29 DE AGOSTO DE 2022
23ª SESSÃO SOLENE PARA OUTORGA DO COLAR DE HONRA AO MÉRITO
LEGISLATIVO DO ESTADO DE SÃO PAULO AO ESCRITOR PEDRO BANDEIRA
Presidência: CARLOS GIANNAZI
RESUMO
1 - CARLOS GIANNAZI
Assume a Presidência e abre a sessão. Anuncia a composição da
Mesa. Informa que a Presidência efetiva convocou a presente sessão solene para
"Outorga do Colar de Honra ao Mérito Legislativo do Estado de São Paulo ao
Escritor Pedro Bandeira", por solicitação deste deputado, na direção dos
trabalhos. Convida o público a ouvir, de pé, o "Hino Nacional
Brasileiro".
Escritora, pesquisadora e crítica literária,
faz pronunciamento.
3 - MARISTELA PETRILLI
Editora de literatura, faz pronunciamento.
4 - ROSANA RIOS
Presidente da AEILIJ - Associação dos Escritores e
Ilustradores de Literatura Infantil e Juvenil, faz pronunciamento.
Bibliotecário e criador do podcast “O
Prazer de Ler”,
faz pronunciamento.
6 - EDSON GABRIEL GARCIA
Educador e escritor, faz pronunciamento.
Professora e supervisora de ensino, faz pronunciamento.
8 - ANA PRISCILIA
Integrante da plateia, faz pronunciamento.
Presidente do Conselho Regional de
Biblioteconomia do Estado de São Paulo, faz pronunciamento.
10 - LUCIANE GEOFF
Professora da rede municipal de
ensino da Capital, faz pronunciamento.
11 - CELSO GIANNAZI
Vereador de São Paulo, faz
pronunciamento.
12 - WILLIAN
Estudante universitário e servidor
público, faz pronunciamento.
13 - PRESIDENTE CARLOS GIANNAZI
Ressalta a importância literária do escritor Pedro Bandeira.
Aborda a trajetória profissional do homenageado. Outorga o Colar de Honra ao Mérito Legislativo do Estado de São
Paulo ao escritor Pedro Bandeira, acompanhado do educador Edson Gabriel Garcia e da professora Luciane Cavalcante.
14 - PEDRO BANDEIRA
Escritor, faz pronunciamento.
15 - PRESIDENTE CARLOS GIANNAZI
Faz agradecimentos gerais. Encerra a sessão.
*
* *
- Assume a Presidência e
abre a sessão o Sr. Carlos Giannazi.
*
* *
O SR. PRESIDENTE - CARLOS GIANNAZI - PSOL -
Senhoras e senhores, nós vamos iniciar oficialmente a sessão solene em
homenagem ao nosso grande escritor Pedro Bandeira.
Esta sessão
solene tem a finalidade de outorgar o Colar de Honra ao Mérito Legislativo do Estado
de São Paulo ao escritor Pedro Bandeira. Comunicamos aos presentes que esta
sessão solene está sendo transmitida ao vivo pela TV Alesp e pelo canal Alesp
no YouTube.
Quero então
compor, primeiramente, a Mesa de hoje. Quero chamar Pedro Bandeira para compor
a Mesa, o nosso homenageado de hoje. (Palmas.) Quero chamar também para compor
a Mesa a Profa. Dra. Marisa Lajolo, escritora, pesquisadora e crítica
literária. (Palmas.)
Chamo ainda
para compor a nossa Mesa a Maristela Petrilli, que é editora da obra do Pedro
Bandeira. (Palmas.) Chamo também a Rosana Rios, escritora e presidente da
Associação dos Escritores de Literatura Infantil e Juvenil. (Palmas.)
Quero chamar também
Oscar Bertani Garcia, bibliotecário e autor do podcast “O Prazer de Ler”.
(Palmas.) Chamo ainda também o nosso escritor e educador Edson Gabriel Garcia.
(Palmas.)
Sob a proteção
de Deus, iniciamos os nossos trabalhos. Nos termos regimentais, esta Presidência
dispensa a leitura da Ata da sessão anterior. Sras. Deputadas, Srs. Deputados,
minhas senhoras e meus senhores, esta sessão solene foi convocada pelo
presidente desta Casa de Leis, deputado Carlão Pignatari, atendendo uma
solicitação, com a finalidade de “Outorgar o Colar de Honra ao Mérito
Legislativo do Estado de São Paulo ao jornalista e escritor Pedro Bandeira”, que é a
maior honraria do estado de São Paulo que alguém pode receber.
Mas antes de iniciar aqui as
intervenções de hoje, nós vamos ouvir o Hino Nacional com a banda da Polícia
Militar, que está sendo regida pelo 1º Sargento da Polícia Militar, Gleidson
Azevedo.
Vamos ficar de pé, então.
* * *
- É executado o Hino Nacional
Brasileiro.
* * *
O SR. PRESIDENTE - CARLOS GIANNAZI - PSOL - Fazer um
agradecimento muito especial à banda da Polícia Militar de São Paulo,
representada aqui pelo maestro Gleidson Azevedo.
Muito obrigado.
Nós vamos iniciar então agora as intervenções,
lembrando que nós temos aqui uma Mesa montada.
A gente vai primeiro ouvir os
representantes que estão aqui na Mesa e em seguida nós vamos franquear a
palavra às pessoas que desejarem fazer uso aqui da nossa tribuna para
homenagear o Pedro Bandeira. Eu vou seguir aqui a lista da Mesa. Vou chamar
primeiro a Marisa Lajolo para fazer a primeira intervenção.
Pode falar daqui ou da tribuna -
acho que é melhor. Todo mundo hoje vai utilizar a tribuna da Assembleia
Legislativa. Sintam-se deputadas e deputados hoje. O Pedro, gente, vai ser o
último a falar; ele só vai ouvir agora. Só vai falar quando receber o colar.
A SRA. MARISA PHILBERT LAJOLO - Agradecendo o convite para
participar deste evento, quero cumprimentar o deputado Carlos Giannazi pela
homenagem que presta a escritores brasileiros. Gesto raro e extremamente
louvável de um político olhar para a cultura e para as artes e trabalhar para
elas, como o deputado fez a propósito da Ruth Rocha e faz agora a propósito do
Pedro Bandeira.
Abraço, deputado. Pedroca, Santos,
comecinho da década de 40 do século passado. Em 1942, nasceu o caçula da dona
Hilda e do Seu Pedro. Reforçando a identidade santista, Pedro é do signo de
Peixes; faz anos no dia 9 de março.
Passa-se o tempo, um tempo cheio
de livros. Ainda Santos; o Santos do Futebol Clube de Pelé. Mais livros e
grandes amigos no Colégio Canadá, da Rua Mato Grosso, entre a Washington Luís e
a Conselheiro Nébias com seus bondes barulhentos, que o Pedro conhecia desde
que era menino e que preferia morar numa rua de terra.
Os cinemas no Gonzaga, o Cine
Atlântico da Praça da Independência, os colegas do curso Clássico, Científico e
Normal, o Grêmio Estudantil Vicente de Carvalho, o Gevec, onde se ensaiava uma
participação política e havia acaloradas disputas eleitorais; o centro dos estudantes
de Santos.
Alunos e alunas todos devidamente
uniformizados. Meninas de saia pregueada azul-marinho, blusa branca e acho que
uma gravatinha; os meninos de calça caqui e camisa branca.
E todos, meninos e meninas, com um
esvoaçante blusão vermelho. Pedro Bandeira, magrelo, sempre muito despenteado,
falando de teatro e de literatura, de cinema e de política. Sempre, sempre a
literatura.
E peço aqui licença ao nosso
homenageado, Pedro, para trazer para esta celebração à poeta Cora Coralina, que
celebrando as leituras dela da infância evoca: “Eu me identificava com as
estórias.
Fui Maria e Joãozinho perdidos na
floresta. Fui a Bela Adormecida no Bosque. Fui Pele de Burro. Fui companheira
de Pequeno Polegar e viajei com o Gato de Sete Botas. Morei com os anõezinhos. Fui
a Gata Borralheira que perdeu o sapatinho de cristal”.
