha, filho, amigas, parceiras, companheiras de luta, minhas parentas, algumas fisicamente presentes aqui, outras presentes de alma e coração, também defensoras dos direitos humanos das mulheres. As ações que me trouxeram aqui são decorrência de uma ação coletiva: sou porque somos.

Honra porque as ações que me trouxeram aqui são decorrência de um cumprimento de uma obrigação, não somente porque é mulher branca e tem a obrigação de lutar contra o racismo, mas também como decorrência da minha ancestralidade. Tenho pele branca, cabelo liso, mas sou neta de avó negra e bisneta de bisavó indígena.

Por conta do apagamento da história negra neste País, muito dessa história se perdeu, como tantas outras. Só consegui compreender que essa história existe após iniciar meu letramento racial. Nunca sofri o preconceito que minha avó e minha bisavó sofreram, mas trago algumas marcas que direcionaram minha trajetória.

O “pretoguês” falado por minha avó. Ainda hoje me lembro da minha avó colocando a gente para dormir, deputada. Ela colocava a mão no rosto assim e dizia “’drume’, minha filha, ‘drume’”. A “benzeção” da minha avó. Ela sempre tinha um galho de arruda, que ela sempre usava e benzia toda vez que a gente chegava na casa dela.

Eram palavras inaudíveis, que eu não consigo repetir, infelizmente, mas que ela repetia insistentemente enquanto passava a rama na gente, de cima para baixo, repetidas vezes. A paixão que ela tinha por Clara Nunes, minha avó gostava muito de Clara Nunes, sofreu muito quando ela faleceu. Antes do início do meu letramento, nunca consegui entender o motivo dela gostar tão intensamente dessa cantora.

A ideia e a importância do coletivo, da coletividade e da parentalidade. A importância de reconhecer e valorizar diferentes saberes. Minha avó era analfabeta, mal sabia escrever o nome, mas trazia um conhecimento tão impressionante, uma ação de cidadania que poucas pessoas têm. Conhecimento passado oralmente, saberes aprendidos pela vivência de realidades tão pouco valorizadas.

Muito obrigada por permitirem que eu viva este momento tão especial. Espero poder honrar este prêmio tanto quanto me honram ao me agraciarem com ele.

Muito obrigada. (Palmas.)

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - E ainda tem mais, viu, gente? Porque a nossa oitava “femenageada” é assistente social, professora universitária, pesquisadora, gestora e a primeira ministra-chefe da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial-Seppir. (Palmas.)

O currículo é extenso, mas eu penso que todo mundo já conhece a nossa magnífica “femenageada”, a sempre ministra Matilde Ribeiro. (Palmas.)

 

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- É entregue a homenagem.

 

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A SRA. MATILDE RIBEIRO - Bom dia. Bom dia a todo mundo. Ser a oitava é interessante, porque eu já chorei lá com as outras sete e agora é minha vez. Leci e toda a equipe, obrigada pela lembrança, pelo carinho. Eu não escrevi também, porque me sinto melhor falando. Aliás, eu gostaria de cantar, viu? Mas eu não sei, então eu falo.

É muito gratificante na vida fazer parte dessa grande família, que é o povo lutador no Brasil. E como toda família, esse povo lutador, como toda família, a gente bamba, a gente bebe, samba, briga, faz as pazes e assim vai. Uma vez a Leci, conversando comigo...

Quando eu era ministra e ela era integrante do Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial, a Leci falou assim para mim: “Matilde, por que nós, pretos, brigamos tanto?”. Eu não sei direito por que, mas eu acho que a gente briga, inclusive, para poder se encontrar e estar juntos.

Então, fazer parte dessa grande família, com todas essas questões do humano, é o que me traz aqui. Eu não venho de família militante. Meus pais e os que me antecederam eram trabalhadores, arduamente trabalhadores, porém, não militantes.

A família política eu encontrei na vida, no movimento negro, no movimento feminista. Fiquei feliz de encontrar aqui a amiga Liege, a quem eu faço referência em nome das amigas feministas, as irmãs feministas que eu encontrei pela vida. Essas famílias que eu fui encontrando me deram gás para ir construindo outras tantas famílias e reforçando a família que eu já tinha.

Eu venho de uma família de mulheres. Peço à Malu, minha irmã, lá no fundo, que está aqui neste momento comigo... mas são tantas outras irmãs, são cinco; uma madrasta, a madrasta Cida, porque minha mãe foi muito cedo e a Cida foi a “boadrasta”; meu pai Manuel, com quem nós, mais velhas, tivemos muitos embates, porque ele dizia...

Um dia, ele me disse: “Minha filha, mas por que tanto esforço? Você sai seis horas da manhã de casa e chega meia-noite todo dia. Tanto esforço para que, se você vai casar, ter filhos e cuidar de casa?” Eu hoje entendo que ele fazia isso para me proteger e sou muito grata. Mas eu briguei, dizendo: “Não, eu quero ser uma mulher independente”. Mal sabia. Custa caro, muito caro.

Então, essa minha família de origem hoje tem a continuidade em três sobrinhos sanguíneos - a Júlia, o Felipe e o Guilherme -, em três sobrinhos achados, encontrados - a Sabrina, a Jéssica e a Priscila - e em três afilhados: o Luan, no Rio de Janeiro; a Sara, em Fortaleza - a Sara escolheu ser minha afilhada agora, com mais de 30 anos, ela escolheu; e o Lucas, filho do Paulo Rafael, militante do movimento negro, que me chama de madrinha.

E esses dias eu também fui convidada para ser madrinha do grupo de professores e gestores negros da PUC. E aí eu brinquei: “Bom, vocês estão dizendo para mim que o meu tempo passou, mas espero estarmos juntos por muito tempo”.

Bom, então, essas famílias vão se fixando. Da militância, nós carregamos não apenas as inúmeras reuniões, inúmeras noites mal dormidas, inúmeros encontros, inúmeras danças, inúmeras bebedeiras, mas também carregamos amigos.

Vejo aqui Claudinho, o Acácio, a Sandra. Enfim, são muitos e muitas. Desculpe os demais que estão aqui, as demais que eu não citei o nome, mas, por esses três, eu abraço todos e todas.

Leci, nós duas vivemos momentos das nossas vidas muito importantes. Você viu nascer em mim uma gestora pública e eu vi nascer em você uma política, uma mulher política.

A Leci teve coragem de sair do lugar que nem sempre confortável foi, o de ser artista, porque ninguém negro vive tranquilamente esses papéis nossos de lutadores pelos lugares que passamos. Mas a Leci saiu do lugar que ela já tinha driblado muito na vida artística para ser política. Um estágio, eu acho, foi o Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial, onde eu fiquei por seis anos sendo ministra.

Ninguém sabia exatamente o que ia acontecer. A gente ia fazendo, aprendendo, fazendo. Hoje, eu vejo que nós fizemos bastante, mas ainda tem muito para fazer. Mas a sua presença, Leci, junto de... Nós formamos um quarteto bom.

Além da equipe que trabalhava comigo, tinham três pessoas que nós convidamos para estarem conosco o tempo todo na condição de integrantes do Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial, naquela época já como uma “femenagem” a você e uma homenagem ao Kabengele Munanga e ao Oliveira Silveira.