É uma viagem semelhante que Pedro
evoca na biografia que conta em quatro vidas entre linhas e traços. Ele se
identificava com o que lia, tendo tudo começado com as histórias que ouvia no
colo da dona Hilda. Ele adormecia tremendo de medo da bruxa que perseguia a Branca
de Neve.
Depois, tendo aprendido a ler,
ficava disparando revólveres imaginários na frente de um espelho. Se sentia um
índio genuíno quando declamava I-Juca Pirama: “Sou bravo, sou forte, sou filho
do norte”. Ele viveu as aventuras com Tom Sayer, Huckleberry Finn e se
imaginava Ubirajara mergulhando a mão num formigueiro, declamando Castro Alves
aos berros para que tanto Andrada quanto Colombo pudessem ouvi-lo.
É isso, Pedroca; literatura
existe para isso. Leitora é isso; leitura é isso. Todos os muitos prêmios que
você ganhou - APCA, Jabuti, Adolfo Aizen, FNLIJ - talvez representem sua
importância na vida de seus leitores.
E seus leitores, as centenas de
milhares de seus leitores, desde a história “O dinossauro que fazia au-au”, de
1983, vivem as vidas que você lhes oferece e voltam mais ricos e melhores para
suas próprias.
Identificam-se com o amor pelo
esporte de Magrí, aprendem a importância da militância política com Miguel,
contagiam-se pelo amor ao conhecimento de Crânio, descobrem as belezas do
teatro com Calu e admiram a coragem e a força de vontade de Chumbinho.
Ou seja, Pedroca, meu querido
compadre, todos nós a partir de seus livros aprendemos que vale mesmo muito,
muito a pena viver como o avesso dos coroas e o contrário dos caretas, isto é,
viver como um cara. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE - CARLOS GIANNAZI - PSOL - Muito
obrigado, Marisa Lajolo. Fazendo aqui a sua homenagem
ao Pedro Bandeira. Já chamo também para fazer uso da palavra a Maristela
Petrilli.
Aproveito,
enquanto ela se dirige à tribuna para anunciar a honrosa presença da Ana
Cláudia Martins, presidente do Conselho Regional de Biblioteconomia de São
Paulo. Também quero registrar a honrosa presença dos familiares do Pedro
Bandeira, Lia Bandeira, que é a esposa, Rodrigo Bandeira, filho, e a Lê
Cardoso, nora, Érico Bandeira, neto.
Registro ainda
a presença do vereador Celso Giannazi, representando a Câmara Municipal de São
Paulo, a professora Luciane Cavalcante, supervisora de ensino da rede
municipal.
Com a palavra,
Maristela.
A SRA. MARISTELA PETRILLI - Boa noite a
todos. Agradeço. Sinto-me honrada com o convite para participar desse merecido
prêmio ao querido autor Pedro Bandeira. Cumprimento o deputado Carlos Giannazi
pela iniciativa, porque homenagear e enaltecer a cultura é coisa rara nesses
tempos sombrios. Parabéns. (Palmas.)
Olha, falar
sobre a trajetória do Pedro Bandeira é falar um pouco de mim, de mim mesma. E
para contextualizar essa jornada, eu vou relatar aqui um pouco da nossa vida
profissional.
Eu sou de
Araraquara. Vim para São Paulo já casada, procurando trabalho. Eu soube de uma
pequena editora localizada ali na Vila Mariana, a Editora Moderna, que estava
precisando de uma revisora de texto. Eu fui entrevistada e contratada sem saber
ao certo o que é que eu deveria fazer nessa situação, nessa função. Eu não
conhecia nada do mercado editorial brasileiro.
Aos poucos, com
apoio de amigos e muita dedicação, eu passei a ser preparadora de texto; mais
tarde, assistente editorial; depois, editora de texto, até que um dia, no
início da década de 80, eu fui convidada para organizar um catálogo de
literatura para crianças e jovens para essa empresa.
Esse mercado
era novo no Brasil, poucos conheciam. Mas nas universidades de São Paulo, Rio
Grande do Sul e Minas Gerais, iniciava-se a cadeira de literatura infantil, com
as doutoras Marisa Lajolo, Regina Zilberman, Nelly Novaes Coelho, Maria
Antonieta Antunes Cunha.
Estudando,
pesquisando e convidando autores para escrever, em junho de 82 eu recebi a
visita de um jovem bonito, brincalhão, sorridente, com um texto com chute para
o instigante, era “O dinossauro que fazia ‘au, au’”.
Muito
impressionados com a qualidade do material, nós lançamos o livro no ano
seguinte, mas eu não poderia imaginar que ali se iniciava uma promissora
parceria de trabalho. No mesmo ano, nós publicamos o “É Proibido Miar”.
Nesse período,
o Pedro Bandeira e eu, juntos, nós estudamos, pesquisamos, lemos, trocamos
ideias com outros autores, ousamos, erramos, sonhamos, criamos e recriamos
histórias.
Não me esqueço
quando, em 1984, depois demos acho que mais um passo ousado, Pedro, e nós
lançamos os seus juvenis: “De Piolho a Garrote”, “Agora Estou Sozinha” e “A
Droga da Obediência”, obra que já atingiu a terceira geração de leitores e
vendeu mais de dois milhões de exemplares. Dali em diante, Pedro, ninguém e
nada mais o segurou.
Foram muitos,
muitos, livros publicados, de todos os tamanhos: grandes, pequenos, curtinhos;
e de todos os gêneros: poemas fábulas, novelas de suspense, mistério, aventura,
humor, de amor, trovinhas, recontos, teatro.
“A Marca de uma Lágrima” chegou no mercado em
85, e causou um reboliço no departamento comercial da empresa, porque as vendas
exigiam uma quantidade absurda de reimpressões, inusitadas até então. Eles não
entendiam nada: “Outra vez vai imprimir?” Outra vez, está vendendo. Está
vendendo.
Mas foi com a
série dos caras, “O Avesso dos Coroas”, consolidada nos períodos de 87 e 88,
com os lançamentos de “Pântano de Sangue” e “Anjo da Morte” que você passou a
ser o campeão de vendas juvenis no mercado editorial brasileiro. O seu talento,
a sua profissão de escritor, estava consolidada.
Você foi, e
ainda é, capaz de inventar mundos. A sua produção é potente e tem uma forte
identificação do leitor. Você é mestre nos diálogos, nos cortes precisos da
trama, na tarefa de criar. E eu quero mais, eu quero mais, eu quero mais.
E depois, e
depois, o que vem depois? Com sensibilidade e inteligência, os seus textos nos
remetem às questões cotidianas que nos assombram: o medo, a alegria, o amor, o
desamor, a solidão, a amizade.
À excelência
literária do seu trabalho soma-se a diversidade temática e de público-alvo de suas
obras comprovadas pelos inúmeros prêmios que recebeu e pelo volume de
reimpressões e reedições dos seus livros.
Nas não é só o
pequeno e jovem leitor que você encanta, meu amigo. São muitos os testemunhos
de escritores de hoje que seguiram os seus conselhos, suas recomendações e as
suas leituras críticas.
A sua escrita,
Pedro, não tem idade, é para todos: crianças, jovens e adultos. E você é tão
querido por nós que é por isso que nós estamos hoje aqui reunidos para
abraçá-lo, homenageá-lo e aplaudi-lo. Você é um brilho.
Parabéns,
querido amigo, pela justa homenagem. É uma honra tê-lo como um dos nossos
autores exclusivos.
Salve Pedro
Bandeira. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE -
CARLOS GIANNAZI - PSOL - Obrigado, Maristela
Petrilli. Chamo agora para fazer a sua homenagem a Rosana Rios. Lembrando que a
sessão solene está sendo televisionada, ao vivo, pela TV Assembleia.