Vocês três, como conselheiros, me deram muita coragem para ser ministra. Nós circulamos por este Brasil, por quilombos, por favelas, por shows, por carnavais, por sessões solenes, por escritas de documento, por tratos de uma questão que foi jogada às traças durante a história do Brasil.

Não fomos as primeiras e os primeiros, nem fomos os últimos e as últimas, mas foi muito importante. Eu falo isso com tranquilidade, não é para me agigantar, não. Eu digo que foi muito importante nós termos tido coragem coletiva de cutucar o Estado brasileiro.

Nesta coragem coletiva, eu me lembro de uma fala muito importante de uma quilombola em uma sessão. Era uma audiência pública - eu já estou terminando, ok? - e essa quilombola - isso no Maranhão, na cidade de Itapecuru-Mirim -, nessa audiência pública, saiu do plenário, dirigiu-se a mim e começou dizendo assim: “A senhora é ministra, não é?”. Aí: “Claro, sou”.

Ela disse: “A senhora vai me desculpar, porque me falaram para vir aqui contar a vida do quilombo, mas a senhora vai me desculpar, porque eu não sei falar. Eu não sei falar, porque eu não sei ler e escrever. Mas, antes de falar do quilombo, eu quero falar para a senhora o seguinte: a senhora é assim com o Lula, não é?”.

Enfim, ela achava, achou. “A senhora é assim com o Lula, então o que eu vou falar aqui a senhora vai falar para o Lula. Mas, antes, eu quero dizer para a senhora que eu não sei o que é ser ministra”. Eu também acho que não sabia. Eu fui aprendendo.

“Eu não sei o que é ser ministra, mas a senhora se parece com a minha mãe. A senhora parece a minha tia, a minha avó, a minha filha. A senhora é minha parenta”. Enfim, é muito bom poder ser parenta do povo brasileiro. É muito bom poder pegar na mão de quem faz e seguir. Então, Leci e povo todo que trabalhou para que esse momento acontecesse: muito obrigada.

Neste momento, eu estou bastante escritora. Em homenagem à Carolina, eu finalizo. Eu lembro de uma frase que ela dizia quando alguém a insultava ou a destratava. Ela ameaçava.

O livro não era só um espaço de registro de conhecimento, de escrevivência, de sabedoria; era também uma arma. Ela dizia: “Vou te pôr no meu livro, viu?”, ela dizia. E, Leci, eu vou te pôr no meu livro, porque a gente merece.

Obrigada. (Palmas.)

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - Depois da nossa sempre ministra Matilde Ribeiro, a nossa nona “femenageada” do dia de hoje tem 55 anos, é moradora do bairro do Cangaíba, tem trabalhado incansavelmente enquanto presidenta da AMNS, Associação de Mulheres Neide Sabino, da Favela do Arizona.

Ela é voluntária da Cufa, Central Única das Favelas - Mães da Favela. Ela também tem atuado enquanto conselheira tutelar. Ou melhor, já atuou por dois mandatos.

Há 30 anos, vem se dedicando junto ao Caps AD II Cangaíba, o Caps juvenil, desenvolvendo um trabalho social voluntário às famílias de baixa renda e situação de vulnerabilidade. A nossa “maravisplêndida femenageada”, Elaine Sabino Nascimento, Nega do Cangaíba. (Palmas.) “Maravisplêndida”.

 

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- É entregue a homenagem.

 

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A SRA. ELAINE SABINO NASCIMENTO - Bom dia. Em fala, é a primeira vez que eu venho passar com essas mulheres ilustres. Eu estou meio nervosa. Eu quero começar com uma fala para a dona Leci. Eu vou pegar na mão dela aqui novamente. Valeu.

Sabe por que eu falo valeu, gente? Porque, há mais de 30 anos, a dona Leci Brandão entrou na minha casa, com a falta de uma irmã que morreu de leucemia. Não era a fala que eu ia fazer hoje, mas eu pedi para Deus uma orientação. No meio de muitas mulheres ilustres aqui, eu estou honrada.

Eu só vim falar para a Dona Leci, mulher negra, da periferia, a senhora tem uma história de vida comigo, de servente escolar. Minha mãe é dona de lar. Escrava, minha avó foi. Minha mãe não sabe ler, mas eu aprendi as palavras com elas, para poder ter um pouquinho de orientação. Não sou uma mulher formada ainda... Em vistas de ser juíza. Essas mulheres maravilhosas estão aqui, mulheres negras.

Eu venho passar a periferia para vocês. Estou aqui representando a Sandra, que é minha prima, que está ali. Ela faz parte do Rosário. Tem o Mario Cortês, que é um dos fundadores também do Cangaíba.

Estou aqui com a Elaine, que faz parte do fórum; a Cleusa; o Serginho, o presidente da associação que faz, aos nossos moradores, a diferença; a Elisabeth, que é do Pelotas. Eu só tenho que agradecer, gente, por esse momento, por ter tantas mulheres ilustres aqui e eu fazer parte disso daqui, das mulheres de periferia.

Dona Leci, a senhora foi ao meu bairro através de um grande amigo, que é o Evandro - o meu Evandro está ali -, que faz a diferença. As mulheres que hoje em dia estão passando por uma fase muito ruim na periferia...

Como a senhora faz a diferença para a gente, chegando em bairros pobres. Fazendo a diferença, Dona Leci; muito grande, a senhora faz, abrindo portas, deixando as mulheres negras de periferia entrarem em espaços, fazerem faculdade, as donas de lares... Eu estou só lisonjeada de você dar esse espaço para mim, menina de periferia.

À minha mãe, eu tenho que agradecer pela luta... A senhora foi no meu bairro; a senhora ficou segurando a minha mão. Foi uma honra muito grande de a senhora me passar esse poder todo, de mulher negra. Só tenho pelo que agradecer.

Gente, eu estou meio emotiva. Eu estou tendo que passar a voz para vocês, que são mais letradas do que eu, mas eu só tenho pelo que agradecer. Evandro, muito obrigada por esse momento que eu não vou esquecer. E ao povo meu, de periferia, que está aqui também, que deu um jeito para vir; e aos outros que estão assistindo. Eu só tenho que agradecer à ministra pelas palavras, pela juíza, pelas meninas que vão passar aqui na mesa.

E muito obrigada. É isso.

Obrigada. (Palmas.)

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - E agora preparem seus corações, porque faltam agora poucas, já está terminando. Vocês estão gostando, gente? São incríveis as mulheres aqui; é potência pura, não é? Pois agora vocês vão conhecer mais uma potência.

Vocês vão conhecer a mulher que simplesmente manda, que domina a cena no Carnaval de São Paulo. Vocês vão conhecer definitivamente essa mulher que, além de mãe, avó, líder, devota de Nossa Senhora, tem feito uma verdadeira revolução na festa de Momo aqui nesta cidade. Ela é definitivamente e simplesmente a presidenta, leoa, do Grêmio Recreativo Cultural Escola de Samba Mocidade Alegre. (Palmas.)

Ela é Solange Cruz Bichara Rezende. (Palmas.) Vem, Solange, receber a Medalha Theodosina Ribeiro. Já está aqui, gente, olha só.

 

A SRA. SOLANGE CRUZ BICHARA REZENDE - Já estou aqui. Muito obrigada. Bom, gente, bom dia.

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - Bom dia.

 

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- É entregue a homenagem.

 

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A SRA. SOLANGE CRUZ BICHARA REZENDE - Ah, que alegria, que energia, que vibração estar aqui no meio de tanta gente maravilhosa. Não sei nem se eu mereço, mas eu agradeço. É muito lindo tudo isso. Somente gratidão. Obrigada, Leci, por todo este carinho que você tem com todas as agremiações do Carnaval de São Paulo.

Você, hoje, defende uma bandeira da Acadêmicos do Tatuapé, pelo carinho que eles têm com você. Carinho com o Osmar, da Sociedade Rosas de Ouro. Um carinho com a minha família, imenso, de tantas rabadas no nosso barracão, não é?

Pois é, a gente fazia rabada para a Leci quando ela ia nos visitar pela Rede Globo de televisão. Era uma coisa que ela gostava muito... Gosta, não é? E a gente sempre fez. Meu carinho à dona Leci, mãe, aquela criatura incrível, maravilhosa, que sempre nos abençoou lá, nos dando muito axé, muita energia, muita força.

Eu sou uma pessoa que sempre lutei bastante em prol do samba, sempre gostei de estar no meio. Meu pai e meus tios são oriundos do Rio de Janeiro. Lá, eles sempre vivenciaram muito bem - e muito - o Carnaval, e trouxeram essa energia para cá quando fundaram o Bloco das Mariposas Recuperadas, onde os homens se vestiam de mulher e saíam para brincar no Carnaval.

Eu já vivenciei tudo isso desde a barriga da minha mãe, e hoje eu estou à frente da Mocidade Alegre há 20 anos. Completei 20 anos de gestão, 17 anos no pódio, oito campeonatos e três vezes vice. Olha, eu sou muito grata e orgulhosa da trajetória que a gente construiu.

Quando eu falo a gente, porque assim, eu sou só porta-voz de uma comunidade. Eu não sou presidente, eu estou presidente. (Palmas.) Agradeço demais pela minha comunidade, pela escola Mocidade Alegre, que voltou a sentir orgulho de vestir a camisa, de bater no peito “eu sou morada do samba”, de trazer tantos momentos bons.

Eu recebi, há pouco tempo, o Prêmio Luísa Mahin. E a Mocidade Alegre - eu até me arrepio em dizer -, em 79, falou sobre esse tema: a Revolta dos Malês. A gente vivenciou tanta coisa... Eu fui na Faculdade Zumbi também receber outra... E já encontrei tantas outras aqui... Estamos novamente juntas aqui, vivenciando tudo isso.

Para mim, é uma honra, porque a Leci, a gente a via como fã, como idolatria. Eu queria estar lá, eu queria ir aos shows. Eu queria um tênis novo, uma roupa bonita para ir assistir ao show da Leci, para vivenciar tudo o que a gente vivenciou. E nem sempre meu pai podia dar.

Eu dormi já embaixo de balcão. Minha família morava em Barueri. Eu nasci em Barueri, em casa, por parteira. E meu pai tinha comércio no bairro do Limão e muitas vezes a gente dormia por lá. Eu aprontava muito na escola, porque eu adorava ir para a 24 de Maio, dar uma paquerada nos pretinhos - eu amava. E aí meu pai me colocou no Colégio das Freiras.

O castigo, no Colégio das Freiras, era ir para a capela. Acho que é por isso que eu gosto tanto de rezar, que eu gosto tanto de agradecer, tanto de orar. Recebi uma imagem agora lá do santuário, onde o nosso pavilhão está exposto. A gente tinha levado em gratidão no Carnaval do ano passado, porque a Mocidade foi campeã. E este ano a gente se consagrou bicampeã.

É difícil por ser mulher; nem sempre eles querem deixar, mas eu não ligo. Eu trabalho em prol disso e vou continuar trabalhando, porque eu gosto muito do que eu faço. E eu aprendi, desde criança, a amar essa Cultura, a vivenciá-la e a defendê-la. Então eu vou até o fim em prol da minha, da sua, da nossa Mocidade Alegre, do samba e do Carnaval de São Paulo.

Eles não vão me calar. Eu vou continuar falando, porque eu sou mulher, eu sou guerreira e eu quero o melhor para o samba, para a cultura e para o Carnaval - não só de São Paulo, para o Carnaval afora.

Porque eu acho que é isso que a gente merece, esse resgate, o não apagamento da nossa história e de muita coisa que ficou para trás, que as pessoas não querem que a gente fale, que a gente traga à tona, que a gente vivencie, que a gente relembre.

Em muitas falas, a gente perde na votação, mas não na convicção e não naquilo que a gente quer. Então, por isso que a gente não deve desistir. Eu vou lutar sempre, até onde Deus permitir, mas eu tenho a certeza que eu já consegui construir muitas coisas junto dos meus pares e de toda a nossa comunidade para o Carnaval de São Paulo, e pela minha trajetória na Mocidade Alegre.

Hoje meu filho está lá fazendo todo um diferencial, tocando com muita gente. Foi para Portugal, tocou com a banda Gipsy Kings, que eu sou fã lá de trás. E eu estou vivenciando muitas coisas lindas através do meu marido, que eu conheci no Camisa Verde e Branco.

Santo de casa não faz milagre, então a gente casa com o vizinho. Sou casada há 32 anos com o mestre Sombra. Tenho o Sombrinha, que também casou com a Marcela, diretora de bateria da Sociedade Rosas de Ouro. Santo de casa não faz milagre, lá na morada não fez.

Enfim, e meu neto agora, que já está com um ano e três meses, já nasceu campeão e já foi bicampeão do Carnaval de São Paulo. E eu falo para ela, ele vai ser Mocidade. Ela, Rosas. Eu, não, Mocidade. E é assim, a gente carrega e leva tudo isso nessa nossa bagagem, naquilo que a gente aprende.

E é uma honra estar entre tantas mulheres maravilhosas, que fazem a diferença. Não vamos desanimar, não vamos esmorecer, não vão nos calar e nós não vamos parar. Eu estou com vocês até o fim e juntos nesse propósito, por que, Carolina?

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - Carolina Maria de Jesus.

 

A SRA. SOLANGE CRUZ BICHARA REZENDE - Qual é o tema final? Marielle...

 

 A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - Marielle presente! Carolina Maria de Jesus presente! É isso aí.

 

A SRA. SOLANGE CRUZ BICHARA REZENDE - É sobre isso. Eu quero agradecer, meu muito obrigada a cada um de vocês. Eu pedi para adiantar minha fala, porque infelizmente eu tenho que ir a dois velórios, um de uma baiana símbolo, muito querida na minha Mocidade Alegre, que é a dona Maria, mãe da Roseli, vó da Fabiana, que a família inteira é da minha escola. Ela me pegou no colo e eu preciso ir lá.

E outra é do Fernando, mestre-sala da Vai-Vai, que também tem uma trajetória na Mocidade Alegre e que a família toda é de lá. Então, eu preciso realmente passar e agradecer e dar um abraço na família, porque eles merecem. E eu quero pedir minha licença aqui, Leci, porque é muito importante a minha presença também lá.