A SRA. ROSANA RIOS - Boa noite a
todos. Eu vou começar pedindo licença para me dirigir a este público não como
Sr. Deputado, Sr. Vereador, senhoras, senhores, damas e cavalheiros, mas eu vou
me dirigir a vocês como meninas e meninos, porque eu gostaria de falar não aos
adultos aqui presentes, eu gostaria de falar à infância e à juventude que
continuam vivas dentro de nós, já que é da natureza do nosso homenageado, meu
querido amigo Pedro, falar diretamente às crianças e aos jovens que existem e
que sempre existirão dentro de nós.
Então, meninas
e meninos, eu fui convidada, estou aqui com muita honra falando em nome dos
escritores, dos membros da AEILIJ, Associação de Escritores e Ilustradores de
Literatura Infantil e Juvenil, que reúne autores de texto e de imagem de todo o
Brasil.
Nós temos a
honra de ter o Pedro como nosso conselheiro da AEILIJ. É difícil a gente falar
de como cada um de nós, como a Maristela frisou, tenta seguir os passos desse
cara, com “K”, porque faz 50 anos que ele publica, e ele optou por direcionar o
seu talento às obras de arte que encantam os pequenos e os jovens.
Escrever
literatura é sempre uma opção. Escrever literatura para crianças e para jovens
é uma opção perigosíssima, é uma opção ousada até. Quantas vezes dizem para a
gente “você escreve livrinhos para crianças, quando você vai conseguir publicar
um livro adulto, quando você vai conseguir?”, e a gente não quer conseguir
publicar um livro adulto, a gente quer seguir os passos desse cara incrível que
escreve para a alma das crianças, para a alma dos jovens.
O Pedro não
apenas abriu espaços para os que vieram depois dele, como nós todos, mas ele
seguiu os passos daqueles que vieram antes. Então tem antes dele uma galeria
imensa de gigantes que se tornaram clássicos: Hans Christian Andersen, Lewis
Carroll, Miguel de Cervantes, Charles Perrault, Lobato.
Podem até me
dizer que nem todos eles dedicaram a sua escrita especificamente às crianças,
mas assim como o nosso autor homenageado eles falam e falarão sempre à alma
humana e seus personagens vivem hoje na memória coletiva das crianças de todas
as idades, meninos e meninas.
Eles vivem e as
crianças conhecem muito bem os patinhos feios, as Alices que mergulham nas
maravilhas, as Emílias, os Quixotes e os lobos maus que habitam este mundo.
Da escrita do
Pedro Bandeira surgiu uma jornada mágica que começou com aquele dinossauro que
eles citaram, que fazia “au au”, tinha aquele cachorro que queria miar, e era
proibido miar, chegaram as incríveis descobertas dos mistérios da minha querida
Feiurinha, minha preferida e passou por aquelas drogas inomináveis, que tentavam
e talvez ainda tentem fazer os caras, os nossos eternos adolescentes, manter a
obediência.
Mas é claro que
os caras não vão ser obedientes. Tantos segredos na obra do Pedro foram
revelados graças a marcas, como a marca que deixou uma única lágrima. Com tantas
décadas de carreira e mais algumas tantas de idade cronológica que a gente não
vai revelar, o meu querido amigo Pedro é uma dessas eternas crianças, ele está
sempre rindo, está sempre alegre, está sempre fazendo piada.
Na sua
criatividade e generosidade ele abraça a todos nós, autores que tentamos fazer
o que ele faz e que é simplesmente encantar os leitores. Nós todos enfrentamos,
hoje e sempre, muitos problemas, na esfera pública, na esfera particular.
Nós temos
encarado conflitos, censuras, incompreensões e nós estamos cansados de saber
que não existe outro caminho para melhoria da vida da nossa gente que a
ampliação da educação e da cultura. Nossos filhos e netos precisam disso,
precisam de livros.
E é por isso
que as nossas armas para combater essas dificuldades todas são essas armas tão
simples, a escola, a leitura de bons livros, o livro em si, com maiúscula.
Essas nossas armas parecem tolices, parecem bobagens, mas são aquilo que nos
mantêm a esperança.
E é graças a
grandes brasileiros como esse nosso Pedro Bandeira que nós temos livros a mão
cheia, como já diriam outros autores. Então eu agradeço ao Pedro pela sua obra,
pela sua generosidade em dividi-la conosco.
Muito obrigada.
(Palmas.)
O SR. PRESIDENTE - CARLOS GIANNAZI - PSOL - Obrigado,
Rosana Rios. Chamo agora, para fazer sua homenagem, Oscar Bertani Garcia.
O SR. OSCAR BERTANI GARCIA -
Boa noite a todos. É um prazer enorme estar aqui com vocês hoje. Em primeiro
lugar, eu gostaria de agradecer ao deputado Carlos Giannazi por abrir este
espaço, por dar esta oportunidade de termos essa homenagem a um dos grandes, a
um dos maiores escritores não só da literatura infanto-juvenil brasileira, mas
da literatura brasileira.
Eu sou
bibliotecário e eu sigo indicando Pedro Bandeira para as crianças, para os
jovens. Eu sou responsável por quatro bibliotecas. Hoje eu estava em uma
biblioteca na zona norte de São Paulo, no bairro da Casa Verde Alta, e um
estudante me pediu um livro. “Eu queria um livro de mistério, de suspense”.
O que eu
indiquei para esse menino? É fácil. “Olhe, dê uma olhada nisso aqui.” “’A droga
da obediência’, gostei do nome”. Falei: “Dê uma ‘lidinha’ atrás, veja o que
você acha.”. “Adorei, gostei muito.” Ele pegou o livro na hora do intervalo.
No fim da aula
ele voltou à biblioteca e falou: “Eu estou adorando.”. Eu falei: “Mas como
assim, você estava em aula.”. “Eu fazia a lição rápido e comecei a ver na
aula.” “Muito bem, meus parabéns.” “Mas eu quero ler devagar, porque vai acabar
rápido.” Eu falei: “Fique tranquilo que desse mesmo autor nós temos muitos
outros livros na nossa biblioteca.”. Esse é um caso.
Sexta-feira eu
estava em uma biblioteca na zona leste de São Paulo, em Belenzinho, e uma
estudante do oitavo ano me disse: “Eu queria um livro que fosse de suspense, de
aventura, mas que tivesse romance.”.
Eu parei, olhei
e pensei “o que será que eu indico para ela?” É fácil, “dê uma olhada nesses
livros aqui”. Ela olhou, olhou e o que ela escolheu foi “Pântano de sangue”. E
assim vai, eu perdi a conta de quantas vezes eu já indiquei os livros do nosso
querido Pedro Bandeira.
Na pandemia eu
comecei a fazer um podcast. No podcast eu só conto histórias, aí o autor
participa. Só tem áudio, não tem vídeo. Um dos autores mais pedidos do podcast
era o Pedro Bandeira, até que nós, na segunda temporada, fizemos um episódio de
“a eleição da criançada”. Sucesso absoluto, é um dos episódios mais ouvidos.
Nosso podcast
está chegando a 100 episódios, sempre com a participação dos autores. Chegamos
em 38 países, todos os continentes, todos os estados brasileiros, e o episódio
“Eleição da Criançada” é o nosso best-seller. Eu só tenho que agradecer ao
Pedro.
Tive a
oportunidade, na última bienal, de mediar uma Mesa com Pedro Bandeira, e é
impressionante: quando eu subi no palco, onde eu olhava, estava cheio. Eram
crianças, eram jovens, eram adultos, muitos escritores, todos felizes de vê-lo.
A gente vê a
jovialidade do Pedro. Quando a gente saiu do camarim, iam crianças andando
atrás dele. Era o flautista de Hamelin: as crianças seguindo o Pedro. Incrível.
E o Pedro ia parando, conversando com todos, professores paravam: “Você é o
Pedro Bandeira”. “Sou”.
E aí as
crianças abraçavam, queriam chegar perto. O Rodrigo, que é filho do Pedro,
falou: “Pai, põe a máscara, pai, põe a máscara, pai”. Essa é mais uma das
pequenas histórias com o nosso mestre Pedro Bandeira.