Mas eu não podia deixar de estar aqui com vocês. E lá na Morada do Samba eu falo o seguinte - não vamos esquecer, está bem? - que a vitória vem da luta; a luta vem da força; e a força, da união.

Estamos juntas, mulherada. Vamos lá! (Palmas.)

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - Isso! (Palmas.) O maior espetáculo do pobre da atualidade é comer.

E, dando continuidade à nossa “maravisplendidade” aqui de mulheres “femenageadas” de hoje, eu gostaria que vocês conhecessem essa mulher, que é mãe de cinco filhos, tem 70 anos, é companheira e avó de nove netos, é formada em Letras, é pedagoga, psicopedagoga, professora de língua portuguesa e de educação infantil.

Ela, que é responsável na propagação e organização do editorial da Companhia das Letras, que mantém o intenso e dedicado trabalho de preservação do legado e é o legado vivo da memória de sua mãe, Carolina Maria de Jesus.

Vera Eunice de Jesus, receba a Medalha Theodosina Ribeiro, na edição Carolina Maria de Jesus. (Palmas.)

 

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- É entregue a homenagem.

 

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A SRA. VERA EUNICE DE JESUS - Bom dia, boa tarde. É um prazer estar aqui hoje. Já encontrei o Leci Brandão no centenário da Carolina e encontro agora nos 110 anos. Então, é um prazer muito grande.

Queria falar um pouco da Elaine ali, porque ela estava ali: “Vera, Vera, olha o currículo dessa mulher, eu não vou lá. Meu Deus, eu estou preocupada”. Então, eu estava rindo com ela. “Vai lá e fala. Nossa, aquela mulher fala muito bem, meu Deus, meu Deus”. Então, eu estava rindo com ela ali.

Falar de Carolina Maria de Jesus, nem vou falar, porque a vida dela foi tão exposta aqui, as pessoas estão... Sabem muito sobre Carolina. O que eu quero falar é sobre os eventos que eu tenho ido, nas palestras, porque essas palestras são mulheres... A maioria são mulheres que me chamam.

Então uma transexual ela me chamou e falou: “Vera, você quer ir em um desfile de modas?”. Falei: “Ah, gostaria de ir, sim”. Ela falou: “Então, é na C&A”. Então cheguei no desfile de modas muito chique, coquetel e ela chegou, não a conhecia...

Ela chegou e falou pra mim: “Eu quero falar minha história pra você”. E aí quando ela fala a história, ela diz que ela nasceu, ela era uma criança, menina na periferia de Salvador.

E aí, naquele momento, ela já se via uma menina diferente. Então, ela falou para mim: “Você pode imaginar tudo o que uma transexual passa em uma periferia de Salvador? E ali eu me tornei uma adolescente. Então, tudo o que você possa imaginar, eu passei ali”.

Chegou um ponto em que ela falou para mim assim: “Olha, eu não saía mais de casa. E eu me trancava em um quarto e só saía para pegar retalhos e ia na biblioteca toda semana pegar livros para ler. E aí um dia eu cheguei na biblioteca e peguei ‘Quarto de despejo’. Quando eu peguei ‘Quarto de despejo’, eu li aquela história e eu falei: ‘vou lutar, vou conquistar o meu sonho, serei uma grande estilista. Vou como Carolina Maria de Jesus alcançou o sonho dela’”.

E ela o fez, me chamou e falei: “Posso falar a sua história?”. Ela falou: “Pode”. Então ela confeccionou essa roupa e aqui assim tem Carolina. Então ela fez uma pesquisa, ela fez colares, brincos e hoje é a Isaac Silva que tem um ateliê no centro de São Paulo.

E aí também fui chamada para ir em um presídio feminino do Espírito Santo. E a menina falou: “A gente trabalhou a sua mãe, leu o livro da sua mãe, você gostaria de vir?”. Claro, sempre eu procuro ir. E elas, 40 meninas detentas, escreveram um livro.

E eu fiz a quarta capa. E, indo lá, foi muito deprimente, porque eu me senti muito comovida com as histórias delas. Mas se espelharam em Carolina Maria de Jesus. E elas falaram: “Não, não vamos... Nós vamos seguir o caminho da sua mãe”.

Então, isso me dá muita força, muito ânimo de continuar a propagar a memória da minha mãe. Então, também fui chamada em um lugar que também me comoveu muito, que eram mulheres.

Aí falou: “Vera, dá para você vir fazer uma palestra só para mulheres?”. Só que não me falaram o que era. Cheguei lá, fizeram uma roda, um círculo, e eu fiquei no meio. E eu fui falando quem era a Carolina, quem era a Carolina, e elas prestaram muita atenção.

E aí, quando acabou, elas falaram: “Onde a gente compra o livro?”. Eu falei: “No shopping tem, nas livrarias”. E aí, quando acabou a palestra, eu falei, sempre tiram fotos, “vamos tirar fotos?” “não, não, não, não, não, não”. Eu estranhei. Aí a menina falou assim: “Vera, elas estão todas em medida protetiva”.

E uma chegou em mim, ela era bem baixinha, ela falou: “Eu quero falar com você. Olha, eu aos 13 anos me casei no nordeste. Vim para cá, para São Paulo, tive quatro filhos - três meninas e um menino deficiente - e nunca tive outro homem, sempre foi meu marido.

Um dia ele chegou em casa, abriu a panela de pressão e jogou em mim o conteúdo. E eu fugi, estou aqui fugida. E as minhas filhas é que sabem onde eu estou”. Uma filha, só, sabia onde ela estava. Eu falei: “E seu filho deficiente?”. “Elas estão cuidando”. Eu disse assim para ela...

Ela falou: “Mas eu vou resolver esse problema”. Eu falei: “De que jeito você vai resolver?”. “Eu estou orando para Deus todos os dias para ele morrer, porque aí eu vou ficar livre”. Eu falei para ela: “Não, não é assim que você vai se livrar. Você vai se livrar empoderando, estudando, ficando muito melhor que ele para você conseguir”.

Então, são essas histórias que me deixam bem emocionada. Aí vocês falam: “Mas são só mulheres assim?”. Não. Fui a uma palestra em uma escola riquíssima em Santo André, inclusive acho que os netos do Lula, parece, estudam lá. E eu cheguei na escola e falei: “Nossa, que maravilha”. Eu trabalho em periferia, e a escola tinha jardim, banco, shoppings, restaurantes. A sala de aula era uma coisa de cinema. O teatro, meu Deus.

Entrei, fiz a palestra para os meninos, que eles iam prestar vestibular. E, quando eu entrei, eles prestaram muita atenção. Uma menina falou assim: “Posso fazer uma pergunta para você?” Eu falei: “Claro, pode fazer”. “Então, o que você achou da escola?” Falei: “Maravilhosa a sua escola”. Ela falou: “A cara da riqueza, não é?”. Eu falei: “Não, muito linda a sua escola”.

Eu falava: “Então, você sabe há quanto tempo eu não vejo a minha mãe? Tem mais de mês que eu não vejo a minha mãe. Sabe por quê? Ela paga a comida aqui para mim, eu almoço aqui e levo marmita para casa.

“E, quando eu chego em casa, não tem ninguém para almoçar comigo, para jantar comigo. Você, não. Você passava fome e tudo, mas você tinha uma mãe que cantava para você, que lia para você, que contava os casos para você”. E ela chorava muito.

Então, aquilo foi muito deprimente. Então, eu gosto de passar essas histórias para ver como a Carolina vai afetando todas as mulheres, principalmente mulheres. Então, são infinitos lugares. Já fiz uma palestra também para as mulheres indígenas. Então, é Carolina, como Carolina espelha.

E agora, nesta semana, uma menina falou: “Olha, eu estou abrindo uma confecção e eu, se você me permitir”, ela falou, “eu vou fazer uma roupa só de Carolina”. São mulheres periféricas, mulheres sofridas. Mulheres, não é?

Então, eu fico muito agradecida por ter a oportunidade de estar falando aqui hoje para vocês, e agradecer à Leci, que já faz parte da minha vida, sempre a encontro por aí. Então, muito agradecida. Agradecer a todos vocês que estão aqui, hoje. E eu resolvi fazer esses comentários, porque eu tenho certeza de que tem várias mulheres aqui que devem também ter essas histórias para contar.

Muito obrigada. (Palmas.)

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - Antes de passar a nossa última “femenageada”, eu quero anunciar as seguintes ilustres presenças: Sr. Cláudio Silva, ouvidor da Polícia do Estado de São Paulo; Sra. Bianca Borges, presidenta da União Estadual dos Estudantes.

Senhora Thiele Magalhães, representando a Associação Brasileira de Mulheres de Carreira Jurídica de São Paulo; Sra. Najara Costa, presidente do PCdoB de Taboão da Serra; Sr. Filipe Leonardo Carriço, presidente do Sindalesp; Sr. Rodrigo Mar, representando o deputado Reis.

E agora vamos terminar, encerrar com chave de diamante a nossa “femenagem” deste dia, trazendo a nossa ilustre 12ª “femenageada”. Ela... Eu quero saber o que esse povo faz. Quarenta e oito anos, mãe, avó, companheira, marreteira de feira, cabeleireira, cozinheira, militante e ex-vereadora.

Ela começou a sua militância na comunidade onde mora, por meio de trabalhos sociais. Ingressou na sua carreira política no Partido dos Trabalhadores, onde atuou como vice-presidenta e foi coordenadora do Núcleo de Militância Ativa.

Exerceu o mandato de vereadora em 2016 e também participou e disputou outros pleitos eleitorais para deputada federal e para a prefeitura do município. É uma mulher que sempre esteve à frente das lutas de base por melhores condições de vida, por uma sociedade mais justa e igual e atualmente está presidenta do Partido Comunista do Brasil, PCdoB, no município de Carapicuíba.

E quem é a nossa última, 12ª e “maravisplêndida femenageada”? É a Néia Costa. Arrebenta aí, Néia!

 

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- É entregue a homenagem.

 

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A SRA. NÉIA COSTA - Gente, bom dia. Eu confesso que eu estou nervosa. Nossa, é muita emoção. Fui aqui... Mulheres maravilhosas que me antecederam, e eu chorei com cada uma de vocês. Foi muito forte. E quero começar aqui, primeiramente, agradecendo a Deus pela sua oportunidade desse milagre de nós estarmos todas unidas aqui, cada uma com a sua luta, com a sua trajetória.

E, gente, confesso que eu só vi a nossa deputada na televisão quando era pequena. Então, eu estou tão emocionada de estar aqui ao lado dela. Para mim, é uma grande honra, porque eu lembro, eu pequenininha assistindo à TV, e ela, cantora, e aquele sucesso todo. Então para mim é muito emocionante estar aqui.

Quero agradecer à nossa deputada maravilhosa, que deixou de só cantar para estar deputada e defender os nossos direitos. Quero agradecer aqui à Julia Roland, minha querida amiga do nosso partido maravilhoso; à Rozina, que são mulheres que me acolheram dentro desse partido onde nós estamos fazendo um trabalho maravilhoso pela nossa cidade; a minha família, ao meu esposo, que está aqui, ao meu filho, a minha filha - minha filha Raíssa, que está ali nervosa.

Ela falou: “Mãe, eu não vou falar, não”. Eu falei: “Não, não vai ainda, não”. Mas eu espero que, através da vida de cada uma das mulheres que estiveram aqui, que me antecederam, desperte nessa nova geração muito mais luta, muito mais trabalho. Nós aqui só estamos recebendo aquilo que mulheres antes de nós chegaram até a morrer para que nós hoje recebêssemos esta homenagem.

Então, é muito forte, é uma situação muito diferenciada - eu acredito - na vida de todas aqui, porque nós estamos representando de fato as lutas das mulheres que nem aqui estão e estamos deixando legado para muito mais mulheres que aqui vão estar. Nós temos um papel muito grande; com certeza, cada uma que aqui está, está representando as mulheres da cidade da gente.

Com certeza, muitas vão dizer da história, das suas lutas, e outras vão se inspirar na gente, porque eu creio que, em todas as nossas lutas, nós temos que deixar legados. Não é verdade? É legado. Nós vamos construir e ser protagonistas da nossa história e deixando legado para os que vierem.

Eu quero dizer aqui que nós devemos continuar a lutar. Como a nossa deputada não desistiu, que mesmo cantora veio assumir a Assembleia Legislativa e é autora desta propositura, nós ocuparemos todo espaço de poder que nós pudermos. (Palmas.) Seja nos conselhos, seja nos ministérios, seja juíza, seja diretora, não importa. Porque é para mim e para vocês.

Eu, mulher, periférica, marreteira, catei latinha pra comprar o leite para o meu filho que está ali, olhe, meu primogênito de 25 anos, e me orgulho disso. Me orgulho. Virei vereadora na minha cidade com muita luta.

E a minha função, eu creio, é trazer mais mulheres para este cenário político, mais mulheres nas câmaras de vereadores, mais mulheres na Assembleia, fortalecendo a nossa deputada, mais mulheres no nosso Executivo.

Então, nós aqui saímos com um papel muito grande e uma tarefa de levar a história da mulher periférica, da mulher jovem, da mulher negra, das mulheres na força do espaço do poder. E vamos para cima.

Viva às mulheres. (Palmas.)

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - E vamos anotar nas nossas agendas um convite imperdível: no dia 5 de junho, quarta-feira, às 19 horas, no Plenário Presidente Juscelino Kubitschek, as nossas deputadas Maria Lúcia Amary e Leci Brandão recebem, em uma sessão solene, a outorga do Colar de Honra ao Mérito Legislativo do Estado de São Paulo, através da iniciativa do deputado André do Prado.

Então, nossa deputada Leci Brandão vai receber o Colar de Honra ao Mérito Legislativo do Estado de São Paulo. Então, todos, todas e todes aqui presentes, viu, gente? O convite é definitivamente imperdível. Está certo? Até lá. (Palmas.)