Então, eu
queria dizer que estou muito feliz de estar aqui representando a nossa classe
de bibliotecários, que é uma classe tão sofrida no nosso País. Eu sempre digo
que a minha missão é formar leitores, essa é minha missão de vida. E uma pessoa
que me ajuda muito nessa luta de formar leitores é o nosso mestre Pedro
Bandeira.
Já perdi a
conta de quantos livros eu já li do Pedro Bandeira. A minha filha tem sete
anos, eu leio para ela todas as noites. De cabeça, o que eu já li para ela:
“Feiurinha”, que já foi citado, “O Dinossauro que fazia au-au” que já foi
citado, “Alice no país da mentira” e tantos outros.
Então, eu quero
agradecer mais uma vez ao Pedro. Estou muito feliz de estar aqui. Pedro, muito
obrigado.
É isso.
Um grande
abraço e parabéns ao Carlos Giannazi e ao Edson Gabriel Garcia por essa
homenagem tão justa ao nosso mestre Pedro Bandeira. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE - CARLOS GIANNAZI - PSOL - Obrigado,
Oscar. Agora eu chamo um outro Garcia. Vou chamar o outro Garcia agora, que é o
Edson Gabriel Garcia, que é educador, professor, escritor e o embaixador do
nosso mandato. Edson, é com você.
O SR. EDSON GABRIEL GARCIA - Boa
noite a todos e a todas. Boa noite especial para esses dois camaradas, meus
amigos do peito, querido Pedro Bandeira e o querido Carlos Giannazi.
Boa noite
especial ao meu amigo Oscar, que não é nem meu irmão, nem meu primo, mas também
é Garcia e é um cara com quem eu tenho aprendido bastante essa coisa de fazer
leitores, né?
Eu já fui
várias vezes como escritor nas bibliotecas em que o Oscar trabalha, e é uma das
pessoas raras no exercício dessa sensibilidade de formar leitores. Um beijo
carinhoso na Marisa Lajolo, umas das inteligências mais brilhantes, uma das
pensadoras em prol da literatura, do texto, dessas coisas bonitas, com quem a
gente já teve a oportunidade de passear, do ponto de vista intelectual,
discutindo, conversando, aprendendo.
A Maristela,
que tem uma história linda, linda, como editora, e não precisava de mais nada,
só dizer que ela botou o Pedro no mercado para nós já bastava, né? E a Rosana
Rios, excepcional, escritora também, com uma obra vastíssima, plena de sucesso,
que a meninada adora, e que preside...
Já no segundo
mandato, Rosana? No segundo mandato da associação de nós, escritores e
ilustradores de literatura infantil e juvenil. É um prazer estar com vocês
nesta homenagem, um prazer bastante grande.
Normalmente eu
falo de improviso, mas eu fiquei com medo hoje, nesta homenagem... A Mariza
chama o Pedro de “Pedroca”, né? Eu chamo de “Pedrão”. Eu fiquei com medo nesta
homenagem ao Pedrão de engasgar e sair apenas assim, olhar para ele e falar: “Pedro,
eu te amo”, e não sair mais nada. Eu falei: “Mas é muito pouco isso, né?”.
Então eu fiz um
roteiro, eu escrevi algumas palavras. São poucas, tá? Não se impressionem pelo
tamanho, que eu trouxe uma pasta aqui, isso é coisa de professor, não é coisa de
escritor.
Porque o
escritor faz o roteiro, faz o script, só para rasgá-lo depois e não o cumprir.
Aqui está a presença do educador, que fez um roteirinho para não escapar de
dizer essas coisas que o meu coração escorregou para a ponta dos dedos e me fez
teclar para o Pedro.
O meu amigo
Pedro Bandeira deve ter nascido em Macondo, local de centenárias magias. Talvez
por isso tenha o olhar desvendador, que descobre segredos inaudíveis aos comuns
mortais, onde ele põe a clareza dos seus olhos para averiguar a alma humana em
busca desta ou daquela gaveta.
O Pedro tem
leveza nas mãos, uma sabedoria mágica de escrever pelo movimento dos dedos que
tira encantamentos na moradia das palavras daquilo que, para a maioria de nós,
não é percebido. O Pedro tem a curiosidade de quem não se satisfaz com o
verniz, com a aparência indolente da explicação superficial.
Ele tem a
curiosidade sadia do descobridor de tantos mares e tantas praças, tantos ares e
tantas graças. A curiosidade eterna de quem sabe que a vida se refaz a cada
instante. O Pedro tem uma impetuosidade que só as grandes almas têm: inquieto,
procurador, cutucador, fuçador. Ele vive caçando tesouros literários - e
encontrando-os.
O Pedro tem um
jeito criança, um modo de agir sem barreiras de encurtador de distâncias entre
sentimentos, de procurar o que não está aparente, de desacomodar certezas com
suas perguntas, que empurram paradigmas literários de um jeito desrespeitador
de verdades meio mentirosas.
Estou acabando.
O Pedro tem o toque menino do dedo de Midas para fazer sucesso. O Pedro tem
números que causam alegria a qualquer escritor: mais de centenas de livros
publicados, milhares de livros vendidos, milhões de leitores e leitoras, o mais
vendido no País e certamente o mais lido. Milhares de palestras para crianças,
jovens e professores.
O Pedro tem uma
pegada política em sua peregrinação literária. É certamente entre nós o cara
que mais contribuiu para formar novos leitores e leitoras. E se sabemos da
importância da leitura para a saúde intelectual de uma nação, saberemos de sua
relevância nessa trajetória.
O Pedro tem um
coração pleno de generosidade. Uma generosidade que passeia por razões que
somente os sentimentos nobres sabem agasalhar, esparramada entre nós,
privilegiados que convivemos com ele.
E, por fim,
ouso pensar e proclamar que o Pedro não nasceu apenas para viver, mas, nascido
encantado, ele vive predestinado a nos encantar. Parabéns, meu querido amigo,
por mais esta glória em sua carreira e em sua vida. (Palmas.)
Obrigado,
obrigado.
O SR. PRESIDENTE - CARLOS GIANNAZI - PSOL - Edson
Gabriel Garcia. Nós vamos agora para a segunda parte do nosso evento, da nossa
homenagem a Pedro Bandeira, franqueando a palavra a vocês que estão aqui
presentes. A professora Luciane Cavalcante já se inscreveu. É supervisora de
ensino e professora da rede pública. Aqui na tribuna, todo mundo que for falar,
por favor, tribuna.
A SRA. LUCIANE CAVALCANTE -
Boa noite. Boa noite para todo mundo que está acompanhando a gente pela
televisão também. Boa noite ao Pedro. Nossa, que honra, estou super emocionada.
Quero, na pessoa do deputado professor Carlos Giannazi cumprimentar a todos na Mesa.
É uma Mesa...
Nossa, que Mesa! De pessoas que têm história, pessoas que construíram, ajudaram
a construir o que há de mais bonito, de mais forte no nosso País, que é a
capacidade de enxergar, com diferentes pontos de vista, que é a capacidade de
resistência e de sonho.
Homenagear o
Pedro Bandeira, quando a gente fala em homenagear algum escritor da magnitude
do Pedro, é homenagear o direito, que todos nós temos, à literatura, à
Educação, à Cultura e ao sonho.
Então, hoje,
aqui, a gente está diante de uma personalidade. Eu fui leitora do Pedro. O
primeiro livro, que eu li dele, foi a minha mãe, que também é professora, que
meu deu, que foi “A Droga da Obediência”.
Acho que todo
mundo aqui já deve ter lido esse livro, best-seller, e que me motivou a ser
questionadora também, a sempre estar desobedecendo. Então me formou. Então
estou muito feliz de estar aqui hoje, e dizer da importância de a gente fazer
essa homenagem.
Aí o professor
Giannazi, que é a maior voz da Educação, no estado de São Paulo, deputado. A
gente está com dois campeões aqui. O deputado reeleito, mais votado do estado
de São Paulo, e o Pedro Bandeira, que é o nosso maior escritor, mais lido do
nosso País.
E, num momento
de trevas, como a gente atravessa, é importante dizer que, nos últimos cinco
anos, quase 800 bibliotecas foram fechadas no nosso País. A maioria, aqui no
estado de São Paulo.
Então esse
evento aqui é de uma importância, muito, muito, para o nosso País, muito, para
quem acredita na Educação, quem acredita na justiça social. E as histórias têm
esse poder na nossa vida. A gente lê uma história para que a gente possa se
reconhecer nela.
Isso, eu aprendi
lendo o Pedro: que a gente vai ampliando a nossa capacidade de compreender a
gente mesmo. E vai confirmando, como Antonio Candido também falava: que a
literatura tem que ser um direito, porque ela também confirma a nossa
humanidade.
É a literatura
que concede o equilíbrio social. Porque ela confirma a nossa humanidade. Então
é muito importe a gente estar aqui hoje, homenageando o Pedro. Ele se descreve
como uma pessoa que planta esperanças, numa das duas descrições. E, no nosso
País, na nossa vida, o quanto é importante a gente manter a esperança!
Então eu quero
agradecer, dizer do orgulho, que você representa o País que eu acredito. Um
país que é formado por sonho, por esperança, e tem essa grandeza. Hoje a gente
está com uma Mesa linda, de pessoas que constroem o nosso País.
Então, muito
obrigada, Pedro. Muito merecida essa homenagem.
E viva Pedro
Bandeira! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE - CARLOS GIANNAZI - PSOL -
Obrigado, professora Luciane Cavalcante. Está inscrita também a Ana Priscila,
está aqui presente também. Vai fazer a homenagem na tribuna. É Ana Priscila.
Quero chamar a Ana Cláudia para também fazer a homenagem dela. A Ana Cláudia é
a próxima, as Anas.
A SRA. ANA PRISCILIA - Boa noite a
todos. É Ana Priscilia. Quase ninguém, nem aqui, acertou o nome, mas todo bem.
É uma honra imensa estar aqui. Eu pensei que não conseguiria. Quase que a voz
não sai, inflamação na garganta, nesse tempo de São Paulo, meio louco. Mas eu
não podia perder de estar aqui hoje, com vocês. Eu sou grande fã do Pedro
Bandeira, assim como todos vocês, leitora do Pedro Bandeira. Já tenho um
pouquinho de anos.
Como fã, eu
agradeço muito ao deputado também, Carlos Giannazi. Porque, quando a gente
chegou aqui, não foi apenas a homenagem ao Pedro Bandeira, muito merecida e
muito querida por nós.
Mas eu cheguei
aqui e logo me encontrei com a professora Maria Lajolo. E aí, aquele ímpeto de
fã: “A Marisa, a Marisa!”. Já querendo tirar foto, eu tirei uma foto sem ela
ver, inclusive. Aí depois chegou a Rosana. E eu: “A Rosana, a Rosana!” Até
apontei: “A Rosana chegou”.
Aí depois eu vi
a Maristela chegando. Esse encontro aqui, que o deputado professor nos
proporciona é incrível. É muito legal. Eu espero que muitos de nós, de vocês,
dos que estão assistindo, e de muitos ainda que virão, tenham isso.
Que tenham
pessoas, espelhos, pessoas que se atentem, como fãs, professores, educadores,
livreiros, literários, escritores. Porque eles são o que movem o nosso País o
que realmente nos educam, nos fazem ser o que somos. E todos falaram palavras
maravilhosas.
Claro, seria
muito difícil chegar aos pés deles. Mas, uma coisa, eu, como fã, além de ajudar
na formação do meu caráter, na minha profissão, de como eu sou hoje, as obras
do Pedro Bandeira, e tudo o que elas me proporcionaram, me proporcionou
amizades verdadeiras.
As minhas
maiores amizades hoje são de pessoas que são fãs do Pedro Bandeira. Nessas
palavras, eu estou me lembrando e sempre me lembro daquela menina que começou a
ler Pedro Bandeira. Tinha a idade de uma de suas personagens. Talvez, a mais
querida. Sempre procuro, nas entrevistas, a mais querida do Pedro Bandeira.
Eu gostaria de
ler, rapidamente, um texto que escrevi, daquela menina que tinha a mesma idade
daquela menina que o Pedro escreveu, há alguns anos atrás, alguns pouquinhos
anos atrás. O texto se chama “As Lentes Certas”.
“Eu podia
vê-la. Ela passava bastante tempo, ali naquela mesa baixa. Ora escrevendo, ora
lendo, ora os dois. Lia para consultar, e se colocava a escrever. Um
dicionário, provavelmente.
Ou à procura de
alguma lembrança, de alguma frase interessante, como a do poema “Vou-me embora
pra Pasárgada”, de Manuel Bandeira. Sabia que precisava impactar por meio da
escrita, e isso era o que fazia de melhor.
Sim, lá estava
ela, horas a fio, sentada como uma oriental, com uma almofada entre os
tornozelos e os ísquios (um em cada nádega, só para especificar). Sem qualquer
anomalia física, muito pelo contrário, ainda que pudesse discordar disso de
forma veemente.
A mesa era
baixa e, por vezes, a pilha de livros se sobrepujava a ela, e a encobria.
Ninguém conseguia vê-la. Eu podia até ver a mãe dela chamando por no mínimo
três vezes, para jantar ou lavar a louça, tamanha era a sua concentração. Ela
não conseguia ouvir antes.
E lá estava ela,
após a terceira chamada, saindo do seu próprio eixo, a fim de desviar dos
livros e alcançar os olhos da sempre queixosa mãe, e eu não duvidava, desde que
ela se entendia por gente, a mãe se queixava. Numa dessas, deve até ter ouvido
que as queixas começaram quando ela havia nascido.
Eu podia vê-la
nitidamente, como através de um espelho, mas sem os xingamentos desta vez, só
observando, e mal podia esperar para observar seu próximo passo, seu grande ato,
seu triunfo.”
Afinal eu
estava lendo um romance, ou melhor, acompanhando a história de uma garota
comum, mas bem longe da normalidade. Isabel era como eu. Não, não apenas pela
idade que compartilhávamos - sim, quando eu li Isabel eu tinha 14 anos como ela
-, mas por sermos comuns, no entanto muito fora da normalidade. Ao menos para
nossa realidade, e que realidade.
Eu estava em
uma fase leitora. O apagão batia à nossa porta então. Tudo era controlado, o tempo
no banho, tempo na televisão, tempo na internet, tempo de ouvir a seleção
brasileira de futebol pelo rádio. Fita de vídeo nem pensar. Afinal, gastava
duas energias de uma vez, levando em conta que necessitávamos ligar a TV e o
aparelho juntos.
Aliás, tudo
sempre havia sido controlado até então. A minha única liberdade era a leitura.
Ah, a leitura. Ninguém implicava comigo por ler, e isso é o melhor presente que
uma adolescente podia ter.
A não ser
quando minha mãe vinha com a história de um tio, cujos olhos saltaram das
órbitas de tanto ler à luz de velas. Não era o meu caso. Eu não lia à luz de
velas. Talvez à luz de lanterna às vezes.
E eu estava
disposta a ler tudo que me agradasse. Queria acompanhar a trajetória de
mulheres fortes, que eram oprimidas, mas davam a volta por cima, e claro - por que
não? -, encontrando um príncipe encantado, de preferência ganhando o primeiro
beijo em qualquer outro lugar que não fosse em um caixão, e a referência não é a
Branca de Neve, aqui a referência é machadiana, mas podia até acontecer ali
bêbada, em um jardim escuro qualquer.
Não posso dizer
que tem uma imaginação muito limpa, mas não se confundam. Estou falando de
nitidez, de clareza nos pensamentos. Na verdade, acredito que meu cérebro, na
parte da nuca, para ser mais exata, tem um problema grave de miopia, principalmente
do lado esquerdo.