Eu quero agradecer imensamente a honra e a oportunidade de poder falar e apresentar cada uma das brilhantes, incríveis, inspiradoras mulheres que fizeram parte da edição Carolina Maria de Jesus da sessão solene de outorga da Medalha Theodosina Ribeiro, e dizer que hoje e sempre somos todas Theodosinas e continuaremos sempre sendo todas Carolinas. Muito obrigada.

Neste momento, passo a palavra à nossa nobre deputada Leci Brandão para o discurso de encerramento.

Parabéns. (Palmas.)

 

A SRA. PRESIDENTE - LECI BRANDÃO - PCdoB - Deus abençoe, proteja e ilumine a todos, todas e todes.

Vocês estão percebendo que estou sentada o tempo todo. Não pude levantar para entregar a medalha, o diploma para nossas homenageadas, mas tenho que agradecer a vocês pelo fato de estar aqui hoje. Estou aqui sentada, mas estou com um colar neste pescoço, porque estou com torcicolo desde o início da semana.

Agradeço a todas as pessoas que rezaram, que oraram, que se reuniram em vários espaços de religião para pedir pela restauração da minha saúde. Eu pensei que não fosse ter condições de chegar até aqui para poder fazer esta homenagem, que é a Medalha Theodosina Ribeiro, a primeira mulher negra que entrou nesta Casa.

Ouvindo aqui as palavras de agradecimento, as palavras destas mulheres maravilhosas - todas elas, sejam elas pretas, brancas, enfim -, eu fico pensando muito na dona Lecy de Assumpção Brandão, que está nos braços de Deus desde 2019. Tanto que digo que o ano de 2019 foi o ano pior para mim, o mais difícil. Eu jamais poderia imaginar o momento de perder minha mãe.

E por que eu falo nela? Porque eu pude reparar também aqui, em nossas companheiras, nos seus agradecimentos, a lembrança da família, a lembrança dos parentes. Porque eu não me considero deputada, sabe? Eu sou uma cidadã, cidadã brasileira, filha de uma mulher que foi, durante muitos anos, servente de escola pública.

Tive a honra de morar em três escolas públicas do Rio de Janeiro: Escola Equador, Escola Artur Azevedo e Escola Nicarágua. Os três prédios existem ainda. Quem duvidar, é só ir ao Rio e perguntar onde ficam as escolas. Deve ter a casa de servente lá até hoje. Foram nessas casas que eu morei.

Eu tenho muita experiência de varrer sala de aula, de lavar banheiro de escola pública, de varrer quintal, de tirar poeira, tudo isso. E o que mais me orgulha é ter passado por todas essas funções.

Qual era a minha profissão? Eu não tinha profissão. Eu era filha da dona Lecy, do Sr. Antônio, e sabia muito bem, como sei até hoje, varrer sala, tirar poeira. Não tenho TOC, não. É que não gosto de ver poeira, porque fiz muito isso na minha infância. As pessoas às vezes ficam achando que sou exigente porque não gosto de ver nada fora do lugar e tal, mas é porque a vida me ensinou assim.

Ao mesmo tempo, a dona Lecy nunca deixou de lado a preocupação para que eu estudasse. Então, eu era aquela menina que não era a primeira aluna da sala, mas também não estava no gráfico vermelho. Estava sempre ali no médio, no amarelinho. Antigamente, tinha um gráfico que era verde, amarelo e vermelho. Eu procurava ficar ali, muito bem.

A música foi uma coisa que veio para minha vida por dom de Deus e dos meus orixás, porque, tempos depois, fiquei sabendo que eu também era guiada por orixás. Eu não entendia muito bem o que era isso. Eu sou uma pessoa que não sou rodante... Quem é do axé sabe do que estou falando, mas eu seria... se fosse seguir isso, seria uma ekedi.

E, quando eu entrei para a religião de matriz africana, conheci primeiro a umbanda, depois conheci a Angola, depois conheci o ketu e quero, neste momento, pedir benção - motumbá, kolofé - para todas as pessoas que estão aqui nesta plateia, pois tenho certeza de que aqui tem uma diversidade.

A laicidade do Brasil está aqui. Aqui tem gente da Igreja de Nossa Senhora Aparecida, tem pessoas que são de terreiro, de umbanda, tem gente do candomblé, tem gente que é da igreja evangélica. Nesta Casa temos uma bancada evangélica fortíssima.

Imaginem quando eu cheguei aqui com todo esse histórico. As pessoas me olhavam com um pouco de espanto, porque eu nunca deixei de usar a minha roupinha branca no dia de sexta-feira, que é Dia de Oxalá. E hoje é dia dele.

Nunca me preocupou o fato de as pessoas que conheci aqui nesta Casa serem de ideias religiosas diferentes das minhas, porque a coisa mais importante que minha mãe me ensinou foi o respeito, foi respeitar as pessoas. Eu respeito todo e qualquer cidadão, toda e qualquer cidadã. Eu sou uma pessoa que não me importo com quem é que você dorme, de quem é que você gosta, qual é o seu partido político.

Eu falo isso aqui dentro desta Casa. É até um perigo, mas por que não me importo? Eu quero saber da pessoa. Quero saber o que essa pessoa faz, se essa pessoa é uma pessoa boa, uma pessoa de bem, uma pessoa que tem dignidade, uma pessoa que sabe respeitar o seu próximo.

Então, a minha entrada aqui nesta Casa, eu acho que faz parte de toda essa história. Eu ouvi aqui algumas companheiras falarem, de fato, que eu deixei a música para ir para a política. Eu não deixei nada; eu continuo sendo Leci Brandão da Silva. E não sou deputada, eu sou uma cidadã que, por acaso, é compositora, é cantora, porque Deus quis que eu fosse assim.

Quem me procurou foi um partido chamado PCdoB, Partido Comunista do Brasil. Foram eles que me convidaram para ser candidata. Eu nem sabia o que era isso, não entendia nada, como eu me considero, nesta Casa que tem 94 deputados, talvez, dentre eles, a que tem a menor experiência em questões de política. A pessoa que não tem o currículo de academia, de teoria, que a maioria, todos eles têm.

Mas eu não tenho o menor constrangimento de chegar e perguntar para cada um deles alguma coisa que eu não sei. Eu sempre perguntei, como pergunto a todas as pessoas, todos os quilombolas que são lá do meu gabinete, que é o Quilombo da Diversidade.

Queria dizer a vocês que, não fossem eles, talvez eu não estivesse hoje aqui, fazendo esta sessão. Porque todo mundo me ensinou, como eu tenho certeza de que aqui, nesses assentos, tem dezenas de pessoas, mulheres e homens, que me ensinaram muito.

Eu estou aqui porque vocês foram dizendo para mim como era, o que é e tal. Não vão me perguntar sobre Regimento, porque essa coisa, realmente, eu não sei. Não sei de Regimento, não sei o significado de muitas coisas que leio, mas eu tenho a minha assessoria de comunicação - a Carla, a Carina - e chego para elas e pergunto: o que quer dizer isso aqui? Não tenho nenhum problema com isso.

Sempre pergunto, sempre peço ajuda e, graças a Deus e aos meus orixás, eu tenho sido ajudada. Tenho sido ajudada não só no Parlamento, tenho sido ajudada nas minhas questões em relação à democracia, todos esses assuntos que percorrem aqui dentro desta Casa, que aqui tem muito assunto.