Mas, enfim, era
assim até eu ler a história de Isabel. Acho Isabel um nome muito bonito. Se
fosse Isabela, com certeza minha mente vagaria por alguma figura italiana. Mas
eu pensava em Isabel mais voltada para o francês, talvez holandês, meio judia,
quem sabe, até catalã.
Pois é, logo me
dei conta que estava vendo a mim mesma. Sim, sou bem pluralizada etnicamente.
Ali sentada na mesa baixa, sobre os calcanhares, enquanto lia, consultava uma
palavra que não entendia, voltava a ler, e depois eu escrevia a sensação que
aquela leitura me proporcionava. Parecia até uma projeção astral. Às vezes até
assustava.
Todavia, acho
que não se tratava de algo espiritual, esquizofrenia ou algo parecido. Apenas
descobri as lentes certas para a minha imaginação, até então pouco limpa. Nítida,
não se confundam. É isso que o Pedro Bandeira me proporcionou, e, com certeza,
proporcionou a muitos outros, tem proporcionado, e proporcionará muitos mais.
Muito obrigada,
Pedro Bandeira.
O SR. PRESIDENTE - CARLOS GIANNAZI - PSOL -
Obrigado, Ana. Já chamo então, agora, a Ana Cláudia. Chega a Ana.
A SRA. ANA CLÁUDIA MARTINS - Boa
noite a todos e a todas. Primeiramente, é uma honra estar aqui representando os
bibliotecários do estado de São Paulo. Eu sou Ana Cláudia Martins, e estou
presidenta do Conselho Regional de Biblioteconomia. Gostaria de agradecer ao deputado
por essa iniciativa, por essa honraria merecida.
Eu não sou como
o Edson, que é bom de improviso, eu trouxe uma colinha. Eu gostaria de
parabenizar o escritor Pedro Bandeira, que nos presenteou, principalmente as
nossas crianças, com seu trabalho tão rico, que incentiva a nossa imaginação.
Feliz do país que tem um escritor como Pedro Bandeira.
Os livros e as
bibliotecas atuam na formação social, intelectual e de cidadania de uma
comunidade, de um indivíduo. Enfim, muito obrigada, Pedro Bandeira, por fazer
parte dessa construção, fazer parte dessa formação dessas crianças, que a
biblioteca, os livros salvam.
Tiram as pessoas,
as crianças que estão marginalizadas, que estão flertando com o crime,
flertando por não terem oportunidade, e o livro tem essa função, a literatura
tem essa função.
Muito obrigada
por ser nosso escritor, e estar aqui conosco, dando toda essa alegria para a
gente. E peço licença também, por favor, de convidá-los, no dia 12, aqui na
Casa, promovida pelo deputado Carlos Giannazi, uma audiência pública a favor
das bibliotecas escolares, porque existe uma Lei, a nº 12.244, que é um direito
nosso, direito do cidadão, a ter uma biblioteca dentro da escola. Toda escola
tem que ter biblioteca.
Então, assim,
eu peço ajuda de vocês todos, com licença, convocando todos a estarem conosco
nessa luta, para que essa lei, que já tem há 12 anos, seja respeitada, e onde
Pedro Bandeira vai ser muito mais lido, e vai ajudar muito na nossa formação.
Muito obrigada,
escritor. Não tenho nem o que falar mais.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE - CARLOS GIANNAZI - PSOL -
Obrigado, Ana. Mais alguém? Já estamos partindo já, mais uma pessoa. Daqui a
pouco já partir para o encerramento, com a entrega, na verdade, já do Colar de
Mérito Legislativo.
A SRA. LUCIANE GEOFF - Boa noite a
todos e a todas. Eu não poderia deixar de dar os parabéns ao deputado Giannazi e
ao meu querido Pedro Bandeira. Eu já
falei várias vezes para o Pedro que, na verdade, eu aprendi a gostar de ler com
Monteiro Lobato. Eu queria ser a Narizinho, queria mergulhar no Reino das Águas
Claras para encontrar o príncipe, e ali eu vivia aquele mundo maravilhoso.
Hoje, quando a
gente pergunta para as crianças, para os jovens, com quem eles aprenderam a ler,
a gostar de ler, eles já respondem “com Pedro Bandeira”, como “A Droga da
Obediência” foi citada aqui pelo Oscar, o Oscar que tem contato aí com a
criançada. É assim mesmo.
Eu sou
formadora de professores de sala de leitura da rede municipal e fui professora
de sala de leitura. Eles gostam muito, muito. “A droga da obediência”, “A marca
de uma lágrima” - são sucessos. Ali, eles aprendem mesmo, eles pegam e aí já
vão em toda a coleção. “Os karas” é sucesso total.
O Pedro, gente,
eu falo para ele, o Pedro é aquele bolo da vovó, né, Pedro? É aquele bolo que a
gente... Sabe aquele bolo fofo, aquela receita especial, que a gente não
esquece nunca? É isso, vai ficar para sempre na nossa lembrança. É Pedro
Bandeira.
Gente, Pedro
merece. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE - CARLOS GIANNAZI - PSOL -
Obrigada, Luciane Geoff, também nossa colega, professora da rede municipal de
Ensino. Mais alguém aqui que tinha levantado a mão? Ele, depois tem o vereador
Celso Giannazi também, que vai fazer a saudação. O Willian também vai fazer.
O SR. - Boa
noite a todos. Boa noite, Carlos Giannazi. Muito obrigado pela homenagem que
você está prestando. Parabéns, Pedro. Você é uma pessoa muito especial e merece
todas as homenagens que existem.
Bom, eu não
podia deixar essa oportunidade de falar algumas palavras aqui, já que eu fui
tão alimentado pelas palavras que você escreveu durante toda a minha infância.
Eu só queria
ser bem sucinto e dizer que você tem uma importância enorme na minha trajetória
de vida. Eu, como uma criança que estudou em escola pública, tive muito contato
com toda a sua obra e eu...
Enfim, eu só
queria te agradecer. É isso.
Parabéns e
muito obrigado por tudo. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE - CARLOS GIANNAZI - PSOL -
Chamar o vereador Celso Giannazi também. Vai falar em nome da Câmara Municipal
de São Paulo e da Comissão de Educação, da qual ele é membro titular.
O SR. CELSO GIANNAZI - Boa noite a
todas, boa noite a todos. É um prazer enorme estar aqui com vocês. Sou
vice-presidente da Comissão de Educação, Cultura e Esportes da Câmara
Municipal.
Vamos saudar
aqui. Primeiramente, parabenizar a iniciativa do deputado Carlos Giannazi,
professor e deputado Carlos Giannazi, que traz para a Assembleia Legislativa a
entrega de uma honraria, a maior honraria do estado de São Paulo, a uma grande
personalidade, que é o Pedro Bandeira. Então, esta iniciativa é muito
importante.
Também gostaria
de cumprimentar todos da Mesa, essa Mesa muito especial, seletíssima, de
pessoas que deram um brilho, contaram toda a história do Pedro Bandeira nos
depoimentos aqui.
Fica até
difícil a gente vir falar um pouco do Pedro Bandeira, de toda a sua obra, o que
ele representa para todos nós aqui da cidade de São Paulo, do estado de São
Paulo e por todo o Brasil.
Quando a gente
começa a ler Pedro Bandeira, depois vai vendo as obras do Pedro Bandeira, ele
tem mais obras do que idade, né? Ele tem muito mais obras do que idade, e obras
de muita qualidade. Então, quando a professora coloca comparando ele a Lobato,
comparando ele a grandes nomes, é de fato, mesmo.
Nós temos a
felicidade de tê-lo aqui, viver esse tempo presente com ele. É uma satisfação
muito grande em tempos que nós estamos vivendo - professora Luciane Cavalcante
colocou aqui muito bem, e nós vivemos isso aqui na cidade de São Paulo - o
fechamento de bibliotecas, terceirização de casas de cultura.
Então, quando a
gente tem um evento, uma homenagem a alguém que se dedicou à Cultura, à
Educação, incentivando tantas crianças com a educação, com essa literatura
infanto-juvenil, é muito gratificante para nós e é muito importante para nós.
Então, no
Brasil em que nós vivemos, no Brasil de hoje, a gente tem que agradecer a
presença do Pedro e dizer: mais livros, menos armas; mais Pedro Bandeira, menos
Bolsonaro. (Palmas.)
Então,
parabéns, Pedro.
Você merece
muito esta homenagem e muitas outras mais.
O SR. PRESIDENTE - CARLOS GIANNAZI - PSOL - Obrigado,
Celso, vereador Celso Giannazi. Chamar agora o Willian, que é estudante da
Universidade de São Paulo e também servidor do Ministério Público estadual.
O SR. WILLIAN - Sr. Presidente,
Sras. e Srs. Deputados... Não, isso é brincadeira, mas, brincadeiras à parte,
muito boa noite a “todes” aqui presentes, em especial, a esta distintíssima
Mesa, composta aqui pelo professor Giannazi, pelo professor Edson Gabriel, pelo
Oscar e, sobretudo, pela estrela desta noite, que é o escritor, essa lenda viva
da literatura e da cultura nacional chamada Pedro Bandeira.
Eu também
costumo falar de improviso, mas, para uma pessoa especial, para uma pessoa com
a trajetória espetacular na literatura e na cultura nacional que nem o grande
Pedro Bandeira, eu acho que improviso não caberia. Portanto, eu preparei um
pequeno texto aqui.
Bandeira no
sobrenome, bandeira nas obras e na história. Uma homenagem como esta, sobretudo
em um momento difícil como o que vivemos atualmente, é mais do que justa, é
urgente.
Urgente, porque
vivemos, neste exato momento, em um País onde os trabalhadores da Cultura têm
sido massacrados e escamoteados em sua dignidade. Urgente, porque as gerações
que estão chegando precisam conhecer os realismos fantásticos, personagens e
universos de Pedro Bandeira.
Urgente, para
finalizar - e é um discurso rápido mesmo -, porque a leitura é a antessala do
pensamento crítico, a leitura é a antessala de uma sociedade que respira, exala
e transpira cultura, transpira revolução.
Faltam-me
palavras, neste momento, para descrever a importância histórica de Pedro
Bandeira, não só para as nossas crianças, mas para o Brasil.
“É proibido
proibir” a cultura.
Viva Pedro
Bandeira, viva a cultura, viva o Brasil, e fora Bolsonaro. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE - CARLOS GIANNAZI - PSOL - Mais
alguém? Para a gente já fazer a entrega. Minha vez, então. Agora, vou para lá.
Bom, primeiro que, olhe, é uma honra enorme poder ser porta-voz desta homenagem
feita, na verdade, não só por nós, pelo nosso mandato, mas pela Assembleia
Legislativa, pelo Poder Legislativo do Estado de São Paulo.
Esta honraria
foi aprovada aqui na Assembleia Legislativa, é uma decisão da Casa do povo, da
Casa da cidadania. Então, é a Assembleia Legislativa, aqui, representando os
94, nós estamos fazendo a você esta homenagem, Pedro. E eu fico mais honrado
ainda por
tudo o que você representa, logicamente, um dos maiores escritores deste país.
Você é um patrimônio cultural e literário do Brasil.
Como foi dito aqui já pela professora Luciane, fazer uma
homenagem a você neste momento histórico é um ato de resistência, é um ato de
luta, porque a cultura nunca foi tão atacada como agora, a literatura. Fala-se
muito hoje em clubes de tiro, mas nós queremos bibliotecas, casas de cultura,
nós queremos os livros do Pedro Bandeira.
Nós estávamos conversando, e você já passou por um momento
difícil. Você disse que estava ali na Maria Antônia, você que foi aluno. É
importante que todos saibam a história.
Ele foi aluno da USP, das ciências sociais, no momento mais
terrível da história do Brasil. Em pleno golpe militar, em 1964, o Pedro
Bandeira, gente, era aluno da FFLCH lá da Maria Antônia. Ele teve aula com o Florestan
Fernandes, estava lá com o Octavio Ianni, com o Fernando Henrique Cardoso.
Ele fez parte de um momento histórico importante em que a
cultura estava sendo atacada, a universidade, a literatura, o Antonio Candido e
tantos outros intelectuais do Brasil.
Ele também foi ator. Pedro Bandeira foi diretor de teatro,
ele transitou pelas artes, mas que foram perseguidas, segmentos da arte
brasileira que foram perseguidos pela ditadura militar.
Também quero ainda lembrar, Pedro, que nós tivemos outra
honra de entregar a você o título de Cidadão Paulistano em 2003, lá na Câmara
Municipal de São Paulo, quando eu ainda era vereador.
Ele é de Santos, então nós entregamos a ele, e foi uma
solenidade muito importante para nós, crianças de escolas públicas estavam
presentes inclusive naquela solenidade.
Então, quase 20 anos depois, nós estamos aqui na Assembleia
Legislativa, em outro poder - lá era a Câmara Municipal, aqui a Assembleia
Legislativa -, fazendo essa homenagem a você.
Então eu queria agradecer esta oportunidade, mas entregar este
Colar de Honra ao Mérito do Poder Legislativo é muita responsabilidade para eu
fazer sozinho. Eu quero chamar aqui duas pessoas para dividir essa
responsabilidade comigo: o Edson Gabriel, que é escritor.
Edson, por favor, você pode vir aqui? (Palmas.) Ele é
escritor, professor, um dos responsáveis pela criação das salas de leitura da Rede
Municipal de São Paulo. Trabalhou na Secretaria da Educação, foi assessor do
Paulo Freire na gestão da Luiza Erundina. Eu falo que ele é um embaixador do
nosso mandato.
Quero chamar também uma professora, uma educadora,
professora Luciane Cavalcante, que já foi professora, diretora, foi da rede
estadual e é uma admiradora, seguidora e leitora também do Pedro Bandeira. Então
eu quero chamar vocês para que a gente divide a esta responsabilidade.
Agora eu vou chamar o Pedro Bandeira aqui para receber o Colar.
Pode chegar, Pedro. (Palmas.)
* * *
- É feita a outorga do Colar de Honra ao Mérito Legislativo
do Estado de São Paulo.
* * *
O SR. PRESIDENTE - CARLOS
GIANNAZI - PSOL -
O homenageado é sempre o último a falar.
O SR. PEDRO BANDEIRA
- Boa noite, querido
deputado Carlos Alberto Giannazi. Hoje a primeira honra para mim é estar ao
lado de alguém como você, que dedicou toda a vida à luta pela Educação pública
de qualidade, jamais esmorecendo frente às imensas dificuldades desse combate
não hoje, mas sempre, desde que você começou. Meus agradecimentos, caro deputado,
pelos avanços que sua coragem tem trazido para o nosso estado.
Boa noite, querido companheiro Edson Gabriel Garcia, grande
escritor e apoiador da Educação brasileira, criador do vitorioso programa das
salas de leitura deste município e a quem devo a honra de, há décadas, contar
com a sua amizade.
Boa noite, minha querida Rosana Rios, a fantástica escritora
que conhecemos como a Joanne Rowling brasileira, nossa presidente da Associação
de Escritores e Ilustradores da Literatura Infanto-juvenil, minha mais que
amiga.
Boa noite, querida Profa. Dra. Marisa Lajolo, grande linguista,
grande escritora e batalhadora pela literatura que durante toda a minha vida deu-me
a honra de ser o mais apaixonado de seus amigos, desde os bancos escolares, e
aquela que me fez escrever o primeiro livro infanto-juvenil.
Boa noite, queridíssima amiga editora Maristela Petrilli de
Almeida Leite, criadora do melhor catálogo brasileiro de literatura infanto-juvenil
deste país e a quem devo a honra de, por mais de quatro décadas, ter recebido
seu apoio e incentivo, sem o qual eu jamais teria conseguido chegar tão longe.