Fala-se aqui sobre tudo. E tem coisa que eu fico ouvindo, não entendo nada. Aí chego lá no gabinete, o quilombo, digo: “Olha, vem falar disso aqui; o que é?”. Eles dizem, elas dizem...

Elas, principalmente, inclusive parlamentares que estão nesta Casa atualmente: “Você é minha referência, Leci; meu pai te ouviu, minha mãe, minha avó”. Aí eu fico perguntando, e estou perguntando hoje: o que é isso, por que isso acontece? Por que as pessoas falam isso para mim? Eu sou referência de quê? O que eu fiz?

Eu fui sempre uma pessoa muito simples, eu nunca escrevi nenhum livro. Eu tenho música, que Deus manda - letra e música junto. E é no ritmo de samba. Por que, eu também não sei; acho que é porque a mamãe já saía na Mangueira, quando eu nem sonhava em nascer. Minha vó também.

Então, nasci ouvindo e vivendo no meio desse ritmo. Mas eu nunca deixei de ouvir outros ritmos também, daí o meu respeito a todos os artistas, porque eu sempre ouvi um pouquinho de tudo.

E isso acabou influenciando na hora da minha composição. Nos meus LPs, que são mais de 20, vocês não vão encontrar só samba, só partido-alto, não. Vocês vão encontrar boleros, vocês vão encontrar canções, vão encontrar valsa, tudo. Porque eu ouvi um pouco de tudo. E isso foi formando a minha vida. E me espanta muito...

Hoje aqui houve momentos em que eu fiquei arrepiada. Eu me emociono, mas não consegui chorar, porque foi uma semana em que eu fiquei muito tensa, porque eu sabia que ia ter a Medalha Theodosina. E eu ficava perguntando: “Será que vai dar certo, será que eu vou conseguir conduzir bem?”.

Mas eu não preciso conduzir; eu tenho os meus assessores, que fazem isso com muito carinho. Porque eu sou aquela que não é chefe; eu não sou patroa, eu não mando em nada. Quem manda na minha vida são as pessoas que... Eu não vou esquecer, não, gente. Eu sei o que eu vou falar depois, espera aí. Quem manda na minha vida são eles.

Então, assim, São Paulo foi um caminho que me deu, foi a vida que me deu esse caminho. Sou carioca de Madureira, nascida em Madureira, criada em Vila Isabel, morei em Realengo. E não morei em casa própria, nada disso. Eu morei em casas de escola pública; a gente não tinha condição de pagar aluguel, então nós morávamos na escola pública.

E, por morar na escola pública, eu tive que aprender todos esses serviços. Eu sempre agradeço ao pessoal que trabalha aqui nos serviços gerais da Assembleia, porque quando eu vejo essas senhoras aqui no corredor, varrendo, limpando, eu me lembro muito da minha mãe, pois era isso que a minha mãe fazia.

Eu, inclusive, faço questão de andar no elevador de serviços gerais. Dificilmente, alguém me vê no elevador dos deputados. Porque o papo que rola dentro do elevador de serviços gerais é um papo que tem a ver comigo, com a minha vida, com a minha história. Por isso que eu queria pedir aplauso para os serviços gerais desta escola aqui, esta Assembleia. (Palmas.)

E aí, eu não sabia que um dia eu ia, além de pegar as vassouras todas que eu já peguei na minha vida - os rodos, vassouras de piaçava, vassouras de pelo, espanador, flanela -, eu estaria também um dia pegando uma folha de papel, uma caneta, para assinar projetos. Jamais isso poderia passar na minha cabeça.

Então, isso acontece, está acontecendo desde 2010, e eu sempre me surpreendo com tanta coisa que a gente já construiu. Agora, eu, Leci Brandão da Silva, sozinha, não iria fazer nada disso. Sozinha, jamais, mas com a ajuda do PCdoB, que eu tenho que dizer: o PCdoB foi que me escolheu.

O PCdoB foi que disse para mim assim: “Você já era comunista desde pequena e não sabia”. Eu digo: “Eu, comunista? Eu não sou comunista, de forma alguma”. Eu ouvia dizer que comunista era uma coisa perigosa.

E eu vejo como ser comunista é bom. É muito bom, é muito bom ser comunista. (Palmas.) É muito bom ser cidadã, é muito bom ser mulher preta. Mulher preta passa por determinadas coisas que eu passei na minha vida.

E quando elas fazem aqui as suas confidências e as suas histórias, é aquele negócio: “Eu não arranjava emprego porque eu era uma menina preta, meu cabelo não era alisado, eu usava duas trancinhas aqui e tal, meu cabelo era cabelo duro”. E meu cabelo é durinho mesmo, tal; não faço questão de alisá-lo. Alisar era na época do Henê, era moda botar Henê, tal. Mas não era uma coisa muito boa.

Eu sou uma mulher que tem uma vida que não é escondida; todo mundo sabe o que eu sou, por que eu sou. E eu sempre tive o cuidado de não agredir ou ofender, de alguma forma, a dona Lecy de Assumpção Brandão.

Sempre respeitei dona Lecy de Assumpção Brandão. Mas nunca enganei a minha mãe; ela sempre viu a minha vida do jeito como ela é. Mas eu nunca afrontei, porque eu entendo perfeitamente como é o comportamento da sociedade brasileira.

Mas eu não tenho vergonha de nada do que eu fiz, não tenho vergonha de nada do que eu sou. Tenho muito orgulho, muito orgulho de ser uma pessoa que não tem riqueza. O que eu consigo construir na minha vida é a minha dignidade, é o meu respeito a todas as pessoas, é saber que eu vivo em um País que não aceita muito a minha questão religiosa.

Eu sei que a nossa comunidade do candomblé, do ketu, da umbanda e tal infelizmente é muito perseguida, mas nem por isso eu vou deixar de cumprimentar e respeitar os evangélicos, os... Enfim, qualquer religião.

Eu acho que agradecer é pouco. Agradecer a vocês é muito pouco, porque o tanto que vocês já fizeram e fazem por mim, qualquer coisa que eu fizer, eu vou ficar sempre devendo, eu estou fazendo muito pouco.

Para as mulheres que entraram nesta Casa depois de 2010 e dizem que vieram para cá porque eu fui referência, eu fico realmente espantada e peço inclusive orientação para elas também. São meninas bem mais novas e não tenho vergonha de pedir.

Doutora Claudia Luna, quando Rozina Conceição um dia disse que tinha ouvido a senhora em uma palestra, eu falei: “Eu quero conhecer essa moça”. Depois que a conheci, sempre faço questão de que você esteja aqui comandando a nossa Medalha Theodosina Ribeiro.

Júlia, quando conheci você e entrei no partido, eu não sabia como me comportar, como me conduzir e vocês foram não ensinando, mas me dando exemplos. Eu tenho tudo como exemplo, qualquer coisa que vocês façam, o mínimo que seja, eu tenho como exemplo na minha vida. E essa é a minha vida.

Querem saber o porquê eu compus tanta música social, tanta música de protesto? Eu nem sabia, um dia que me falaram que eu era cantora de protesto. Eu não sabia que eu era cantora de protesto. Falaram que eu era uma cantora que fazia música para o povo que era “coluna do meio” e eu nem sabia o que era “coluna do meio”.