Aquela que primeiro me editou.
Boa noite, querido Oscar Garcia, bibliotecário que significa
todos os bibliotecários que me ajudaram e que inventaram a nova profissão de
bibliotecário, que não é mais um tomador de conta de livros, é um domador das
futuras inteligências, sabendo o que os livros possuem e receitando um livro a
cada leitor como um médico receita o medicamento de acordo com a necessidade do
seu paciente. Para isso, precisa conhecer os livros e o paciente. Não é fácil.
Boa noite a todos os amigos, companheiros, leitores, minha
esposa, meu filho, minha nora, meu neto e todos aqueles que aqui falaram. Minha
querida Ana Priscilia, antiga amiga desde menininha; Luciane Geoff, a quem eu
adoro muito; Luciane Cavalcante, muito obrigado por estarem aqui.
Eu queria também dar um boa noite para todos os deputados
desta Casa que não estão presentes, implorando a eles que jamais aceitem
divisão entre vocês, no caso da defesa da educação
pública, que para sempre deveria ser um esforço de estado, não somente de
governo.
Educação não tem lado, Educação é o único
alimento que nós podemos oferecer às nossas crianças para mudar o Brasil. Hoje
acho que foi você, Oscar, que me falou que, falando com a secretária, com a
ministro de Educação da Finlândia, o primeiro país do mundo no Pisa, o que ela
diz: “É fácil, não é nada difícil, apenas damos isso para todos os
finlandeses”. Nós apenas nunca demos isso para todos os brasileiros, sempre foi
a educação oferecida apenas para uma elite.
Falei de tantas
honras e tantos orgulhos dos amigos que me apoiam, de leitores que tanto amo e
que, ao aceitar-me, transformaram-me em escritor. E agora gostaria de falar do
mérito que esta Casa das Leis e da liberdade ora publicamente reconhece em mim
pelas mãos de vós, do grande deputado Carlos Giannazi.
Se eu mereço a
honra de poder portar o Colar de Honra de Mérito da Assembleia Legislativa de
São Paulo, a maior condecoração do meu estado, de onde terei tirado a força das
ações meritórias que porventura aqui me trouxeram?
Já nasci órfão
de pai e fui criado pela mais gentil e carinhosa das mães. Essa, porém, não
teve o privilégio da educação, afastada prematuramente que foi dos bancos
escolares depois de poucos anos de estudo.
Creio que
jamais a vi lendo um romance, simples e açucarado que fosse. O restante de
minha família seguiu o mesmo figurino, não me lembro de jamais ter visto um tio
ou tia lendo um livro, pois nenhum deles tinha uma estante de livros que fosse.
Nunca os vi
saindo de casa até para ir ao cinema, e muito menos ao teatro ou a um concerto.
Nem de futebol eles gostavam, pois em 1950, aos meus oito anos de idade, nem
ouvi falar que a seleção brasileira tinha sido derrotada pelos uruguaios.
Poucos exemplos.
Desse modo, em
primeiro lugar dentre as influências que me trouxeram até aqui devo pôr, claro,
o carinho dessa mãe que me contou histórias para eu dormir e sempre me deu a
certeza de ser bonito e inteligente.
Se, por
exemplo, Albert Einstein me dissesse que eu era feio e tapado, isso nem me
abalaria, pois a pessoa mais importante do mundo que eu conhecia sempre
assegurou o contrário. Tenho certeza que essa seria a primeira influência que
me tornou escritor, o amor.
Para mim, desde
sempre, a literatura mostrou-se como veículo da emoção, dos sentimentos, das
ligações, da luta pelo melhor. Em cada página que li na vida ali estava
repetido o amor de minha mãe, e creio que assim me tornei escritor.
Para mim, a
emoção da literatura é o modo mais eficiente de conectar-me com as pessoas.
Muito mais do que a razão, a emoção penetra o leitor e fixa melhor em sua
memória aquilo que se quer transmitir, bem melhor do que a razão.
Até hoje mora
em mim o momento em que o caçador abate o lobo mau e salva Chapeuzinho Vermelho
e a vovó, enquanto eu confesso que tenho de fazer um enorme esforço para
recordar o modo de extrair uma raiz quadrada. Ninguém nunca criou uma
historinha sobre raiz quadrada.
Por outro lado,
por ter sido um moleque solitário sem ter com quem brigar nas longas tardes
ensolaradas de Santos, minha companhia e minha diversão eram sonhos, os
perigos, as emoções e aventuras que preenchiam meus lazeres em gibis e em
livros.
Livros sérios e
importantes? É nada, livros de fantasias, de lutas, de perigos, de mocinhos e
vilões, sempre com finais felizes, dos sonhos de Lobato e das má-criações da
boneca Emília, e assim para Tarzan e seus macacos, para Tom Sawyer e
(Inaudível.), para Tarzan e seus
macacos, para a Ilha do Tesouro e seu pirata Long John Silver, para Os Meninos
da Rua Paulo e o Infeliz Nemecsek, para D'Artagnan e seus Três Mosquiteiros,
para Quasimodo, Esmeralda, para Oliver Twister e seu terrível Fagin, para
Arsène Lupin e seus roubos elegantes, e logo para os gaúchos machos de Érico Veríssimo, e para as baianas
cheirosas de Jorge Amado.
Lembro-me de
ter achado chatíssimo a Iracema, para deliciar-me sabe com quem? Como dizia a
Marisa, com o Ubirajara, que aguentava manter a mão enfiada num formigueiro
enquanto se declara a sua amada Aracy. Que romântico.
No ginásio,
quando a aula estava chata, viu Oscar, eu inventava um mau comportamento para
ser castigado a passar o restante do tempo na biblioteca, onde uma
bibliotecária baixinha ficava de olho nos livros que eu escolhia e logo me
oferecia outros semelhantes, aumentando meu estoque de paixões. Foi por ela que
fui apresentado a Charles Dickens e ao folclore alemão. Siegfried substituía
Robin Hood.
Então, o que me
formou, o que me tornou esse escritor apaixonado pela educação? Foi o amor
desinteressado, foi a emoção de uma história de fadas, foi minha educação
sempre em escolas públicas, do grupo escolar à universidade. Foram meus
professores, foram os bibliotecários, foi a convivência com colegas, foram os
livros, foi a leitura.
Por minha própria
biografia, convenci-me de que meu País pode tornar-se realmente grande se
pudermos oferecer boas escolas públicas, bibliotecárias bem treinadas, muitos
livros, muitos bons livros para preencher o cérebro de nossas crianças
desfavorecidas, para aparelhar potenciais que a história do Brasil por século
aceitou desperdiçar.
Meus queridos
amigos, hoje o deputado Carlos Giannazi homenageia, antes de mais nada, não
somente um escritor, mas a leitura, que nos fez a ambos, e que pode salvar este
lindo País hoje mergulhado no analfabetismo funcional, no negativismo da
Ciência, no desprezo pela pesquisa, na perseguição à cultura, na sociopatia
entronada, na celebração da morte, da tortura, da abolição das bibliotecas e da
criação de clubes de tiro, na negação da vida e da democracia.
Se a leitura e
o amor de uma mulher iletrada me construíram, o amor aos livros pode fazer um
Brasil melhor, o grande país com que todos sonhamos. Cabe a nós brasileiros
termos a consciência disso. Honra ao mérito da educação, honra ao mérito da
leitura.
Muito obrigado,
eu amo vocês. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE - CARLOS GIANNAZI - PSOL - Obrigado.
Viva Pedro Bandeira, recebendo hoje, aqui, o Colar de Mérito do Poder
Legislativo do Estado de São Paulo.
(Palmas.)
Então, eu
encerro a sessão de hoje.
Está encerrada
nossa sessão solene em homenagem ao Pedro Bandeira. Quem quiser tirar foto com
ele, vamos aproveitar aqui, ele já com o Colar de Mérito.
Pode subir,
pessoal, aqui na frente.
*
* *
Encerra-se a
sessão às 20 horas e 54 minutos.
*
* *