Hoje eu fico sabendo que é LGBTQIA+, não sei o que, quantas letras. Eu fazia por coração, por sentimento, não porque alguém tivesse dito para mim que era isso. Então, é assim, eu respeito pessoas, qualquer pessoa.

Eu quero agradecer a minha amiga Lígia, que está aí também na plateia. Eu fico com muito medo de falar nomes, porque tem muita gente aqui que eu conheço, muita gente mesmo. Quando você fala 99 e não fala o 100º, você arruma um problema na sua vida, e eu não quero que isso aconteça.

Matilde Ribeiro, quando me chamou para fazer parte da Seppir, eu pensei que era para receber dinheiro, eu falei: “Vou ter emprego no governo?”. E você: “Não, você vai ser do conselho, é diferente, é outra coisa”. Fiquei lá, graças a Deus. Quando você disse, porque que a gente está sempre se debatendo...

Eu perguntei a você por que os pretos não se dão. Porque eu via que na reunião de lá era todo mundo preto, era todo mundo do conselho da população negra, mas todo mundo discutia demais e eu não entendia: “Mas a gente não é tudo da mesma cor? Por que ficam brigando?”.

Então eu entendi que tem uma coisa chamada “partido político”, um é de uma corrente, outro é outra, aí eu comecei a entender como é que o negócio rola. Mas como eu quero ser amiga de todo mundo, faço questão de ser e tratar bem, eu me dou com todo mundo.

Eu sou do PCdoB, mas aqui nesta Casa todo mundo gosta de mim, graças a Deus. Nunca xinguei ninguém, nunca fui ofendida de forma alguma, entendeu? Mantenho a minha simplicidade, não gosto de me trajar como “a deputada”.

Não, eu ando aqui, tem dia que eu estou de tênis, tem dia que eu venho de sandália, tem dia que eu... Só não vou andar descalça, porque aí também seria... Mas é a minha simplicidade, é desse jeito que eu vivo.

Hoje eu estou tendo muita dificuldade inclusive de falar, de agradecer, porque eu estou muito grata a Deus, sabe? Estou com muita vontade de chorar, porque eu estou aqui hoje e eu pensei que eu não fosse ter condições de chegar aqui.

Eu emagreci, fiquei com 43 quilos. Nunca tive essa pesagem na minha vida, mas estou aqui. Estou magrinha, estou diferente. A roupa não está dando, estou tendo que comprar roupa, porque nada dá em mim, então eu emagreci bastante. Eu fiquei muito doente, mas vocês rezaram, vocês pediram por mim e graças a Deus eu estou aqui.

Dizer que, Dra. Theodosina, eu tive o prazer de conhecê-la, graças a Deus. Ela disse: “Minha filha, depois de 40 anos você chegou aqui. Você veio aqui, chegou aqui em 2010”, ela era de 70. Eu fiquei muito feliz e fico grata de a filha dela ter feito o depoimento que fez aqui de as pessoas ainda estarem a homenageando e fazendo os seus trabalhos sociais, trabalhos intelectuais, enfim, com a responsabilidade de Dra. Theodosina Ribeiro.

Carolina de Jesus, eu não preciso dizer mais nada porque tudo já foi dito. Ela é uma das maiores escritoras do meu País e que dá a oportunidade para mim, para a minha equipe de fazer este prêmio este ano em homenagem a ela.

Muito obrigado a vocês. Que Deus abençoe vocês, proteja sempre. Tenham fé, não percam a fé nunca. Tenham esperança, porque tudo caminha para que a gente seja cada vez mais forte, cada vez mais capaz, cada vez mais ter honra de ser cidadãos ou cidadãs brasileiras.

Eu acredito no meu País, porque eu estou vendo o meu povo em outros espaços e é muito importante que todos vocês estejam aqui neste lugar, porque aqui é a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, estado mais rico deste País, uma assembleia potente. Eu só acho que nesses assentos têm que ter mais a nossa representação, têm que ter mais gente igual a gente. Enquanto isso não acontecer, eu não vou ficar muito feliz. É só isso que eu acho. (Palmas.)

Deus abençoe a todos, saúde, paz para todo mundo e muito obrigada a todos os assessores. Eu tenho medo de falar o nome de vocês, eu sei o nome de todo mundo, mas se eu esquecer alguém, vocês vão me cobrar pelo resto da vida.

Mas eu quero agradecer à Rozina, ao Julião, ao Beto Almeida - que é o nosso chefe de gabinete -, ao Jorginho Saracura. Agradecer ao Vagnão, agradecer ao Doni, agradecer ao... (Vozes fora do microfone.) Eu estou falando os homens primeiro.

Mas eu tenho que agradecer à Eliege, Carla, Carina, Silvia Ariza, minha querida secretária. Você foi a primeira mulher que eu conheci quando cheguei na política, primeira pessoa que eu conheci.

Foi a primeira pessoa que eu disse: “Olha, ninguém vai me perseguir não? Porque eu não tenho grana, não tenho nada”. E ela disse: “Você faz declaração de imposto de renda?”, e eu falei: “Sempre fiz”. “Cuidado, porque a gente... Qualquer coisa que...”. “Disso não tenho medo”.

Eu nunca errei nessa parte, não. Eu gosto de ter o que é meu e o que eu tenho direito, mas roubar e fazer chantagem, fazer emenda em trocar de dinheiro ou então dar a emenda e pegar o troco, Leci Brandão da Silva não faz isso não. Eu tenho vergonha. (Palmas.)

Obrigada, meu querido oriental, Ricardo Yamasaki, que ninguém entende: “Por que tem um japonês no seu gabinete?”. Ele é Yamasaki, mas é um cara que faz tudo que os Silvas e Santos querem e pedem.

Uma vez chegou um pessoal lá: “No seu gabinete tem um oriental”. Eu falei: “Um oriental? Como é que é isso? Tem o Ricardo. O sobrenome dele é Yamasaki, mas ele me atende. Tudo que ele faz, ele me dá satisfação”. Independente disso, é uma pessoa que me ajuda à beça nos meus momentos difíceis. Ninguém sabe disso, mas ele me ajuda muito. E eu pago a ele, porque eu o emprego e o faço cansar. Tem história não.

Eu estou muito emocionada. Estou aqui, mas estou tremendo para caramba, porque é uma vitória estar aqui nesta manhã de hoje com vocês todos e dizer muito obrigada por tudo que vocês fizeram por mim. Eu continuo confiando e tenho muita fé em cada um que está aqui.

Obrigada, São Paulo.

Obrigada, minha gente. (Palmas.)

 

A SRA. MESTRE DE CERIMÔNIAS - CLAUDIA LUNA - Obrigada, deputada Leci Brandão. Obrigada a todos, todas e todes. Convidamos a todas as pessoas presentes para o coquetel, que já está sendo servido ali no Salão dos Espelhos, que fica ali no fundo deste plenário, naquela saída à esquerda.

Então, neste momento, declaro encerrada a presente sessão de outorga da Medalha Theodosina Ribeiro.

 

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- Encerra-se a sessão às 12 horas e 45 minutos.

 

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